Bloomberg — Dennis Levitt ganhou seu primeiro Tesla (TSLA), um Model S azul, em 2013, e adorou. “Era muito melhor do que qualquer carro que já havia dirigido”, afirmou o executivo de 73 anos.
Ele comprou o conceito da marca, assim como de Elon Musk, o carismático CEO da Tesla, já adquirindo outro Model S no ano seguinte e dirigindo o primeiro em todo o país. Em 2016, ele ficou na fila de um showroom perto de sua casa no subúrbio de Los Angeles para ser um dos primeiros a encomendar dois Model 3 – um para ele e outro para sua esposa.
“Eu era um fanboy total de Musk”, disse Levitt.
Era, porque enquanto Levitt ainda ama seus Teslas, ele está azedo com Musk. “Com o tempo, suas declarações públicas realmente me incomodaram”, disse Levitt, citando as desavenças do CEO com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, entre outros. “Ele age como uma criança de sete anos.”
Musk é suspeito de ter tido um caso com a esposa de Sergey Brin, cofundador do Google, algo que ele negou; se colocou em um imbróglio para adquirir o Twitter (TWTR); teve gêmeos com uma executiva de sua startup de interface cerebral Neuralink; funcionários da SpaceX o chamaram de “uma fonte frequente de distração e constrangimento”; sua filha mudou de nome e gênero legal após sua história de pronomes; ele foi acusado de pagar US$ 250.000 a uma funcionária da SpaceX para resolver uma denúncia de que a assediou sexualmente, alegações que ele chamou de falsas. O comportamento de Musk tem afastado clientes em potencial e perturbado alguns proprietários de Teslas.
As tendências apareceram em uma pesquisa com consumidores e em relatório de pesquisa de mercado: a Tesla lidera em alto reconhecimento, consideração e fidelidade da marca, e os clientes ficam satisfeitos principalmente com seus carros. As confusões de Musk, por outro lado? Elas poderiam ser evitadas.
A Creative Strategies, que mede a experiência de clientes, mencionou a frustração de proprietários com Musk em um estudo publicado em abril. Um ano antes, a empresa de pesquisa Escalent apontou que Musk era o aspecto mais negativo da marca Tesla entre os proprietários de veículos elétricos pesquisados.
“Ouvimos proprietários da Tesla que diziam: ‘Olha, eu amo meu veículo, mas eu realmente gostaria de não ter que responder aos meus amigos e familiares sobre seu último tweet’”, diz Mike Dovorany, que conversou com milhares de pessoas, entre proprietários de veículos elétricos e potenciais compradores, durante seus dois anos trabalhando no grupo automotivo e de mobilidade da Escalent.
Até agora, a Tesla não teve problemas para superar as muitas controvérsias de Musk. A queda nas entregas de veículos que a empresa relatou no último trimestre foi seu primeiro declínio sequencial desde o início de 2020 e teve a ver principalmente com os bloqueios para conter a Covid em Xangai, forçando sua fábrica mais produtiva a fechar por semanas. Os concorrentes que perseguem a empresa há uma década ainda podem estar a anos de alcançar as suas vendas de veículos elétricos.
O poder de estrela de Musk, construído em grande parte por sua atividade no Twitter – a mesma plataforma em que ele se tornou uma espécie de para-raios –, contribuiu imensamente para a Tesla, especialmente porque evitou a publicidade tradicional.
Seu fluxo constante de brincadeiras online, pontuado com ocasionais anúncios grandiosos, manteve a Tesla nas manchetes. Nos primeiros dias da empresa, os comentários grosseiros eram um recurso, não um erro. Eles permitiram que Musk moldasse a cobertura da mídia e o tornaram o líder da legião de fãs online de Tesla.
Mas, depois de fazer que a Tesla e ele se tornassem sinônimos um do outro, Musk entrou em conflitos políticos, tentou comprar uma das plataformas de mídia social mais influentes do mundo e lutou para rebater a cobertura pouco lisonjeira de sua vida pessoal, colocando a marca cada vez mais valiosa da empresa em risco.
Jerry James Stone, um chef de 48 anos de Sacramento, na Califórnia, que ensina seus 219.000 seguidores no YouTube a fazer refeições veganas e vegetarianas, dirige um Fusca conversível e planeja migrar para um elétrico. Ele ainda não tem certeza de qual modelo, mas tem certeza de que não será um Tesla.
“Elon acabou de sujar tanto essa marca para mim que eu nem acho que aceitaria se ganhasse uma”, afirmou Stone. “Você tem esse cara que é o mais rico do mundo, que tem um megafone enorme, e ele o usa para chamar de pedófilo alguém que não é ou para envergonhar as pessoas. Todas essas coisas que são meio nojentas.”
De acordo com a Strategic Vision, uma empresa de pesquisas dos Estados Unidos que presta consultoria a companhias automobilísticas, cerca de 39% dos compradores de carros dizem que não considerariam um Tesla. Isso não é necessariamente fora do comum – quase metade dos entrevistados diz que não considera marcas de luxo alemãs. Mas a Tesla fica atrás de outras marcas do mercado de massa: a Toyota, por exemplo, está fora da lista de compras para apenas 23% dos motoristas.
Emma Sirr, uma profissional de computação em nuvem de 28 anos que mora em Bozeman, no estado de Montana, se locomove com seu parceiro e seus dois cachorros em um Nissan Frontier 2004. Eles pesquisam veículos elétricos há cerca de três anos e até recentemente consideravam os Teslas a única opção viável, dada a sua autonomia e a infraestrutura de carregamento que a empresa construiu em sua área.
Mas eles se recusaram a comprar um por causa de Musk: as principais queixas são a sua política, a rotatividade de funcionários na empresa e sua abordagem que consideram arrogante no que diz respeito à tecnologia de direção autônoma.
“Nós tiramos a Tesla da mesa desde o início”, afirmou Sirr. Ela e seu parceiro estão de olho no Kia Niro e no Chevrolet Bolt como possíveis alternativas. “Como consumidores, nosso poder é o que compramos. Acho que as gerações mais jovens, em particular, votam com suas carteiras, e sinto que isso pode ter um retorno futuramente.”
Durante grande parte da última década, a Tesla não teve concorrentes que correspondessem à autonomia da bateria de seus modelos e outras medidas de desempenho. Os consumidores desencorajados pelas confusões de Musk tinham poucos veículos elétricos a que recorrer. À medida que as montadoras tradicionais introduzem modelos elétricos mais capazes, a Tesla não terá tanta margem de manobra.
“Vimos entre os primeiros adeptos mais disposição para correr riscos ou tolerar atitudes fora do comum”, disse Dovorany, que trocou a Escalent por uma startup de tecnologia automotiva no início deste ano.
“Não estamos vendo isso tanto com os compradores que chegam.” Para conquistar consumidores desse grupo, as montadoras de carros elétricos precisam precisam atender todos os critérios e, para algumas, isso inclui empregar um CEO que não compartilha memes de Hitler nas mídias sociais.
Levitt, o autodenominado ex-fã de Musk, fez um teste no mês passado em um Lucid. Ele não fechou a compra, em parte, segundo conta, porque não tinha espaço de carga suficiente para seus equipamentos de golfe. Ele ainda está esperando por outra montadora para tirá-lo da Tesla e considera modelos da Audi, da Mercedes e da BMW, todas marcas alemãs.
“Se você tirar o Sr. Musk e suas bobagens da equação, tenho cerca de 98% de certeza de que meu próximo carro seria um Tesla”, disse Levitt.
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