Esta startup aposta que a carteira digital de dados será o novo Pix no Brasil

Empreendedor André Vellozo, da Drumwave, da Califórnia, assinou acordo com o principal provedor de soluções tecnológicas para o governo brasileiro

Economia dos dados vai prevalecer sobre questões como privacidade, prevê o empreendedor André Vellozo
16 de Julho, 2022 | 12:25 PM

O brasileiro André Vellozo, nome conhecido por suas relações no mercado financeiro, vive em Palo Alto, na Califórnia. Foi lá onde o programador montou a Drumwave, uma empresa que, desde 2015, fazia gestão de dados. A startup prestava serviços para grandes empresas, resolvendo questões de dados para grandes bancos e outras companhias do setor de saúde, telecomunicações e governo. A empresa aprendeu a fazer módulos e criou uma plataforma.

Nos primeiros anos de Drumwave, Vellozo tocou a empresa com seu dinheiro e investimento de amigos e família. Há dois anos, a empresa planejou ir a mercado para mapear o valor do dado. Monetizar dados no setor financeiro é algo defendido por especialistas do setor, incluindo o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em evento da federação de bancos do Brasil no ano passado.

A aproximação da Drumwave com o governo brasileiro ficou mais clara depois que o Diário Oficial da União publicou um acordo de cooperação da empresa com o Serpro, o principal provedor de soluções tecnológicas para o governo brasileiro, no mês passado.

Histórico

Vellozo trouxe uma nova CEO, captou uma rodada Seed de US$ 5 milhões com a DGF Investimentos e a Bossanova Investimentos e marcou o lançamento de seu produto para monetização de dados no dia 13 de março de 2020. Mas chegou a Covid-19.

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“Tomamos um grande ‘não’ do universo. ‘Não é agora’. E eu não era mais o CEO, estava de chairman. Nosso plano de negócios foi cortado para o modo sobrevivência”, contou Vellozo, em entrevista à Bloomberg Línea.

Na pandemia, a CEO caiu do cargo, porque o fundo e conselho desejavam pivotar a companhia para operar apenas com privacidade de dados e vender esse serviço no mercado.

“Falei que não daria certo, porque a Drumwave não foi feita para fazer isso, mas o oposto disso. Eu disse: ‘se quiserem fazer uma companhia de privacidade, façam outra. Eu vim fazer monetização de dados.”

Vellozo comprou de volta a parte da companhia que estava com o fundo e trouxe Fernando Teles, ex-CEO da Visa no Brasil, para investir. No conselho da Drumwave está Scott McNealy, ex-CEO da Sun Microsystems, que foi vendida para a Oracle, e Lawrence Levy, ex-CFO da Pixar. McNealy é autor da famosa frase “vocês têm zero privacidade de qualquer forma. Superem”, décadas atrás.

A Drumwave parte dessa premissa. Não busca a privacidade, mas, sim, o poder do usuário de monetizar seus próprios dados para as empresas que os utilizam.

Agora, a empresa negocia um novo round com novos fundos, mas em condições ainda discutidas, especialmente depois das correções de valuations pelas quais empresas de tecnologia têm passado com a subida dos juros no mundo.

Mas os juros que preocupam o mercado financeiro é algo “marginal”, na visão de Vellozo. Ele diz que o próximo megaciclo será um mundo em que os grandes bancos e as big techs vão colidir.

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“Quando eu olho para coisas como a Andreessen Horowitz fazendo investimento no Adam Neumann, com o maior fundo de cripto… Eu não estou dizendo que estou certo porque ainda não acertei. Mas ou o Marc Andreessen está certo ou eu estou”, disse o executivo, cético em relação às criptomoedas.

A aposta de Vellozo está no dinheiro relacionado aos bilhões de dados em custódia com certificados. A próxima tacada da Drumwave é uma carteira digital de dados, a d-Wallet, que deve ser lançada em setembro no Brasil. E Vellozo espera que isso ganhe escala como aconteceu com o Pix, o sistema instantâneo de pagamentos do Brasil, desenvolvido pelo Banco Central.

