A aposta de mais US$ 100 mi que quer criar um ecossistema de energia solar

Aporte Série C na fintech de crédito Solfácil foi liderado pelo QED Investors com participação de SoftBank, Valor Capital Group e VEF

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Bloomberg Línea — A fintech Solfácil, que viabiliza financiamento para pessoas e empresas que querem instalar painéis solares, acabou de captar US$ 100 milhões em uma rodada Série C liderada pelo QED Investors. SoftBank, VEF e Valor Capital Group também participaram do aporte.

“Já somos um dos três maiores financiadores de energia solar do Brasil”, disse Fábio Carrara, CEO e fundador da empresa, em entrevista à Bloomberg Línea.

Além de financiar o sistema de energia solar, no ano passado, a fintech lançou seu marketplace para agregar parceiros integradores que podem vender o kit de painéis solares para o cliente final. Segundo Carrara, a rodada vem para acelerar a posição da fintech como agente financiador e ampliar o marketplace.

A Solfácil é uma das startups que conseguiu financiamento de equity em um momento em que o mercado de captação se tornou mais difícil para as empresas que já não estão no estágio inicial. Com o aumento da taxa de juros, financiar uma startup late-stage se torna mais caro para o investidor, o que faz com que os investimentos sejam mais seletivos. Shu Nyatta, ex-executivo do SoftBank, disse que o conglomerado japonês teria neste ano uma estratégia de manter os investimentos em empresas já investidas na América Latina, em detrimento de adicionar novas ao portfólio, como reportou o Financial Times.

Segundo a plataforma de inovação SlingHub, os investimentos nas startups da região desaceleraram em abril - seguindo tendência global - e as empresas de tecnologia da América Latina captaram US$ 812 milhões no mês passado, 12% a menos do que em março e 35% menos do que em abril de 2021.

“Realmente o mercado de captação para startups fechou bastante. Mas a Solfácil é uma empresa especial, acho que ela foi feita para esses tempos [de crise] porque agora o foco é rentabilidade. Caiu um pouco aquela ideia de crescimento a qualquer custo”, disse Carrara.

Embora a Solfácil não seja ainda lucrativa, o executivo disse que a empresa cresceu uma média de oito vezes ao ano nos últimos três anos queimando pouco caixa. “Nosso modelo é muito eficiente, foi feito para tempos como esse em que a liquidez do mercado diminuiu. É um reconhecimento fechar essa rodada neste momento, que é certamente mais difícil.”

Difícil, em especial, para as fintechs. E aquelas que trabalham com crédito sentem mais, ficando mais conservadoras em relação à qualidade da carteira de empréstimos. “O momento macro requer cautela. O endividamento das famílias aumenta e isso vai afetar a performance de todos os bancos, de todas as startups e isso já é visto nos resultados preliminares dos bancos”, disse Carrara.

Um cenário de mais cautela significa uma taxa de aprovação de crédito para o tomador menor. Mas, segundo o CEO, o mercado de energia solar não endivida e tem a particularidade de gerar renda adicional a longo prazo, já que, dentro desse raciocínio, quando o cliente financia o sistema de energia solar, ele acaba economizando mais energia do que paga de valor de parcela do crédito.

Estamos em um segmento privilegiado, que tem inadimplência três vezes menor do que os equivalentes como financiamento de veículos, por exemplo. Há, sim, um aumento de cautela, mas estamos em um segmento bom para [a concessão de] crédito”, disse.

Antes da Série C, a Solfácil já tinha captado cerca de US$ 35 milhões. A empresa superou a marca de mais de R$ 1 bilhão na carteira em financiamento de energia solar para mais de 40 mil clientes, entre pessoas físicas e empresas.

Do crédito para IoT para melhorar produtividade dos instaladores

Nos últimos três anos, a Solfácil trabalhou no desenvolvimento de um hardware que vai permitir que os parceiros integradores monitorem a performance da geração de energia dos painéis solares, sem dependência de internet do cliente. O dispositivo tem sua própria rede de comunicação de avisos inteligentes.

Se o sistema de energia solar estiver produzindo muito abaixo de energia do que ele deveria, o dispositivo permite que os instaladores resolvam esse problema à distância por meio de um hardware IoT.

“Nosso objetivo é dar acesso aos clientes por meio de uma solução inovadora para participar [da energia solar], ajudar na venda do kit solar para o cliente final, principalmente em épocas de dificuldade com a China em que a cadeia tem sofrido. E, por fim, ajudar o nosso parceiro integrador a cuidar do sistema do cliente pelos próximos trinta anos”, disse.

O dispositivo será lançado no segundo semestre, junto com iniciativas de seguro de proteção financeira para o cliente final. Carrara diz que a Solfácil deve lançar também um seguro de proteção do sistema de energia solar contra furtos ou desastres naturais. “Quando a gente está fazendo crédito a longo prazo, é importante garantir que se algo fora do comum aconteça, tanto o cliente quanto a gente esteja protegido”.

