Bloomberg — Por mais de dois anos, o principal assunto em quase todos os cantos tem sido sobre os impactos do coronavírus. Agora que o pior da pandemia parece ter passado e as pessoas estão voltando a viajar, outro assunto está na ponta da língua de todo mundo: o alto custo das passagens aéreas.
As pessoas estão procurando voos - muitas vezes pela primeira vez desde o início da pandemia - em um movimento que foi chamado de “viagem da vingança”. Sites de buscas de passagens mostram tarifas altíssimas para a maioria das rotas, mas aqueles que querem viajar estão dispostos a pagar por custos mais altos depois de tanto tempo “de castigo”.
“A demanda está fora do normal”, disse o CEO da Delta Air Lines, Ed Bastian, em uma conferência do setor na semana passada, ressaltando que as tarifas para o verão do Hemisfério Norte, a partir de junho, podem ser 30% mais altas do que os níveis pré-pandemia. “Está vindo com lazer, vem com clientes premium, vem com negócios, vem com internacional. Não importa qual é a categoria.”
Tendência global
A tendência aparece em todos os cantos do mundo, embora alguns destinos custem bem mais do que outros. As buscas por uma passagem de ida e volta em classe econômica entre Hong Kong e Londres na Cathay Pacific Airways no final de junho chegam em até HK$ 42.051 (ou US$ 5.360), o que é mais de cinco vezes o custo típico antes da pandemia. Ao mesmo tempo, voos diretos entre Nova York e Londres para o mesmo período custam mais de US$ 2 mil na classe econômica.
“Os preços das passagens estão muito altos hoje em dia”, disse Jacqueline Khoo, que trabalha com turismo. Sua empresa pagou US$ 3.632 dólares pela viagem de volta de um colega com a Singapore Airlines para Hamburgo no final deste mês. O mesmo costumava custar cerca de S$ 2.000 (US$ 1.453), disse ela. “É realmente incrível que uma passagem na categoria econômica custe tanto.”
De acordo com um estudo do Mastercard Economics Institute, o custo para voar de Cingapura foi, em média, 27% maior em abril do que em 2019, enquanto os voos desde a Austrália ficaram 20% mais caros. Cada vez mais, quem viaja acaba reservando as passagens com meses de antecedência, já que o custo da compra no último minuto pode ser alto, disse David Mann, economista-chefe para Ásia-Pacífico, Oriente Médio e África do instituto.
Jatos estacionados
As transportadoras estão cautelosas em trazer de volta todos os seus jatos estacionados e ociosos, embora a maioria dos países tenha aliviado suas restrições transfronteiriças. Aeronaves gigantes como a A380 da Airbus SE e os 747-8s mais antigos da Boeing, também acabam ficando paradas à medida que as companhias aéreas se voltam para modelos mais eficientes em termos de combustível, como A350s e 787 Dreamliners, da Boeing. A pressão é maior na Ásia, a última a aliviar as restrições relacionadas ao coronavírus.
Depois de passar por diferentes políticas governamentais e por intensas mudança nos últimos dois anos, vai levar tempo para que as companhias aéreas reconstruam suas frotas, já que muitas restrições só foram amenizadas em maio, disse Subhas Menon, diretor geral da Associação de Companhias Aéreas da Ásia-Pacífico. “Ainda é cedo”, disse ele. “Estamos apenas em junho”.
As operadoras também reduziram suas operações durante o pior da pandemia, principalmente a Cathay, que foi limitada pelas onerosas regras de viagem e quarentena de Hong Kong. Com isso, a British Airways ainda não retomou os voos para Hong Kong.
Com menos aviões nos céus, há menos assentos para atender à recuperação da demanda, que por sua vez elevou as tarifas.
Combustível caro
A invasão da Ucrânia pela Rússia exacerbou o aumento constante dos preços do petróleo bruto nos últimos 18 meses. O combustível de aviação agora representa até 38% dos custos médios de uma companhia aérea, acima dos 27% nos anos anteriores a 2019. Para algumas companhias aéreas de baixo custo, essa fatia pode chegar a 50%.
