Marcelo Claure: os planos para sua fortuna de bilhões após deixar o SoftBank

Bilionário abriu um family office e diversificará seus investimentos, incluindo ativos no mercado imobiliário e no de games

Após deixar o SoftBank, Marcelo Claure pretende ser um investidor proeminente em empresas de diferentes segmentos
Por Devon Pendleton
19 de Julho, 2022 | 09:29 AM

Bloomberg — Marcelo Claure é provavelmente mais conhecido no mundo das finanças como o braço-direito do fundador do SoftBank, Masayoshi Son. Mais especificamente, o profissional que conseguiu evitar o desastre mais espetacular da empresa japonesa de investimentos: a WeWork.

Claure, com seus dois metros de altura, está pronto para ser conhecido por algo mais: ser um investidor proeminente por si próprio.

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É um desafio mais difícil do que há seis meses, quando ele deixou o SoftBank após uma separação conflituosa com Son, seu antigo mentor. Os valuations dos investimentos da empresa japonesa estão sombrios, e aqueles que trabalharam de perto com Claure dizem que, embora seja habilidoso, ele não provou que consegue escolher vencedores.

Ambos lideraram o SoftBank até saída de Claure

Ainda assim, ele tem à sua disposição uma fortuna de US$ 2 bilhões que está entre as maiores para qualquer boliviano desde Simon Iturri Patino. Para colocar em uso sua riqueza pessoal, Claure formou um escritório familiar, o Claure Group, e tem ambições de eventualmente abri-lo também para fundos externos.

“Investimos em mercado imobiliário, tecnologia, games, vamos investir em criptomoedas, empresas públicas, privadas, Seed”, disse Claure, de 51 anos, em uma entrevista para a Bloomberg Línea. “É uma combinação de tudo.”

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Os family offices se tornaram cada vez mais a plataforma preferida para a diversificação de ativos para investidores ricos. Esses veículos, que administram o capital pessoal dos ultra-ricos, são ligeiramente regulados e ágeis, e o fundador determina se são públicos ou privados. Eles podem oferecer uma chance de reinvenção para quem vive à sombra de chefes proeminentes ou que foram enganados por problemas de regulamentação ou de desempenho.

A fortuna do fundador do fundo hedge Dan Och cresceu em mais de US$ 1 bilhão devido ao investimento por meio de seu family office, o Willoughby Capital, depois que ele deixou a Och-Ziff Capital Management na esteira de um escândalo de suborno.

‘Toque mágico’

Os fundadores podem procurar abrir suas empresas para selecionar investidores externos para ganhar escala ou custear despesas.

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“Já vi várias ocasiões em que uma família abre um family office e cria uma carteira volumosa demais ou acredita ter um toque mágico e diz ‘bem, posso abrir para família e amigos porque sou muito bom’”, disse Samy Dwek, CEO da White Knight Consulting. “É uma ideia que funciona – se você tiver um histórico.”

Claure assumiu a presidência da empresa em 2019

Para Claure, seu histórico de desempenho corre o risco de ser afetado na esteira de uma queda global da área de tecnologia que derrubou os valuations das muitas empresas do Vision Fund do SoftBank. O conglomerado japonês perdeu um recorde de US$ 15,4 bilhões no trimestre encerrado em março.

Claure pode ser capaz de eliminar esse estigma. No SoftBank, ele era o principal responsável pelas operações, encarregado de ajudar as empresas do Vision Fund a crescerem e se tornarem lucrativas.

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Investimentos não eram o forte de Claure quando Son o procurou em 2013 para convidá-lo a ingressar no SoftBank e liderar sua nova aquisição, a telecom Sprint. Na época, Claure administrava uma distribuidora de equipamentos de telecomunicações de sucesso que ele havia fundado e expandido até que chegasse a ser o maior negócio de um hispânico nos Estados Unidos.

Evitando uma crise

Para melhorar a oferta, Son concordou em comprar a maioria do negócio de Claure, a Brightstar, por US$ 1,26 bilhão. Claure levou a Sprint para a lucratividade e, por meio de uma fusão com a T-Mobile, conseguiu US$ 22 bilhões do SoftBank, o que poderia ter sido fatal para a empresa japonesa se a Sprint tivesse ido à falência.

O que Son viu em Claure foi um empresário obstinado com igual habilidade na operação de negócios. Investir em know-how, por outro lado, era sua fraqueza admitida. “Você é péssimo em investimentos”, foi o que Claure contou que Son havia dito antes de fazer um convite para que ele se mudasse para Tóquio para supervisionar as empresas operacionais do Vision Fund e aprender em primeira mão.

Ele é um empresário muito talentoso – ele é realmente um operador, muito mais um empreendedor do que um investidor por natureza”, disse Niccolo de Masi, CEO do dMY Technology Group, que trabalhou com Claure quando sua antiga empresa, a Essential, fez uma parceria com a Sprint.

Como COO do SoftBank, Claure trabalhou com diversas startups dentro do portfólio da empresa, desde a fabricante de robôs Boston Dynamics até a de chips Arm. Claure assumiu a presidência da WeWork em 2019 após o colapso de seu valuation com uma oferta pública inicial (IPO) fracassada. A empresa acabou abrindo seu capital por meio de uma empresa de aquisição de propósito específico (SPAC).

