Turquia é a mais recente a congelar preços para controlar inflação; há risco no Brasil?

Ministro das Finanças do país emergente está pedindo aos fabricantes e varejistas locais que imponham um congelamento temporário dos preços

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O ministro das Finanças da Turquia está pedindo aos fabricantes e varejistas locais que imponham um congelamento temporário dos preços, o mais recente passo do governo para tentar conter a inflação mais alta em duas décadas.

O ministro do Tesouro e das Finanças, Nureddin Nebati, fez seu apelo em reuniões consecutivas a portas fechadas em Istambul com empresários de diversos setores nesta quinta-feira (12), segundo uma pessoa com conhecimento direto do assunto.

O plano faz parte dos esforços para combater a inflação descontrolada sem recorrer ao aperto monetário, algo a que o presidente Recep Tayyip Erdogan se opõe.

Durante suas apresentações, o ministro citou exemplos de aumentos extremos de preços que estão prejudicando os consumidores e citou limites impostos pelo governo em outras partes do mundo, disse a pessoa, pedindo para não ser identificada porque as reuniões não foram divulgadas.

O Ministério do Tesouro e Finanças não quis comentar.

A invasão da Ucrânia pela Rússia agitou as cadeias de suprimentos globais e levou a um aumento nos preços das commodities, com os custos globais dos alimentos subindo perto do ritmo mais rápido de todos os tempos. Já sob pressão de uma lira fraca e sua política monetária ultrafrouxa, a Turquia também é um grande importador de petróleo que também dependeu da Rússia e da Ucrânia para muitas de suas compras de trigo.

Enquanto muitos bancos centrais, liderados pelo Federal Reserve dos EUA, responderam elevando as taxas de juros para conter as pressões sobre os preços, alguns países estão adotando uma abordagem menos convencional. O governo do México fechou um acordo neste mês com as principais empresas para limitar temporariamente os preços de 24 alimentos e outros produtos básicos. A Malásia mantém preços-teto para alguns bens de consumo.

Pressão de preços

As reuniões de Nebati sinalizam uma nova direção para o governo em seus esforços para conter a inflação ao consumidor que agora chegou a 70%, enquanto os preços de fábrica crescem três dígitos.

A urgência de agir está aumentando depois que o banco central indicou que não planeja aumentar sua taxa de referência do nível atual de 14% depois de cortá-la em 500 pontos base no ano passado. O Fundo Monetário Internacional prevê que a Turquia terminará este ano com a quarta inflação mais rápida do mundo em 52,4%, atrás apenas da Venezuela, Sudão e Zimbábue.

As várias rodadas de flexibilização monetária em 2021 descarrilaram a lira, que perdeu metade de seu valor em relação ao dólar em questão de semanas em dezembro. A intervenção do governo introduziu um breve período de estabilidade na moeda desde então, mas a lira ainda permanece 45% mais baixa em relação ao dólar em comparação com um ano atrás.

A moeda turca está sob pressão renovada nos últimos dias, com quedas desde o final do feriado do Eid, em 5 de maio, atingindo mais de 4%. A lira caiu mais de 13% este ano, o pior desempenho entre seus pares de mercados emergentes.

O governador Sahap Kavcioglu disse que a Turquia não precisava aumentar as taxas apenas porque outros bancos centrais, incluindo o Fed, estão fazendo isso. Na semana passada, o banco central dos EUA apresentou seu maior aumento desde 2000 e sinalizou que continuaria subindo nesse ritmo nas próximas duas reuniões.

A crença de que as taxas de juros mais altas aumentam os preços dos combustíveis é defendida por Erdogan, mas vai contra as suposições dos livros de bancos centrais de todo o mundo. O governo turco apoia a política de juros baixos de Kavcioglu para impulsionar o crescimento, argumentando que custos mais altos de empréstimos não necessariamente desacelerariam a inflação.

E no Brasil?

Quem viveu a década de 1980 lembra bem do congelamento empregado durante o governo de José Sarney, que, buscando controlar a inflação que chegou a 285% em 1986, determinou um tabelamento dos preços.

Porém agora, com o IPCA batendo 12% ao ano, de acordo com a última divulgação pelo IBGE desta semana, os temores por novas propostas de congelamento são bem menos intensos do que naquela época.

Segundo Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, em comentário à Bloomberg Línea, não há risco de congelamento de preços no Brasil.

“Nossa inflação pode ser combatida por meio de juros, como o Banco Central tem feito. Com inflação de 50% como na Turquia e na Argentina, a situação é mais difícil de lidar, mas certamente congelamento não funciona, como a própria experiência da América Latina tem demonstrado.“

Segundo ele, em algum momento, esses países terão que adotar âncoras fiscal e cambial para conter as pressões inflacionárias de forma estrutural, mas, agora, não há espaço político para tal.

“Nós estamos ainda longe disso [do risco de congelamento]. Ainda temos regras fiscais e metas de inflação que mal ou bem funcionam, sem explosão cambial”.

- Com informações sobre o Brasil apuradas por Ana Carolina Siedschlag, da equipe Bloomberg Línea

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