Os preços do combustível para aeronaves em Nova York subiram mais de 80% este ano, embora os preços ainda variem de região para região, dependendo dos custos de refino e dos impostos locais. Muitas companhias aéreas americanas conseguiram cobrir o aumento dos custos de combustível até agora - mas apenas os repassando para os viajantes na forma de tarifas mais altas.
Em março, analistas do Citigroup disseram que alguns investidores acreditavam que as companhias aéreas podiam aumentar as taxas sobre o combustível como forma de lidar com a situação. A maioria das companhias aéreas da Ásia não faz hedge sobre combustível de aviação, o que significa que elas ficam mais vulneráveis a aumentos e oscilações de preços.
Quem são os passageiros?
Os custos mais altos das passagens não parecem intimidar aqueles que querem viajar agora que as restrições são bem mais brandas. Alguns optaram por aproveitar suas reservas de dinheiro até mesmo para pedir upgrade de cabines mais caras, disse o diretor-geral da Associação Internacional de Transporte Aéreo, Willie Walsh, no mês passado.
“O “passageiro da vingança” é um indivíduo que provavelmente foi emocionalmente afetado pelos bloqueios e desejou desesperadamente viajar e se movimentar nos últimos dois anos”, disse Hermione Joye, líder do setor de viagens na Ásia-Pacífico da Alphabet do Google. “São movimentos espontâneos.”
Falta de pessoal
Centenas de milhares de pilotos, comissários de bordo, funcionários de solo e de variados setores da aviação perderam seus empregos nos últimos dois anos. Com a retomada das viagens, o setor agora é incapaz de contratar com rapidez suficiente para permitir que as operações retomem seus níveis pré-pandemia.
Um exemplo disso é que o aeroporto Changi de Cingapura - constantemente eleito o melhor do mundo - pretende recrutar mais de 6 mil pessoas. Muitos que foram demitidos encontraram outras carreiras menos instáveis e não estão dispostos a voltar para uma indústria tão volátil. Um operador em Changi está oferecendo um bônus de adesão de S$ 25 mil (US$ 18.169) para policiais auxiliares, um trabalho que paga no máximo S$ 3.700 (US$ 2.689) por mês.
Nos Estados Unidos, as companhias aéreas menores e mais reginais não conseguem voar com sua capacidade total porque as companhias maiores contrataram muitos pilotos. Centenas de voos foram cancelados no Reino Unido, prejudicando planos de férias e levando a longos atrasos e cenas de passageiros dormindo nos aeroportos. Na Europa, os principais aeroportos enfrentam atrasos e cancelamentos por problemas com mão de obra e contratação, o que também contribuiu para aumentar os custos.
Receita
A aviação é uma indústria de capital intensivo com margens historicamente pequenas, a covid tornou esse ambiente ainda mais desafiador: globalmente, as companhias aéreas perderam mais de US$ 200 bilhões em três anos.
“Nunca vimos uma receita assim, liderada pelo lazer doméstico”, disse o CEO da American Airlines Group, Robert Isom, em uma conferência do setor na semana passada. “Além disso, vemos grandes corporações retomando fôlego. As pequenas e médias empresas acabaram ficando fora do gráfico há meses.”
Até quando?
Ainda não é claro por quanto tempo esses preços altos vão persistir, mesmo que muitos pareçam dispostos a pagar por isso.
“O aumento dos preços é um fenômeno de curto prazo”, estima Stephen Tracy, diretor de operações da Milieu Insight, uma empresa de análise de risco com sede em Cingapura. “Vamos todos torcer para que, uma vez que tudo volte aos níveis habituais, os preços voltem a cair. E estou bastante confiante que eles vão.”
Mas em alguns casos mais raros, as tarifas acabam mais baixas do que os níveis pré-pandemia, de acordo com Michael O’Leary, CEO da Ryanair Holdings. Ele ainda que, embora haja uma perspectiva de que mais tarifas retornem aos níveis pré-pandemia, a guerra na Ucrânia e os surtos de vírus ainda são riscos consideráveis no horizonte.
--Com a ajuda deParque Kyunghee ,Maria Schlangenstein ,Justin Bachman eDanny Lee.
– Esta notícia foi traduzida por Melina Flynn, Content Producer da Bloomberg Línea.
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