A API da Drumwave ficará dentro dos aplicativos de banco, e nela, os usuários poderão requisitar seus dados às companhias - que hoje já pode ser feito, mas a Drumwave atuará como ‘procurador’ do usuário - criar uma poupança de dados, e monetizar para investimentos - como uma empresa que precisa uma grande base de dados para desenvolver um algoritmo, por exemplo, e divide o faturamento com quem vendeu o dado. A ideia é que o dono do dado use o dado como quiser, e seja beneficiado financeiramente quando as grandes empresas o utilizam.

Para a Drumwave, a startup ganha em uma taxa por cada transação utilizando os dados. A Drumwave opera na nuvem da IBM.

O próximo megaciclo: a economia de dados

Vellozo diz que as cinco maiores empresas de dados - Meta (META), Amazon (AMZN), Apple (AAPL), Netflix (NFLX), e Alphabet (GOOG) - valem juntas US$ 7,2 trilhões e que, generalizando, processam quase todos os dados do mundo.

O próximo megaciclo, de acordo com a Drumwave

Já os cinco maiores bancos do mundo valem US$ 1,5 trilhão e processam quase todo o dinheiro do mundo. “Entre os dois há US$ 6 trilhões, é uma assimetria. Essa assimetria está aparecendo agora porque o mundo de big tech e o mundo de big finance estão colidindo”, afirma o executivo.

“Eu acredito nos megaciclos. Quando chega o final de um, desespera mesmo, aí tem Metaverso, Web3, Web5, um monte de coisa para tentar fazer você migrar para o próximo passo. Se não, troca a geração e as companhias desaparecem. Elas vão para o fundo, viram utilities,” explica.

“Da mesma forma que Oracle e Cisco vão lá para baixo do stack, os bancos também vão para baixo do stack porque eles vão virar parte do processo de transformar isso em utility. Eu nunca acreditei em criptomoedas. Para mim elas são a mídia social do mercado financeiro”, disse, explicando que, assim como as mídias sociais retiram o intermediário (jornal) para a informação, as criptomoedas pretendem retirar o intermediário do mercado financeiro.

“O discurso de ‘vamos descentralizar’ é válido, cria valor, mas para poder fazer isso é preciso ter um lugar em que se preserva confiança. Já aconteceu com a mídia e vai acontecer com o mercado financeiro. A diferença é que o mercado financeiro tem Banco Central, um grande regulador lá em cima, e a mídia não tem”.

Os bancos já são plataformas no sentido de que conectam as pontas. Mas, segundo Vellozo, a infraestrutura vai colidir com as empresas de tecnologia, porque o usuário é o mesmo e o valor é compartilhado.

Os bancos centrais vão se tornar big techs. Bancos vão virar marketplaces e marketplaces vão virar bancos. Dinheiro de papel e de plástico está para desaparecer. Não é cripto, é dado. Dado é o novo proxy para valor. Dado é a única coisa que pode ter lastro. Tudo que fazemos é gerar dado, dormindo, acordando, andando. Fazendo ou não fazendo, só de existir, você gera duas coisas: valor e dado”, disse.

Data cap é o novo market cap

Segundo Vellozo, a Drumwave pretende monetizar o dado para dar visibilidade, transportabilidade e resistência à fraude. O que são características de moeda.

“Estamos falando de infraestrutura e usuários, unindo as duas pontas para você imprimir sua própria moeda. Hoje a gente paga para processar 50% dos dados do planeta. Não é uma discussão filosófica, é uma discussão financeira”.

Para ele, as empresas que dominarem a primeira perna do novo megaciclo, de ownership de dados, têm a chance de passar por todo o megaciclo, como Apple e Microsoft fizeram. E não morreram.

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Isabela  Fleischmann

Jornalista brasileira especializada na cobertura de tecnologia, inovação e startups