Bloomberg Opinion — A BlackRock (BLK) já está acostumada a quebrar recordes. A maior gestora de ativos do mundo foi a primeira empresa a bater a marca de US$ 10 trilhões em ativos sob gestão. No entanto, quanto mais alto, maior o tombo. Este ano a BlackRock bateu outro recorde: a maior quantia perdida por uma única empresa durante um período de seis meses. No primeiro semestre deste ano, foi US$ 1,7 trilhão dos clientes.
A administração da BlackRock logo invocou a carnificina do mercado no primeiro semestre ao revelar o desempenho do investimento na semana passada. “2022 foi o pior começo em 50 anos tanto para ações quanto para títulos”, disse o presidente e CEO Larry Fink em sua conferência de apresentação de resultados.
Embora poucas empresas consigam evitar o rebuliço do mercado, algumas pelo menos tentam superá-lo. Mas a BlackRock sempre se rende: no final de junho, apenas cerca de 25% de seus ativos estavam geridos ativamente para superar um benchmark – em vez de monitorá-lo sem problemas, como fazem as estratégias passivas. Esse valor representa uma queda em comparação a um terço em 2009, quando a BlackRock adquiriu o Barclays Global Investors para se tornar a líder no setor de fundos negociados em bolsa (ETFs).
Dentro do negócio de renda variável, a divergência é especialmente nítida. Em todo o setor, os ativos se desviaram das estratégias ativas e preferiram as passivas. No caso da BlackRock, cerca de US$ 21 bilhões foram retirados da renda variável ativa na última década, dos quais US$ 730 bilhões fluíram para a renda variável indexada. As carteiras de renda variável passiva da empresa são agora 10 vezes maiores do que seus negócios ativos, embora ela opere algumas estratégias ativas de multimercado e alternativas que reduzem essa diferença.
Para os gestores de carteira na área de renda fixa, a evolução dos negócios é um sinal sombrio para o futuro.
As raízes da BlackRock estão na renda fixa ativa. Fink fundou a empresa em 1988 em torno de estratégias que “enfatizam a criação de valor pela seleção de segurança... e são implementadas por uma equipe de gestores de carteira altamente qualificados que usam um processo de investimento rigoroso”, de acordo com o prospecto de listagem de 1999.
Embora a empresa também tenha lançado o primeiro ETF de títulos domiciliado nos Estados Unidos em dezembro de 2002, ele não deu tão certo quanto os ETFs de ações. No caso da BlackRock, US$ 280 bilhões continuaram indo para renda fixa ativa nos últimos 10 anos. A renda fixa é a maior parte do que resta dos negócios de gestão ativa da empresa: em 30 de junho, ela tinha US$ 954 bilhões de fundos de títulos geridos ativamente, em comparação com US$ 393 bilhões de ações geridas ativamente. A gestão passiva cresceu, mas é apenas 1,5 vez maior do que a gestão ativa para renda fixa – uma diferença muito menor do que a da renda variável.
Tudo isso está prestes a mudar. O colapso dos mercados de títulos este ano tirou dinheiro de fundos de renda fixa ativa. Os clientes da BlackRock retiraram mais de US$ 20 bilhões no primeiro semestre do ano em um movimento que já tirou mais de US$ 200 bilhões do setor. Parte desse dinheiro está indo para fundos passivos, principalmente ETFs, setor em que a BlackRock está recebendo até mais do que seria justo. Até o momento, este ano a empresa ganhou US$ 39 bilhões em ETFs e US$ 25 bilhões em outras estratégias indexadas. A mudança para fundos passivo que começou na renda variável agora está acelerando na renda fixa.
Até recentemente, os ETFs de títulos eram considerados suspeitos. Em 2015, o investidor Carl Icahn, sentado ao lado do Fink na TV, chamou a BlackRock de uma “empresa extremamente perigosa”. Seu raciocínio era que os ETFs da empresa oferecem títulos ilíquidos como se fossem líquidos. “Essa empresa vai naufragar”, disse.
Entretanto, durante o pânico de março de 2020, quando os mercados de títulos congelaram, os ETFs tiveram um desempenho eficiente. Eles tiveram desconto no valor dos títulos subjacentes, mas isto não levou a uma venda massiva dos valores mobiliários. Em vez de transmitir o estresse, os ETFs de títulos absorveram-no enquanto ofereciam aos investidores a tão necessária liquidez. Esse teste de estresse validou a estrutura, e agora que os títulos estão caindo, o dinheiro está inundando o mercado.
Em sua conferência de apresentação de resultados, Fink explicou os benefícios. Ele observou que os investidores estão usando ETFs para obter uma exposição rápida e eficiente a milhares de títulos globais e recalibrar suas carteiras. “Os desafios associados à alta inflação e ao aumento das taxas de juros estão atraindo mais usuários de ETFs de títulos e levando os investidores existentes a encontrar novas maneiras de usar ETFs em suas carteiras”, disse ele.
Por enquanto, os gestores de carteira de renda fixa da BlackRock estão montando uma sólida defesa. Ao contrário de seus pares na área de renda variável, seu desempenho tem sido relativamente sólido. No primeiro semestre, os fundos monitorados caíram 10,6%, um pouco melhor que os ETFs de renda fixa da empresa. Segundo a empresa, cerca da metade dos ativos de renda fixa tributáveis estão superando o benchmark em relação a um ano atrás, em comparação com cerca de um terço dos ativos de renda variável administrados tradicionalmente.
Mas se a renda fixa seguir o caminho da renda variável, a divergência entre os fluxos passivos e ativos só aumentará. “Estamos no começo de uma grande transformação da forma como as pessoas investem em renda fixa”, disse Fink na semana passada. “Esperamos que o setor de ETFs de títulos quase triplique e alcance US$ 5 trilhões em ativos sob gestão até o final da década”.
Até lá, a BlackRock pode ser muito maior, mas sua fortuna continuará firmemente ligada aos mercados.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Marc Rubinstein é ex-gestor de fundos de hedge. Ele escreve a newsletter financeira semanal Net Interest.
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