Entre as ferramentas desenvolvidas pela startup para ajudar o trabalho do integrador dos painéis solares está uma plataforma de monitoramento com os dados da geração de energia.

Hoje, a fintech tem mais de 8 mil parceiros integradores cadastrados na plataforma em todos os estados do Brasil. “Neste ano, o Brasil vai se tornar o maior mercado de energia solar distribuída do mundo depois da China, superando os Estados Unidos”, disse Carrara. “O Brasil tem crescido muito mais rápido”.

Neste ano, a fintech espera superar a marca de R$ 3 bilhões de carteira de crédito.

Solstar: a ex-empresa de Carrara hoje é sua concorrente

Carrara já foi integrador de energia solar. Ele fundou e comandou a empresa de instalação de energia solar Solstar de 2015 a 2017, e, em 2018, fez um spin-off para criar a fintech Solfácil.

Matheus Bazan, CEO e cofundador da Solstar, conta que a Solfácil nasceu como um projeto dentro da Solstar. Desde quando a empresa foi criada em 2015, até 2018, a Solstar foi um integrador tradicional de energia solar.

A Solstar faturou R$ 5 milhões em 2018 e deu um salto para R$ 100 milhões em 2021. “Fábio e eu estudamos juntos e sempre fomos bastante amigos. Ele é mais financeiro, então para ele fazia muito mais sentido [sair]. Mas, sem dúvida, se o Fábio tiver de 5% a 10% do mercado, seria uma empresa gigante porque ele está competindo com bancos”, disse Bazan, em entrevista à Bloomberg Línea.

Amigos, mas negócios à parte. Bazan assumiu o comando da empresa em 2019 e conseguiu crescer as vendas e escalar por importar kits de energia solar sem intermediários. Hoje, a Solstar tem uma plataforma com integradores e 160 representantes comerciais regionais que operam modelos de venda remota, além de 15 lojas físicas, e também está lançando uma linha de crédito. “Justamente para trazer uma solução completa. Estamos desenvolvendo soluções de aluguel, soluções de vários tipos para se posicionar como autoridade no processo como um todo”.

A Solstar quer ser o nome quando se pensa em geração de energia solar, mas também em gestão. “Vamos para a automação residencial, com uma análise técnica muito mais profunda do que hoje é feita pelos pelos integradores, que na verdade é quase tudo terceirizado. Temos tem uma estratégia um pouco diferente. Queremos fazer um raio-X da residência para sabermos como conseguimos reduzir o consumo de energia e prolongar esse sistema fotovoltaico”, explica Bazan.

A ideia é que o cliente saiba quanto custa, em termos de energia, um banho ou uma geladeira em detrimento de outra. “Se você puder me estender as suas informações, nossa estratégia é chegar a um nível de automação que leve a um empoderamento do cliente, com relatório, com tudo que ele quiser ter sobre a residência dele.”

Tudo isso será monitorado por um aplicativo. Segundo Bazan, a Solstar já tem um aplicativo para os instaladores da plataforma. “Como que eu consigo fazer um um projeto em São Luís do Maranhão e no Rio Grande do Sul com a mesma qualidade e garantia da execução considerando que esses instaladores não são nossos? A gente dominou esse processo de instalação em qualquer lugar do Brasil por meio de gestão remota”, explica.

Neste ano, a Solstar pretende faturar cerca de R$ 250 milhões. “Ter uma linha de crédito própria justifica um marketplace, justifica algumas coisas que tem sim uma sobreposição com o Fábio. Ninguém tem fidelidade ao banco. Se outro outro banco te liga com um cartão melhor, um limite maior, acaba a fidelidade. Agora, se você garantir a performance do sistema, é uma coisa com mais peso”, disse Bazan. A Solstar pretende fazer um piloto de originação de crédito via FIDC de R$ 20 milhões até junho.

Até 2024, a Solstar pretende faturar R$ 1 bilhão. “Não queremos simplesmente faturar, vamos criar valor para o cliente final ao longo do tempo. Não é simplesmente colocar um sistema em cima da casa dele.”

A empresa já fez quase 5 mil projetos. Segundo Bazan, com a pandemia, a empresa gastou quase R$ 700 mil por causa de atrasos na cadeia de suprimento global. “Houve quarenta dias de atraso e pagamos quarenta dias de conta de luz para todos os nossos clientes, justamente porque a nossa estratégia é a de garantia, de ter autoridade no setor. Olhamos o melhor para o nosso cliente final.”

Segundo Bazan, o Brasil tem hoje cerca de 15 mil empresas de energia solar, e a maioria são instaladores.

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