Claure, cidadão americano que reside principalmente em Miami, foi exposto a centenas de startups em sua carreira no SoftBank. Isso provavelmente moldou seus ecléticos investimentos pessoais, assim como sua ampla experiência.

Bilionário presenciou estreia do WeWork na bolsa

Ao redor do mundo

Nascido na Guatemala e com pais bolivianos, Claure cresceu pelo mundo devido à necessidade de seu pai, diplomata, de viajar, passando por países como Marrocos e República Dominicana. Após concluir o ensino médio em La Paz, na Bolívia, ele frequentou a Bentley College, em Boston, onde iniciou seu primeiro empreendimento, comercializando milhas aéreas. Seu segundo negócio, a Brightstar, surgiu de uma oportunidade de comprar uma loja de celulares.

Aqueles que conhecem Claure descrevem sua ética de trabalho como implacável. A Bolívia, um dos países mais pobres da América Latina, tem um produto interno bruto que é apenas 20 vezes maior que o patrimônio pessoal de Claure.

Sair de um país como aquele e chegar aos EUA com inúmeras oportunidades faz com que uma pessoa sinta um pouco de rancor que na verdade a motiva. Não tenho dúvidas de que ele se sente assim”, disse Miguel Armaza, investidor de venture capital e boliviano que conheceu Claure por meio de seu podcast. “Ele já viveu realidades diferentes”.

“Quem me conhece sabe que eu trabalho muito – não tolero mediocridade”, disse Claure aos funcionários da WeWork, chocados, de acordo com uma transcrição vazada de sua primeira reunião com o escritório. “Até agora, todas as empresas que passaram por mim foram muito bem administradas”.

O período que Claure passou sob a tutela de Son fica evidente quando ele fala sobre seus investimentos pessoais. Não surpresa nenhuma que a tecnologia esteja em foco: ele investiu em fundos de venture capital e em startups diretamente, segundo documentos visualizados pela Bloomberg. Ele também tem participações em criptomoedas, fundos de hedge e no mercado imobiliário – no ano passado ele vendeu uma mansão em Miami Beach para o cofundador da Apollo Global Management, Josh Harris, por US$ 32,3 milhões.

No início do ano, ele abriu a Claure Capital, divisão de seu escritório familiar com foco em investimentos públicos e privados. Através de outros veículos, ele planeja convidar pessoas de fora para participar de acordos específicos e – após o fim de seu acordo de não concorrência com o SoftBank – levantar um fundo no qual outros possam investir. Por conta própria, ele assumiu participações na plataforma digital de serviços hipotecários Valon, na empresa de cibersegurança ID.me e no Aprende Institute, plataforma de educação online para a América Latina e sua diáspora que foi fundada por seu irmão, Martin.

Aqueles que trabalharam com ele suspeitam sua experiência operacional o levará a para assumir participações maiores, nas quais pode exercer mais influência.

Criando sua fortuna

A fortuna de Claure começou na Brightstar, a provedora de equipamentos de telecomunicações que ele fundou e posteriormente vendeu para Son, mas sua carreira no SoftBank o enriqueceu ainda mais. Além do salário – no exercício fiscal de 2020, Claure recebeu US$ 13 milhões – ele acumulou uma participação na Sprint avaliada em US$ 680 milhões e por vezes investiu pessoalmente em startups que apresentou ao SoftBank, informou o New York Times no ano passado.

Ainda assim, a fortuna de Claure é minúscula perto do patrimônio líquido de Son, que, mesmo depois de cair 30% este ano, está avaliada em US$ 14,1 bilhões pelo Bloomberg Billionaires Index. As exigências de Claure por melhor remuneração acabaram levando à sua partida em janeiro.

Seu pacote de rescisão incluiu US$ 33,3 milhões em verbas rescisórias e mais US$ 586 milhões em incentivos atrelados ao desempenho do fundo da América Latina do Vision Fund, segundo documento do SoftBank divulgado no mês passado. Esses possíveis pagamentos o mantêm na órbita do SoftBank, assim como o empréstimo de US$ 515 milhões que ele recebeu em 2020 para comprar ações da Sprint. O vence em 2024.

Até para os gestores de fundos mais famosos, este é um momento difícil para levantar capital. O aumento da inflação e a queda dos mercados – principalmente o de tecnologia – deixaram os investidores receosos de usar dinheiro. As famílias ricas que administram seu próprio dinheiro estão retornando aos investimentos de venture capital após mais de uma década de crescimento constante, de acordo com um relatório do Silicon Valley Bank e da Campden Wealth

Claure confiará em sua vasta experiência com startups para convencer potenciais coinvestidores para que sua familiaridade com os fundadores e as operações cotidianas dos negócios traga fortes retornos.

Por enquanto, ele vive a vida de um bilionário. Seu feed no Twitter traz uma avalanche de mensagens alegres e fotos de locais glamourosos, como Tenerife, Aspen, Positano e St. Tropez.

Grande fã de futebol, Claure é proprietário do time profissional da Bolívia Club Bolivar e tem participação no Girona FC, da Espanha. Seu primeiro emprego oficial após a graduação na faculdade foi liderar as operações comerciais da Federação Bolivariana de Futebol, pouco antes de a equipe se qualificar para a Copa do Mundo.

“Eu fui abençoado”, disse ele anos depois em uma entrevista com a Babson College sobre o improvável sucesso do time. “Eu aprendi que tudo era possível”.

- Com a colaboração de Gillian Tan.

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