Bloomberg — O governo Biden anunciou que uma dúzia de países do Indo-Pacífico se juntará aos Estados Unidos em uma ampla iniciativa econômica projetada para combater a influência da China na região, mesmo que ainda haja dúvidas sobre sua eficácia.
Ao todo, os países envolvidos no Marco Regulatório Econômico Indo-Pacífico, ou IPEF, na sigla em inglês, constituem cerca de 40% do produto interno bruto global, de acordo com a Casa Branca, que elogiou o lançamento como uma conquista marcante da primeira viagem do presidente Joe Biden à Ásia. Austrália, Índia, Japão, Coreia do Sul e Nova Zelândia foram incluídos, juntamente com sete países do Sudeste Asiático.
“Estou confiante de que haverá benefícios para as empresas dos EUA”, disse a secretária de Comércio Gina Raimondo a repórteres em Tóquio no domingo (22). “Principalmente porque as empresas estão começando a procurar cada vez mais alternativas à China.”
O marco regulatório é o esforço mais significativo dos EUA para envolver a Ásia em questões econômicas desde 2017, quando o ex-presidente Donald Trump se retirou do Acordo de Associação Transpacífico (TPP, na sigla em inglês) negociado sob o governo Obama. Mas, diferentemente desse acordo comercial, o novo marco não inclui reduções tarifárias e não está claro quais partes são vinculativas, dificultando a quantificação dos benefícios econômicos.
“Este marco regulatório visa promover a resiliência, sustentabilidade, inclusão, crescimento econômico, justiça e competitividade para nossas economias”, disseram os países em comunicado conjunto. “Através desta iniciativa, pretendemos contribuir para a cooperação, estabilidade, prosperidade, desenvolvimento e paz na região.”
Democratas e republicanos no Congresso questionaram a iniciativa porque ela não inclui o objetivo de negociar reduções mútuas de tarifas para tornar as exportações dos EUA mais baratas para consumidores em mercados estrangeiros, um objetivo típico de negociações comerciais anteriores. Nos termos do novo marco, os participantes serão solicitados a assumir “compromissos de alto padrão” em pelo menos uma das quatro áreas: comércio, cadeias de suprimentos, energia limpa e justiça.
Os Quatro Pilares do IPEF
- Economia Conectada: os membros implementarão regras para a economia digital, incluindo padrões para fluxos de dados transfronteiriços, questões trabalhistas e ambientais e responsabilidade corporativa.
- Economia Resiliente: os membros buscarão compromissos que melhor antecipem e evitem interrupções, inclusive por meio de um sistema de alerta antecipado e diversificação.
- Economia Limpa: os membros buscarão metas que enfrentem as mudanças climáticas, inclusive nas áreas de energia renovável, remoção de carbono e padrões de eficiência energética.
- Economia Justa: os membros trabalharão em regimes tributários, de combate à lavagem de dinheiro e ao suborno.
Questionada no domingo se o Congresso precisará aprovar os acordos, a representante de comércio exterior dos EUA, Katherine Tai, não se comprometeu.
“Vamos ver para onde vão as discussões, mas temos que manter o Congresso próximo, e o Congresso precisa fazer parte do que fazemos com nossos parceiros”, disse Tai. Em audiência no Senado em março, ela discordou das críticas de que o IPEF não é suficientemente ambicioso, dizendo que incluirá elementos inovadores que as pessoas apreciarão com o tempo.
O conselheiro de segurança nacional dos EUA, Jake Sullivan, disse no domingo que os 13 países fundadores desenvolveriam critérios para a adesão de outros membros, possivelmente incluindo a China.
China fica de fora
“Não basta apenas pedir para participar do marco”, disse Sullivan. “Mas também queremos manter uma proposta de inclusão e diversidade de economias.”
Um funcionário de alto escalão do governo disse que os EUA não convidaram a China em parte porque o marco regulatório terá como base um conjunto de padrões que a Casa Branca acredita que Pequim terá dificuldade em cumprir. Os EUA selecionaram o grupo inicial com o desejo de ir além dos países com os quais têm laços econômicos profundos, ao mesmo tempo em que garantem que eles possam concordar com pelo menos um dos pilares, disse o funcionário.
O funcionário dos EUA disse que o prazo para alcançar compromissos substanciais – vinculativos e não vinculativos – será mais curto do que as negociações comerciais tradicionais que incluem reduções tarifárias. Os EUA esperam saber quais países participarão de cada um dos quatro pilares até meados de junho e pretendem ter compromissos substanciais em cerca de 12 a 18 meses, disse o funcionário.
Muitos países da região relutam em assinar qualquer acordo que não inclua a China – maior parceiro comercial da maioria dos governos. A oferta dos EUA de manter o marco aberto à China havia sido exigida especificamente por países do Sudeste Asiático. Brunei, Indonésia, Malásia, Filipinas, Singapura, Tailândia e Vietnã acabaram participando.
“É importante que os EUA e os países da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) tenham um lugar para manter discussões positivas e cooperativas para alcançar resultados concretos”, disse o primeiro-ministro japonês Fumio Kishida na segunda-feira (23) durante um briefing conjunto quando questionado sobre críticas ao IPEF. “Através desses esforços, podemos trazer benefícios concretos.”
A China acusou repetidamente os EUA de tentar conter sua ascensão formando alianças econômicas e militares na região. No domingo, o ministro das Relações Exteriores, Wang Yi, disse que a estratégia dos EUA no Indo-Pacífico estava “fadada ao fracasso”.
‘Destruindo a paz’
“Os fatos provarão que a chamada ‘estratégia Indo-Pacífico’ é essencialmente uma estratégia para criar divisões, incitar o confronto e destruir a paz”, disse o Ministério das Relações Exteriores da China em comunicado no domingo.
Os países incluídos no IPEF representam US$ 34,7 trilhões em produção global, ou cerca de 41%, em comparação com US$ 31,7 trilhões de membros do TPP, segundo cálculos da Bloomberg. O comércio com a região sustenta mais de três milhões de empregos americanos, segundo a Casa Branca.
As maiores economias do IPEF incluem Japão e Índia, que também são membros do Diálogo de Segurança Quadrilatera, ou Quad, além da Austrália. Biden planeja se reunir na terça-feira (24) com o primeiro-ministro indiano Narendra Modi em Tóquio como parte de uma cúpula do Quad, grupo projetado para combater o crescente poder econômico e militar da China na região.
Decisões difíceis
Os EUA não convidaram Taiwan para participar do marco regulatório, mesmo depois que mais de 50 senadores escreveram a Biden pedindo que ele incluísse o governo em Taipei. As tensões aumentaram recentemente em Taiwan, que tem sido o maior ponto de conflito militar em potencial entre os EUA e a China.
As empresas dos EUA receberam bem o esforço para assumir um papel de liderança na região e ver o potencial de ganhos econômicos reais no futuro, de acordo com Jake Colvin, presidente do Conselho Nacional de Comércio Exterior, um grupo empresarial que defende o comércio aberto e com regras.
“Obviamente, o melhor resultado é uma iniciativa de alto padrão com o maior número possível de países da região”, disse ele. “Mas, em algum momento, decisões difíceis terão de ser tomadas sobre quem está no grupo e os benefícios”.
--Com a colaboração de Jennifer Jacobs e Isabel Reynolds.
--Este texto foi traduzido por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.
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