Presidente do Itaú: Alta de juros favorece bancos tradicionais

Instituições com histórico sólido confrontam tecnologia financeira mais recente em cenário adverso, diz executivo

Milton Maluhy, presidente do Itaú
Por Felipe Marques e Cristiane Lucchesi
16 de Maio, 2022 | 08:31 AM

Bloomberg — Investir no maior banco da América Latina parecia cada vez menos atraente em comparação às novatas fintechs quando Milton Maluhy assumiu como presidente no ano passado.

O Itaú (ITUB4) acumulava queda de 35% em suas ações entre 2019 e 2020, perdendo R$ 130 bilhões em valor de mercado, enquanto concorrentes digitais como a Stone (STNE) estavam bombando. O temor dos investidores era de que o banco de Maluhy ficasse para trás comendo poeira, um dinossauro que não conseguiria acompanhar a revolução digital.

Só que esses medos não se concretizaram. O aumento dos juros e a redução da liquidez global estão derrubando as ações das fintechs, enquanto bancos mais tradicionais, como o Itaú, são vistos como apostas mais seguras. E assim, com 15 meses no cargo, Maluhy pode se gabar de uma recuperação do preço de 18% desde o começo do ano, dividendos crescentes e uma lista de aquisições que ele diz vão modernizar o gigante do setor bancário de quase 100 anos.

Enquanto isso, empresas de tecnologia financeira como Stone e Nubank (NU) caíram até 50% este ano devido ao ceticismo de que vão conseguir cumprir suas promessas de crescimento em um ambiente mais hostil.

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“A alta de juros e a menor demanda por crédito vão exigir dos bancos bastante resiliência operacional”, disse Maluhy, 45, em resposta a perguntas enviadas por e-mail. “Isso eventualmente favorecerá quem acumula mais conhecimento sobre mercado e possui uma sólida estrutura de capital.”

O principal executivo do Itaú, que começou no banco em 2002 e ocupou cargos em áreas que vão desde câmbio e tesouraria até cartões de crédito, está pressionando por ainda mais mudanças – e cada vez mais rápido.

“Precisamos construir uma organização mais simples, ágil e eficiente”, disse Maluhy, que anteriormente liderou operações do Itaú no Chile e na Colômbia. “Nosso foco é acelerar cada vez mais essa transformação cultural e digital.”

Com esse objetivo em mente, o banco está de volta à caça de aquisições e parcerias. E agressivamente: analistas do BTG Pactual (BPAC11) disseram que o Itaú está em “modo de ataque” no setor de tecnologia.

Embora os reguladores tenham deixado claro que impediriam compras diretas de instituições financeiras, o banco está encontrando maneiras de fechar negócios em outras áreas. O Itaú vai desembolsar até R$ 1 bilhão em uma joint venture com a Totvs (TOTS3), que oferece software que ajuda as empresas a gerenciar seus negócios. E firmou parcerias com a Locaweb (LWSA3), provedora de serviços web, e com a Omie, que oferece programas de gestão de negócios para empresas.

O objetivo é liderar o processo de transformação digital por meio de investimentos e, sobretudo, por meio de uma mudança cultural dentro do banco, disse Maluhy.

Ainda assim, há dúvidas persistentes sobre como o banco se sairá contra os ventos contrários no horizonte.

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“A concorrência mais acirrada das fintechs continuará sendo um risco-chave para o Itaú, especialmente para seus negócios de cartões”, disse Diksha Gera, analista da Bloomberg Intelligence. A economia em dificuldades do Brasil e a incerteza política também pesarão negativamente no crescimento, disse ela.

Maluhy, que também é membro do conselho consultivo do Bloomberg New Economy Gateway Latin America, falou sobre outros tópicos:

Perspectivas para o Brasil

“A guerra na Ucrânia levou a uma disparada dos preços das commodities, algo que significa mais inflação no mundo todo”, disse Maluhy. “Mas também resulta em atividade econômica mais forte nos países produtores de commodities, como o Brasil.”

“Acreditamos que o Banco Central deverá elevar ainda mais a taxa Selic para conter esse novo choque inflacionário, e o pano de fundo do aperto monetário nos EUA apenas contribui nessa direção, uma vez que a alta dos juros por lá deve pressionar as taxas de câmbio nos mercados emergentes.”

Planos para a América Latina

“Hoje, nossa maior oportunidade está nas operações que já temos no Brasil e em outros países da América Latina”, disse. “Temos operações no Chile, Colômbia, Peru, Uruguai, Argentina e Paraguai, que estão entregando resultados e apresentando avanços importantes.”

“Nossa prioridade com as operações internacionais tem sido a de gerar valor para nossos acionistas. Aquisições fora do Brasil, por questões de assimetrias cambiais e tributárias, tendem a exigir uma grande alocação de capital, o que impacta negativamente no compromisso com os acionistas.”

Despesas

“Nosso foco é em eficiência, não simplesmente cortar custos”, disse o presidente do Itaú. “Nos últimos anos, fizemos uma revisão de onde e como usamos nossos recursos e nos adaptamos. Veja o número de colaboradores: ao final de 2018, tínhamos 86.800 colaboradores diretos no Brasil. Em dezembro de 2021, esse número saltou para 87.340, com ênfase para a contratação de profissionais da área de tecnologia.”

Agências

“A figura da agência bancária física tem sido ressignificada e se mostrado um ativo valioso para nós no atendimento dos nossos clientes, sobretudo na oferta de produtos mais complexos e sofisticados, como o financiamento imobiliário”, disse Maluhy. “Nosso objetivo é combinar cada vez mais o atendimento remoto e físico.”

Dimensão do banco

“O Itaú Unibanco tem o portfólio de produtos e serviços financeiros mais completo do mercado, maior que qualquer outro player, seja ele incumbente ou fintech”, disse. “Nossa base de clientes ativos é robusta, com quase 60 milhões de pessoas e empresas. Temos cerca de R$ 3 trilhões de ativos sob custódia e R$ 1 trilhão em crédito concedido.”

Com cerca de 70 petabytes de dados, o Itaú está “na jornada de modernização dos nossos sistemas e migração para a nuvem em larga escala”, disse ele.

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