Desde o seu surgimento em 2009, o bitcoin tem percorrido um longo caminho no mercado, em que já foi rotulado como moda passageira e até apontado como uma grande bolha financeira da era atual. Por anos, sua “morte” foi anunciada pela mídia, ainda mais em momentos nos quais vimos quedas abruptas do seu preço, algo que parecia corroborar todos os rótulos negativos adquiridos com o tempo.
Entretanto, após esses momentos de estresse, o bitcoin retornava mais forte, ressaltando sua relevância e sua antifragilidade - expressão popularizada pelo escritor Nassim Taleb, que descreve a capacidade de alguns ativos prosperarem diante do caos, do risco e da adversidade.
À medida que ganhava adeptos, o bitcoin também seguiu inspirando o surgimento de outros projetos baseados em blockchain, que se propunham a explorar diversos casos de uso e possibilidades de resolução de problemas. Em cima disso, vimos o surgimento das altcoins, que se somaram ao bitcoin, dando origem a um novo e amplo ecossistema de soluções financeiras, vertente denominada criptoeconomia, no qual encontramos diferentes formas de realizarmos operações financeiras de maneira inovadora e descentralizada e um abrangente espectro de criptoativos.
Desse modo, a percepção do mercado vem se modificando, passando a dar uma atenção especial a essa nova classe de ativos, que ganha evidência desde os terminais da Bloomberg até as conversas informais sobre investimentos entre amigos.
Inicialmente, encontrávamos as corretoras de criptomoedas como principais players que conseguiam dar acesso aos consumidores interessados nessa nova realidade financeira. Porém as coisas estão mudando e múltiplas portas de entrada para a criptoeconomia estão sendo abertas.
Das sombras aos holofotes do mercado
Ao longo desse processo de crescimento dos criptoativos, vimos, gradativamente, um processo de convergência entre a criptoeconomia e o mercado financeiro tradicional. Isso aconteceu, sobretudo, pela demanda dos consumidores, ávidos por fazerem parte dessa fascinante e lucrativa oportunidade. Assim, algumas fintechs (além das corretoras de criptomoedas) tornaram-se pioneiras por possibilitarem que seus clientes tivessem exposição a esse mundo.
Um dos movimentos internacionais mais emblemáticos nesse sentido aconteceu em 2017, quando o neobank britânico Revolut começou a ofertar um serviço de compra e venda de criptoativos para seus clientes. No ano seguinte, foi a vez de a fintech Robinhood (focada na oferta de produtos tradicionais de investimento, como ações e opções) seguir esse caminho.
No final de 2020, o PayPal lançou uma solução que permitia que seus clientes comprassem, mantivessem e vendessem criptoativos diretamente de sua conta do PayPal, além de possibilitar o pagamento via cripto de compras realizadas junto aos milhões de comerciantes que fazem parte da sua rede.
A atitude dessas fintechs foi repetida por outras startups financeiras e por diversos bancos tradicionais mundo afora, como Credit Suisse, Société Générale e Goldman Sachs, dentre outros. Aqui no Brasil a tendência se confirma com os recentes anúncios de BTG Pactual, Mercado Pago, Nubank e XP (que já operou no mercado cripto anteriormente) em direção a esse mercado com uma clara estratégia de atuação.
Os agentes viabilizadores da transformação
Por trás de vários desses casos de avanço de instituições tradicionais rumo a essa nova fronteira do mercado financeiro encontramos fintechs especializadas em Crypto-as-a-Service (por vezes chamado também de Blockchain-as-a-Service).
São players responsáveis por proverem a infraestrutura necessária para que essas empresas possam habilitar soluções baseadas em criptoativos para os seus próprios clientes. A lógica é parecida com o Banking-as-a-service, contudo, pode ser considerado um próximo passo que possibilita embutir nas empresas uma nova geração de serviços financeiros baseados em blockchain.
Vale ressaltar que esse é um terreno no qual poucos possuem domínio real (do ponto de vista tecnológico, regulatório e operacional) e em que a curva de aprendizagem e o desenvolvimento dessa capacidade dentro de casa pode levar mais tempo do que é possível esperar. É algo que fortalece a tese de que se faz necessária a utilização dos serviços de parceiros ou, alternativamente, a compra de startups especializadas dentro do mundo cripto.
A oportunidade existente na inserção de instituições do mercado financeiro tradicional e de outras empresas de variados setores no contexto da criptoeconomia é tão grande que atraiu diversos players para essa arena. De modo geral, eles podem ser divididos em três grupos (nos quais podemos citar cases internacionais e nacionais, respectivamente):
- Empresas que iniciaram suas atividades como corretoras e estão expandindo sua atuação para o mercado B2B de infraestrutura, como é o caso da Paxos e da Foxbit;
- Players que são nativos desse espaço, que já nasceram visando aproveitar essas oportunidades (ou que atuavam em outro campo da criptoeconomia, que não seja corretagem, e acabaram pivotando), como a Ramp e a Bitfy;
- E companhias que atuavam com infraestrutura para o mercado tradicional, como Banking-as-a-Service ou Fintech-as-a-Service, e hoje buscam explorar esse novo nicho, que é o caso da Nium e da Dock.
O crescimento desses agentes viabilizadores é uma das tendências mais quentes do mercado atualmente, visto que vários fundos de VC estão com grande apetite junto ao mercado cripto – e, nesse contexto, os provedores de Crypto-as-a-Service se tornam fundamentais no processo de convergência –, sendo que há uma grande quantidade de empresas que deve realizar sua transição nesse sentido.
No final das contas, estamos falando sobre os primeiros passos rumo à infraestrutura do futuro e seus novos caminhos, que certamente devem acelerar e ganhar corpo com a evolução da Web3 e seus diferentes elementos (DeFi, NFTs, Metaverso, dentre outros). Sem sombra de dúvidas, a possibilidade de negociação de criptoativos é apenas o primeiro passo dentro de um vasto rol de oportunidades.
Sendo assim, não estranhe se em um futuro muito próximo você receba um e-mail do seu banco te convidando para uma call sobre perspectivas do cenário cripto, ou se em seu próximo encontro com o seu consultor financeiro (ou gerente) você receba alguma recomendação para posicionar um percentual do seu portfólio nesse mercado. Essa nova classe de ativo veio para ficar, e múltiplos caminhos estão surgindo para os investidores e os empreendedores daqui por diante.
*Bruno Diniz é sócio da Spiralem Innovation Consulting, diretor da Financial Data & Technology Association (FDATA) para a América Latina, especialista em inovação no mercado financeiro e autor dos best-sellers “O Fenômeno Fintech” e a “Nova Lógica Financeira”.
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