Bloomberg Opinion — Sheryl Sandberg, COO da Meta Platforms (FB), está deixando o cargo após 14 anos administrando a empresa ao lado de Mark Zuckerberg. Era “hora de escrever o próximo capítulo da minha vida”, disse em uma publicação com mais de mil palavras no Facebook, acompanhada de comentários efusivos de seus colegas executivos da empresa.
Sua saída já era esperada há algum tempo. Uma investigação do Wall Street Journal no ano passado, que analisou dados internos do Facebook, constatou que o percentual do pessoal subordinado à Sandberg, de 52 anos, vinha diminuindo nos últimos anos. Segundo uma pessoa próxima da empresa, também havia rumores de tensões com Zuckerberg e formação de grupos rivais nas equipes executiva e de relações públicas.
O legado de Sandberg é controverso. Ela foi fundamental para ajudar a empresa a atingir uma escala sem precedentes de mais de dois bilhões de usuários ativos depois que Zuckerberg a roubou do Google em 2008, quando ele tinha apenas 23 anos, para fazer crescer o negócio publicitário do Facebook. Ela conseguiu fazê-lo com muito sucesso: cerca de 97% da receita de US$ 117 bilhões do Facebook em 2021 foi proveniente da venda de anúncios. O crescimento implacável do Facebook fez dela uma bilionária em teoria.
Mas a habilidade de Sandberg no crescimento do negócio teve um preço – para os usuários do Facebook, para um discurso saudável e, possivelmente, para a própria democracia. As fake news corriam soltas na rede no período que antecedeu as eleições presidenciais dos Estados Unidos em 2016, que levaram Donald Trump ao poder.
Mais recentemente, uma denunciante acusou a empresa de contribuir para a insurreição de 6 de janeiro de 2021 no Capitólio dos Estados Unidos devido à insuficiência de investimentos em segurança. Para os críticos do Facebook, a empresa estava causando danos à sociedade por causa de uma mentalidade de crescimento a todo custo impulsionada por Sandberg e Zuckerberg.
Alguns executivos que trabalharam com Sandberg se manifestaram. Roger McNamee, o proeminente capitalista de risco do Vale do Silício que ajudou a intermediar suas primeiras reuniões com Zuckerberg em 2008, escreveu o livro Zucked e ressaltou que o tamanho do Facebook quase impossibilitou a moderação de diferentes idiomas e culturas de seus usuários.
O cofundador do WhatsApp Brian Acton também ficou chateado com a obsessão de Sandberg pelo crescimento. Alguns anos depois de vender o WhatsApp ao Facebook por US$ 19 bilhões em 2014, ele propôs a monetização do aplicativo por meio de um modelo de pagamento por uso que cobraria das empresas uma fração de um centavo por um grande número de mensagens. Mas em uma entrevista de 2018, ele comentou que Sandberg recusou a ideia. “Suas palavras foram: ‘Não vai crescer”, disse na época. A publicidade era o caminho final para maiores lucros.
Agora Sandberg está partindo exatamente no momento em que essa máquina de dinheiro está em xeque. O Facebook disse recentemente que teria um prejuízo de US$ 10 bilhões em 2022 como resultado das questões de privacidade do iOS da Apple (AAPL). E a mudança drástica de Zuckerberg para o metaverso fez com que a empresa desembolsasse mais de US$ 10 bilhões com novas tecnologias que ainda devem levar anos até que se tornem populares.
Embora o próprio feed de Zuckerberg no Facebook tenha sido inundado com atualizações sobre os projetos do metaverso ou em parceria com empresas menores, como luvas que podem receber feedback táctil para que você consiga “tocar” objetos na realidade virtual, Sandberg tem preferido o silêncio sobre a iniciativa de alta tecnologia.
Por anos, seu cargo foi guiar o lado mundano do negócio ao passo que Zuckerberg buscava projetos mais empolgantes. Nas apresentações de resultados, ela frequentemente exaltava a contribuição do Facebook a pequenos negócios e pressionava jornalistas a falar sobre o assunto. Ela depôs perante o Congresso no lugar de Zuckerberg e participaria do Fórum Econômico Mundial em Davos, enquanto o CEO do Facebook ficava em casa.
Um ex-executivo sênior do Facebook me contou certa vez que a única coisa de que tinha certeza sobre Zuckerberg e Sandberg era que eles deixariam a empresa somente se Wall Street quisesse. Isso significava uma queda no preço das ações da empresa abaixo de um certo limite, como US$ 100.
As ações da Meta fecharam a quarta-feira (1) em US$ 188 – uma queda de 50% em relação aos US$ 378 que custavam no ano passado. A capitalização de mercado do Facebook se aproximou de US$ 1 trilhão na época e agora está pairando em torno de US$ 500 bilhões. Outra figura crucial na história de crescimento do Facebook que também deixou a empresa foi Peter Thiel, primeiro investidor externo do Facebook e um guia para Zuckerberg. Ele recentemente saiu do conselho de administração da empresa após 17 anos.
Embora Zuckerberg tenha dito publicamente que continuará sendo CEO nos próximos anos, sua aparente obsessão com a realidade virtual deixa o Facebook cada vez mais sem direção.
As partidas de Sandberg e Thiel ocorreram em um momento de grande incerteza financeira para a Meta. Não está claro como a empresa planeja ganhar dinheiro no metaverso, ou quanto custarão as mudanças de privacidade da Apple, ou a amplitude da remodelação de seus algoritmos para os usuários na Europa segundo as próximas leis de segurança online da região, possivelmente prejudicando suas perspectivas de crescimento. Em fevereiro, a Meta registrou sua primeira queda no número de usuários ativos diários, sugerindo que seu negócio pode ter atingido o auge.
Se Sandberg está saindo da empresa em um momento desagradável, poderia ter sido pior se ela esperasse mais. O lado bom para os usuários, e talvez para a própria democracia, é que alguns dos executivos que levaram o Facebook rumo a uma escala irresponsável estão finalmente fora da empresa. Se Zuckerberg chegar a sair da condição de controlador majoritário das ações da empresa com direito a voto, isso traz uma perspectiva maior de nova liderança que pode priorizar a segurança em detrimento do crescimento. Mas, no momento, o futuro da empresa parece cada vez mais incerto.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Parmy Olson é colunista da Bloomberg Opinion e cobre a área de tecnologia. Já escreveu para o Wall Street Journal e a Forbes e é autora de “We Are Anonymous.”
--Este texto foi traduzido por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.
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