Como uma japonesa está enfrentando o ‘Clube do Bolinha’ nas eleições do país

Arfiya Eri tem 33 anos e é a candidata mais jovem na corrida parlamentar, visando avançar questões como igualdade de gênero

Ex-funcionária do banco central do país busca lutar pela igualdade de gênero
Por Yuko Takeo - Shoko Oda
27 de Junho, 2022 | 01:41 PM

Bloomberg — Uma candidata às eleições parlamentares do Japão de 33 anos de idade e ascendência uigur visa acabar com a política do “Clube do Bolinha” do país.

Arfiya Eri afirmou que está na hora de o Japão abraçar as mudanças e que ela está protocolando sua candidatura como a candidata mais jovem nas eleições de 10 de julho da Câmara Alta apoiada pelo Partido Liberal Democrático (LDP, na sigla em inglês) – o grupo conservador há muito no poder que, segundo a críticas, melhoram os direitos das mulheres a passos de formiga.

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O Japão já é um país diversificado, só não vemos isso representado na política”, disse Eri, falando em entrevista à Bloomberg TV na segunda-feira (27). “É algo que eu gostaria de trazer com minha candidatura”.

Em um dos países mais homogêneos do mundo, Eri – que fala sete idiomas – se destaca. Se vencer, ela faria parte de um pequeno número de legisladores japoneses naturalizados e provavelmente seria 20 anos mais jovem que a maioria dos membros.

Nascida em Fukuoka, no sul do Japão, descendente de uigures da parte de seu pai e uzbeques da parte de sua mãe, Eri ganhou a nacionalidade japonesa quando criança. Ela se mudou para Xangai aos 10 anos de idade e, após frequentar escolas americanas na China, formou-se na Universidade de Georgetown, em Washington.

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Sua escolaridade e formação acadêmica ajudaram a moldar sua visão de mundo, principalmente quando se trata da China, acusada pelos Estados Unidos de genocídio de sua minoria uigur. A China vem negando consistentemente as alegações de opressão contra uigures muçulmanos, apelidando-as de “a mentira do século”.

“Eu vi um mundo antidemocrático, e o vivenciei de uma maneira muito significativa”, disse Eri. “Entendo profundamente o que acontece quando desistimos não protegemos nossa democracia”.

O primeiro-ministro Fumio Kishida e seu LDP reagiram a uma China mais assertiva, ao mesmo tempo em que cuidadosamente lidaram com um país que é o maior parceiro comercial do Japão. Assustado com o ataque da Rússia à Ucrânia, Kishida, outrora com postura mais dovish, prometeu um aumento substancial dos gastos militares a partir de um limite habitual de cerca de 1% do produto interno bruto – rompendo com a tradição de um país com uma constituição pacifista.

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Apesar das mudanças notáveis na frente internacional, dentro do país, os governos do LDP não progrediram muito na redução de uma lacuna de gênero no empoderamento político, resultando na classificação do país em 147º lugar entre 155 países pelo Fórum Econômico Mundial.

Embora o percentual de candidatas que entrarão nas próximas eleições seja a mais alta registrada – em cerca de 30% – o LDP teve um dos menores percentuais de candidatas entre os partidos – 23% – e acordo com o jornal Tokyo Shimbun. Cerca da metade dos candidatos do maior grupo da oposição, o Partido Democrático Constitucional, são mulheres.

“Acreditamos que, ao conseguirmos que as candidatas vençam aos eleições, a política japonesa realmente mudará”, disse a secretária geral do grupo, Chinami Nishimura, em uma de imprensa este mês.

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As dificuldades que as mulheres enfrentam para chegar ao topo no LDP refletem em parte sua escassez em todos os níveis partidários. Apenas 10% do total dos membros da poderosa câmara baixa da Dieta – poder legislativo do país – são mulheres. No LDP, esse percentual é de 8%. O Japão ocupa a 162ª posição entre os 193 países pesquisados pela União Interparlamentar em termos de equilíbrio de gênero – atrás do Bahrein e da Arábia Saudita.

“Ainda somos um Clube do Bolinha”, disse Eri. “Mas reconhecemos a situação, e esse já é um começo”.

Japão figura em 147º lugar entre 155 países

Eri, que também trabalhou no Banco do Japão, diz que decidiu candidatar-se pelo LDP porque acredita que o partido governante é o único equipado para proteger a segurança nacional e governar o Japão através de múltiplas crises, incluindo a de covid-19.

Como candidata para o segmento nacional de representação proporcional da eleição, Eri está disputando votos de todo o país. Seus concorrentes incluem ex-ministros e candidatos com apoio da indústria, mas seu destino dependerá de quantos votos o partido governante e ela própria receberão. As recentes eleições gerais tenderam a mostrar uma participação historicamente baixa dos eleitores.

Cerca de 36% dos entrevistados de uma pesquisa do jornal Yomiuri publicada na semana passada disseram que pretendem votar no LDP, que tem uma base de eleitores mais velhos nos círculos rurais, na seção de representação proporcional, e todos os outros partidos possuem 10% ou menos.

“Precisamos de uma melhor representação – os jovens precisam se sentir representados e que o futuro está em suas mãos”, disse Eri. “Neste momento, muito antagonismo vem do fato de que a maioria dos políticos parece o mesmo aos olhos dos jovens”.

Se for eleita, Eri diz que vai pressionar por uma postura mais rígida quanto aos princípios democráticos e à segurança nacional. Uma abordagem urgente da mudança climática é outra área que ela defenderá, assim como a diversidade.

“São áreas que realmente estão fazendo o Japão avançar”, disse Eri. “É um salto quântico para garantir que nos tornemos um país adequado para o século XXI e que se adapte à diversidade que já temos”.

--Com a colaboração de Isabel Reynolds, Takashi Hirokawa, Sophie Jackman, Shery Ahn, Haidi Lun e Emi Nobuhiro.

--Este texto foi traduzido por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.

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