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Regulamentação de stablecoins: o que pode acontecer?

Desafio é regular sem restringir, sendo o momento oportuno para mudar a abordagem, avalia especialista

É preciso regular as stablecoins sem prejuízo das finanças descentralizadas, diz advogada
Tempo de leitura: 3 minutos

Por Gino Matos para Mercado Bitcoin

São Paulo — O colapso do token Terra USD (UST), há quase dois meses, chamou a atenção de reguladores para os criptoativos cujos preços seguem outros ativos, conhecidos como stablecoins. A partir daí, o que se viu, então, foi um esforço regulatório em diferentes países para criar um conjunto de regras voltadas a essa classe de ativos digitais.

Nos Estados Unidos, a Secretária do Tesouro, Janet Yellen, pediu que o mercado de stablecoins fosse regulado no país até o fim deste ano. O Reino Unido começou a agilizar seu processo regulatório sobre o tema, acompanhado por outros países da União Europeia.

Esforço irá adiante?

O episódio envolvendo o UST extrapolou o universo das criptomoedas pelo seu tamanho. À época do colapso, quase US$ 18 bilhões circulavam no ecossistema Terra, blockchain na qual o token era emitido. Nesse cenário, não é estranho que reguladores quisessem se mostrar a postos para resolver o problema. A dúvida é se esses esforços serão continuados após a demonstração inicial de interesse no tema.

“A regulação das stablecoins é quase certa”, avalia Juliana Facklmann, Diretora de Regulatório e Design de Produtos do Mercado Bitcoin. Ela ressalta, contudo, que a forma de regulamentar esse mercado ainda é incerta, já que “protocolos descentralizados apresentam grandes desafios aos reguladores”.

Um dos desafios citados por Juliana diz respeito à regulamentação do mercado sem prejudicar protocolos de finanças descentralizadas que dependem dessas stablecoins. A questão da descentralização também é um problema, já que protocolos descentralizados, a princípio, não possuem um agente responsável.

Regular sem restringir

Em relação ao primeiro desafio, envolvendo a regulamentação sem restrição, trata-se de uma preocupação do mercado de criptoativos como um todo. A diferença é que, se os esforços regulatórios relacionados a stablecoins forem realmente adiante, há a possibilidade de que o cenário de preocupação leve à criação de regras restritivas.

Este pode ser o momento para mudar a forma de regulamentação, na visão de Juliana, onde o modelo baseado em “agente de mercado e punição” dá lugar a um modelo “baseado no investidor e informações”.

Considerando o papel importante que as stablecoins desempenham dentro do ecossistema de criptomoedas, é fundamental que reguladores deixem os receios de lado e analisem com um olhar crítico o que deve ser tratado.

O episódio do UST e as stablecoins algorítmicas

O UST é uma stablecoin diferente das duas maiores do mercado, que são o USDT e o USDC. Enquanto as duas últimas são lastreadas em dólar, ou seja, cada unidade digital emitida equivale a um dólar real, o token UST é uma stablecoin algorítmica. Como o nome sugere, este tipo de criptoativo tem o preço controlado por um algoritmo.

A paridade do UST era mantida por meio de uma relação com o token nativo do ecossistema Terra, chamado LUNA. Para obter UST, era necessário trocar LUNA pela stablecoin. Ao mesmo tempo, era possível fazer a permuta do UST diretamente por LUNA. As substituições sempre eram feitas considerando a cotação de US$ 1, ou seja, 1 UST sempre seria substituído por US$ 1 de LUNA dentro da plataforma do ecossistema Terra conhecida como Terrastation.

A paridade era mantida por arbitradores que negociavam UST quando essa equivalência era perdida. Por exemplo: caso o UST passasse a custar US$ 1,03 no mercado secundário, arbitradores trocavam LUNA pela stablecoin na Terrastation ao preço de US$ 1 e vendiam a US$ 1,03. Ao fazer isso, havia uma injeção de UST, aumentando o suprimento e causando uma queda no preço e retomando a correspondência com US$ 1.

Em suma, o colapso do ecossistema foi causado quando arbitradores não quiseram mais participar desse sistema, trocando seus tokens UST por LUNA. Com a pressão de substituição, o suprimento de LUNA aumentou de forma significativa, derrubando seu preço. Vendo a queda do token, mais investidores correram para liquidar seus UST. O resultado foi a perda do pareamento, fazendo com que a stablecoin tivesse seu valor quase zerado.

O fim das stablecoins algorítmicas?

Já que o UST é diferente das duas stablecoins mais utilizadas no mercado, é possível que as stablecoins algorítmicas atraiam toda a “má fama” e sofram restrições de reguladores? Felipe Fernandez, analista CNPI da VG Research, diz que as stablecoins algorítmicas ainda precisam se mostrar mais seguras.

“Em momentos de baixa liquidez ou de maiores incertezas, qualquer stablecoin totalmente algorítmica pode facilmente se provar um risco e perder a paridade com o dólar. A facilidade de algum grande investidor iniciar um movimento de estresse em alguma das pontas e não haver nenhum colateral sobre essas stablecoins para garantir o pareamento é um risco que nenhuma stablecoin algorítmica ainda se provou imune.”

O analista salienta, porém, que isso não significa o fim das stablecoins algorítmicas. O que pode acontecer, avalia Fernandez, é as stablecoins lastreadas terem um benefício maior no caso de uma onda regulatória, deixando menos atrativos os tokens baseados em algoritmos para garantir a paridade com o ativo cujo preço seguem.

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