Captação líquida de fundos cai 97% no semestre, pior resultado desde 2014

Movimento de alta dos juros tem levado investidores a ampliarem alocações na renda fixa, dada a relação entre risco e retorno atrativa

Alta dos juros e da inflação faz investidores saírem de fundos em busca de ativos mais conservadores de renda fixa
06 de Julho, 2022 | 01:36 PM

Bloomberg Línea — *Matéria atualizada às 14h10 (horário de Brasília) com correção da Anbima no segundo parágrafo. Valor é o menor desde 2014, não 2002 como a associação havia informado anteriormente

A captação líquida da indústria de fundos de investimento caiu 97% no primeiro semestre, para R$ 8 bilhões, na comparação com o mesmo período de 2021, quando a diferença entre entradas e resgates ficou positiva em R$ 272,5 bilhões. Os dados foram divulgados nesta quarta-feira (6) pela Anbima, associação que regula o setor.

O número representa o pior resultado desde 2014 e é o terceiro menor da série histórica. Além de 2002 (quando houve resgates de R$ 23 bilhões), a captação de 2014 (com resultado positivo de R$ 4,6 bilhões) também ficou abaixo do registrado no primeiro semestre deste ano.

O movimento acontece em meio à aversão ao risco e à alta dos juros, que tem aumentado a atratividade das aplicações de renda fixa, mais conservadoras e com retornos reais (acima da inflação) na casa dos 6% ao ano.

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Em coletiva com a imprensa nesta quarta (6), Pedro Rudge, vice-presidente da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais, destaca ainda a atratividade de produtos isentos para pessoas físicas, como Letras de Crédito Imobiliário e do Agronegócio (LCI e LCA), que têm levado a uma migração dos recursos de fundos para a compra direta de produtos de renda fixa.

No semestre, o destaque negativo da indústria ficou com os fundos de ações e multimercados, que juntos sofreram resgates líquidos no valor de R$ 111,3 bilhões. Segundo a Anbima, o movimento foi pulverizado, com destaque para os tipos de estratégia livre (sem compromisso de estratégia específica) em ambas as classes.

Fundos de investimento no exterior, que investem mais de 67% lá fora, também tiveram saídas líquidas de R$ 18,3 bilhões. A quantidade de fundos, contudo, seguiu crescendo no período, de 689, em dezembro de 2021, para 738 ao fim de junho.

Pelo fato desses fundos representarem menos de 1% da indústria, Giuliano De Marchi, diretor da Anbima, disse durante a coletiva ver ainda um grande espaço para o crescimento da estratégia com a normalização dos mercados.

A aversão ao risco e o selloff recente também contribuiu para uma redução no patrimônio líquido total dos fundos que aplicam diretamente em ativos digitais, para R$ 4,7 bilhões (ante R$ 5,1 bilhões em dezembro). Assim como a estratégia de investimento no exterior, o número de fundos cresceu no período, de 24 para 37.

Por fim, o número de contas em ETFs teve aumento de 81%, com investidores buscando uma maior diversificação. “O entendimento da diversificação veio para ficar e a tendência é que à medida que os investidores tenham maior apetite ao risco e entendam que esses ativos estão interessantes, devem buscar cada vez mais alternativas de investimento global. O investidor não vai querer ficar apenas em ativos brasileiros e o ETF vai ser uma solução interessante, principalmente dado seu baixo custo e boa liquidez”, disse Rudge.

Renda fixa lidera preferências

Do lado positivo, os fundos de renda fixa voltaram a concentrar os aportes dos investidores na classe, com captação líquida de R$ 88,8 bilhões, com destaque para os fundos DI e de baixa duração.

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Atenção ainda para os Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), com entrada líquida de R$ 31,6 bilhões. O movimento, contudo, foi concentrado em um único fundo da classificação Agro no valor de R$ 16,5 bilhões.

A indústria de fundos de investimento soma agora um patrimônio líquido de R$ 7,2 trilhões, aumento de 6,8% ante junho de 2021.

Olhando para frente, Rudge destaca o sentimento de grande incerteza que faz com que investidores fiquem mais avessos ao risco, bem como o cenário de alta inflação, com pessoas dispondo mais de seus recursos para fazer frente aos gastos e destinando menos para investimentos.

O arrefecimento da inflação e uma tendência de queda dos juros seriam necessários para permitir uma maior visibilidade do cenário para alocação, levando em conta que ainda temos as eleições no fim do ano – o que aumenta a incerteza, completou.

A avaliação é compartilhada por De Marchi. “Temos que aguardar o resultado das eleições para termos uma volta mais forte do mercado. Quando analisamos os dados do primeiro semestre, os três primeiros meses vieram em linha com os anos anteriores, enquanto a maior queda esteve concentrada no último trimestre. Isso deve se reverter até o fim do ano”, disse.

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Mariana d'Ávila

Editora assistente na Bloomberg Línea. Jornalista brasileira formada pela Faculdade Cásper Líbero, especializada em investimentos e finanças pessoais e com passagem pela redação do InfoMoney.