Bloomberg Línea — A proporção de brasileiros que sente não ter mais o mesmo poder de compra voltou a crescer. Seis em cada dez pessoas disseram ao Datafolha sentirem restrições financeiras em casa, segundo pesquisa divulgada neste domingo (26).
Do total de entrevistados, 37% disseram que o dinheiro da família não é suficiente e às vezes falta, e 26% disseram que o dinheiro é pouco e têm “dificuldades”. No total, 63% dos pesquisados informaram que as rendas de suas famílias não são suficientes. Há um ano, essa cifra era de 55%.
A pesquisa foi feita entre os dias 22 e 23 de junho e ouviu 2.556 pessoas. A margem de erro é de dois pontos, para mais ou para menos.
Segundo o Datafolha, é a primeira vez que a quantidade de brasileiros que sente queda no poder de compra sobe desde que a cifra atingiu o pico histórico, de 67%, em julho de 2016. Houve, portanto, uma reversão da percepção das pessoas sobre suas condições de vida.
O recorte da pesquisa por renda mostra que a situação das pessoas que ganham até dois salários mínimos é ainda pior. Nesse grupo, 42% disseram que o dinheiro da família não é suficiente e 39% disseram ter dificuldades.
Ao mesmo tempo, 32% dos entrevistados disseram que a renda de suas famílias é “exatamente o que eu preciso para sobreviver”. Há um ano, essa cifra era 39%.
Os dados são importantes para mostrar o contexto no qual estão inseridas as eleições deste ano.
Para 44% dos eleitores, a economia é o principal problema do país no momento, do quais 23% veem a inflação como o principal problema, segundo pesquisa Genial/Quaest divulgada no início deste mês.
A mesma pesquisa mostrou que 28% dos eleitores consideram o presidente Jair Bolsonaro (PL) o maior responsável pela inflação e 56% dos entrevistados disseram que a situação econômica do país “influencia muito” nos seus votos para presidente. Bolsonaro está em segundo em todas as pesquisas de intenção de voto divulgadas desde o início do ano passado, atrás do ex-presidente Lula (PT).
A pesquisa do Datafolha divulgada neste domingo mostrou que 63% dos brasileiros acreditam que a inflação vai aumentar. Em março, essa cifra era de 74%. Há um ano, 46%.
A inflação vem batendo recordes neste ano. Chegou a 12,13% no acumulado de 12 meses até abril, o maior índice desde 2003. Em maio, recuou para 11,73%, mas ainda nos níveis mais altos das últimas décadas.
Os combustíveis têm sido considerados os grandes vilões, depois dos seguidos aumentos de preços anunciados pela Petrobras — na semana passada, a estatal anunciou aumento de 5,18% no preço da gasolina e de 14,26% no preço do diesel. Mas a alta tem sido generalizada. Em maio, a inflação dos legumes foi de 69,9% no acumulado de 12 meses. A da conta de luz, de 20%.
E o número de pessoas que passam fome chegou a 33 milhões neste ano, o mesmo nível de 30 anos atrás, enquanto 58% das pessoas estão em situação de insegurança alimentar (não fazem todas as refeições por dia).
Já o valor médio da cesta básica chegou a R$ 663,29, cerca de 55% do salário mínimo. É o maior percentual desde 2004, segundo dados do Departamento Intersindical de Estudos Socieconômicos (Dieese).
São números que ajudam a explicar os últimos movimentos do governo Bolsonaro na área econômica.
Nas últimas semanas, o governo negociou com o Senado a aprovação de uma lei que limita em 17% o ICMS cobrado pelos estados sobre os combustíveis.
Bolsonaro queria ainda fazer com que os estados zerassem o ICMS. Para isso, enviou ao Congresso uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que pretendia criar um programa de ressarcimento aos estados que deixassem de cobrar o imposto sobre os combustíveis.
A medida foi considerada ineficiente e inútil contra a alta dos combustíveis, que tem sido causada por outras questões além da carga tributária — especialmente a política de preços da Petrobras, que acompanha as variações do mercado internacional, atingido pelos efeitos da invasão da Ucrânia pela Rússia.
Mas agora os planos mudaram. O governo agora quer aumentar ainda mais o valor do Auxílio Brasil, versão bolsonarista do Bolsa Família, hoje em R$ 400. A ideia é elevar o benefício para R$ 600, além de criar um vale de R$ 1 mil para caminhoneiros autônomos e um auxílio para compra de gás de cozinha. O custo total dessas medidas seria de R$ 30 bilhões, segundo o Ministério da Economia.
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