IFI alerta sobre riscos fiscais da PEC que amplia benefícios

Relatório publicado pelo órgão que monitora a política fiscal afirma que, na prática, “trata-se de mais uma alteração no teto de gastos”

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Bloomberg Línea — A Proposta de Emenda à Constituição que autoriza a concessão, por fora do teto de gastos e demais das regras fiscais, de até R$ 41,2 bilhões em benefícios sociais, fragiliza ainda mais a regra do teto de gastos e reduz a confiança no compromisso com a disciplina fiscal. É o que afirma o Instituto Fiscal Independente (IFI), órgão vinculado ao Senado Federal.

Os comentários, reunidos em um relatório divulgado nesta quarta-feira (6), chamam a atenção para o estado de emergência que a PEC, aprovada por senadores, reconhece, decorrente da “elevação extraordinária e imprevisível dos preços do petróleo, combustíveis e seus derivados e dos impactos sociais deles decorrentes”, como justifica o texto da Proposta.

Nesse contexto, o órgão, criado em 2016 com o objetivo de dar mais transparência às contas públicas, afirma que a possível aprovação das medidas propostas “aumenta o risco para as contas públicas no médio prazo e sinaliza falta de compromisso com a disciplina fiscal”, diz o relatório assinado por Daniel Couri e Vilma Pinto, diretor-executivo e diretora da IFI, respectivamente.

Principais impactos

O IFI ressalta que, mesmo que a PEC esteja limitada ao ano de 2022, algumas medidas geram impactos para anos seguintes, como é o caso da ampliação do programa Auxílio Brasil.

“Se o número de famílias que atendem aos critérios do programa não se alterar para 2023 e se o número de novos beneficiários for de 1,6 milhão de famílias, o efeito sobre as despesas de 2023 seria de cerca de R$ 7,7 bilhões”, diz o relatório, que também lembra que é possível que uma retirada abrupta do benefício em 31 de dezembro seja motivo de resistência do Congresso, o que também elevaria os gastos para o ano seguinte.

O Instituto calcula que, em termos fiscais e diante da proposta que aumenta o Auxílio Brasil em R$ 200, o programa passaria a custar 1,5% do PIB e equivaleria a um aumento de cerca de 50% no valor atual do benefício. “Considerando que o programa atende hoje 18,2 milhões de famílias, impacto da medida seria de R$ 18,2 bilhões”.

Na sequência, o outro segundo maior impacto para as contas públicas diz respeito ao pagamento de um auxílio aos caminhoneiros, de 1º de julho e 31 de dezembro de 2022, no valor mensal de R$ 1.000,00. O gasto, segundo o Instituto, totalizaria R$ 5,4 bilhões, ou 13,1% do total da PEC.

O IFI afirma que ambas as medidas não apresentam justificativas para o valor proposto, citando a inflação medida em doze meses até maio de 2022 pelo INPC, que chegou a 11,9%.

“Se o objetivo é atenuar o efeito da inflação sobre a vida dos beneficiários do programa, o que justifica um reajuste tão mais expressivo que o aumento de preços observado no período recente?”, questionam os diretores do Instituto.

Ainda que o estado de emergência abre uma exceção nas principais regras fiscais, “na prática, trata-se de mais uma alteração no teto de gastos”, diz o relatório.

‘As aparências importam’

O IFI diz que não há como negar o impacto da inflação, sobretudo sobre os mais pobres, e que é preciso reconhecer que “parte da pressão inflacionária decorre de eventos imprevistos, como a pandemia, originalmente, e a invasão da Ucrânia pela Rússia, desde o início de 2022″.

Os diretores do IFI finalizam o relatório dizendo que, “na condução da política fiscal, as aparências importam”.

“Há farta literatura sobre como os ciclos políticos influenciam, de diferentes formas, a gestão orçamentária, muitas vezes levando a aumentos de despesas em anos eleitorais”, dizem, e ressaltam que, mesmo ainda em tramitação na Câmara dos Deputados, a Proposta já tem impacto negativo na trajetória de juros futuros.

Nos últimos dias, o movimento mais avesso ao risco pesou no mercado de juros, tanto diante do cenário externo quanto do recrudescimento dos riscos fiscais atenuados pela PEC, o que elevou todas as taxas de juros dos DIs com vencimentos de 2023 a 2027 para acima de 12%

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