Bloomberg Opinion — No início da pandemia, a narrativa era que o trabalho remoto era um problema para jovens trabalhadores que estavam presos em apartamentos minúsculos e uma alegria para os chefes que vivem em grandes casas. Os subordinados estavam perdendo o aprendizado presencial, enquanto seus superiores estavam mais focados em como gastar as economias acumuladas com o dinheiro do transporte público.
Na verdade, as atitudes em relação ao trabalho remoto são muito menos polarizadas.
A maioria dos trabalhadores tradicionais parece valorizar a oportunidade de trabalhar em casa pelo menos um dia por semana. Existe uma certa variação de acordo com a idade, mas não é grande ou consistente o suficiente para ser significativa.
Um estudo recente dos consultores da McKinsey & Co. constatou que trabalhadores entre 18 e 34 anos tinham 59% mais probabilidade de deixar a empresa do que os trabalhadores de 55 a 64 anos de idade se seu empregador não oferecesse um sistema de trabalho híbrido.
Uma pesquisa mais ampla sobre acordos e comportamentos no trabalho – uma colaboração entre as universidades de Chicago, ITAM, MIT e Stanford – trouxe resultados mais matizados. Os trabalhadores na faixa dos 20 anos de idade são mais propensos a procurar um novo emprego se seu empregador negasse o trabalho híbrido. Mas os trabalhadores com mais de 50 anos de idade tinham mais probabilidade de pedir demissão no ato (é claro que os trabalhadores mais jovens podem ser mais ousados e os mais velhos podem estar de olho na aposentadoria).
Tudo depende de como abordar o assunto. Peça para que os trabalhadores pensem no trabalho remoto em termos de aumento de salário por alguns dias e você verá que aqueles na casa dos 30 anos pedirão o maior valor. Pergunte qual seria o valor do aumento de salário necessário para que o funcionário fosse trabalhar presencialmente cinco dias por semana e verá que são os maiores de 50 anos que querem o maior aumento.
O ponto importante é que o apoio a um acordo de trabalho híbrido é alto em todos os aspectos. O apelo da redução do tempo de deslocamento – muitas vezes o benefício mais mencionado do trabalho remoto – vai claramente além dos trabalhadores mais velhos. Os trabalhadores mais jovens podem sentir mais intensamente o impacto dos custos de transporte em sua renda. Por sua vez, os millennials se acostumaram com o espaço de trabalho compartilhado e a divisão de espaços comuns com colegas de quarto.
O que tudo isso significa para os empregadores? O aperto do mercado de trabalho e a necessidade de atrair novos talentos continuarão obrigando a maioria das grandes empresas a oferecer a opção de algum esquema de trabalho remoto. O inconveniente é que o impacto desta mudança no longo prazo continua desconhecido.
Parte desse meme do início da pandemia – a perda da aprendizagem no trabalho e da interação presencial – deve continuar sendo uma preocupação. A menor ocupação do escritório significa menos transferência de conhecimento entre gerações e relações internas mais fracas. Estes podem ser vistos como fontes de vantagem competitiva tanto quanto a capacidade de atrair talentos. Quando as coisas dão errado nas empresas, a explicação muitas vezes se resume à cultura.
Mesmo que a atividade possa ser dividida em tarefas individuais (melhor feitas remotamente) e tarefas colaborativas (melhor desempenhadas no escritório), algo inevitavelmente se perde na separação – a aprendizagem por imitação e a capacidade de interagir com um colega, por exemplo. Estes benefícios não desaparecem com o trabalho híbrido, mas correm o risco de diminuir.
Portanto, é de se esperar que os empregadores ofereçam a opção híbrida ao mesmo tempo em que incentivam o uso do escritório. Uma coisa que pode ajudar é propor horários de trabalho mais flexíveis para driblar os horários de pico de trânsito e lidar com compromissos não relacionados ao trabalho. O segundo maior motivo da atração do trabalho remoto é a capacidade de administrar responsabilidades domésticas e sociais, de acordo com uma enquete feita pelo King’s College London com trabalhadores londrinos. Os custos de deslocamento podem se tornar uma parte mais explícita das negociações salariais.
As empresas também deve reagir ao que as pessoas enxergam como desvantagens do trabalho no escritório – normalmente, a prevalência de distrações. Por exemplo, o Google, da Alphabet (GOOGL), supostamente planeja oferecer mais espaço em seus escritórios. Isso reforça a tendência da busca por espaço de maior qualidade em locais privilegiados. As taxas de vacância para escritórios de primeira categoria eram apenas 4% no centro de Londres ante 8% no final de 2021, de acordo com os consultores imobiliários da Cushman & Wakefield. A incorporadora British Land recentemente pré-arrendou um edifício no distrito financeiro de Londres quatro anos antes de sua conclusão.
Mas a modernização dos escritórios das principais cidades do mundo para a era pós-pandemia não acontecerá da noite para o dia. A menos que as atitudes ou o equilíbrio de poder entre empregadores e empregados mudem radicalmente, a experiência com o trabalho híbrido terá muito tempo para mostrar seus resultados.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Chris Hughes é colunista da Bloomberg Opinion e cobre negócios. Foi repórter da Reuters Breakingviews, do Financial Times e do jornal Independent.
--Este texto foi traduzido por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.
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