Bloomberg Opinion — Existe um mito sobre a falta de diversidade na indústria de tecnologia: ela apenas reflete quem estuda ciência da computação. Uma parte do problema é a entrada nesse campo. A outra parte é a cultura corporativa, que exclui muitas mulheres e pessoas de grupos minoritários que desejam fazer carreira na tecnologia no longo prazo . Mais da metade das mulheres em meio de carreira deixam a indústria, enquanto as mulheres em início de carreira têm uma taxa duas vezes maior de evasão do que os homens.
De acordo com minha pesquisa, há uma maneira simples de tornar a cultura da empresa menos tóxica: parar de pedir às mulheres, principalmente às que pertencem a grupos minoritários, que façam um trabalho pelo qual não são pagas e que acabam prejudicando suas carreiras.
Dadas as pesquisas anteriores que minha equipe realizou, não ficamos surpresos ao ver mulheres fazendo o “trabalho doméstico do escritório” – o tipo de tarefa que mantém os trens nos trilhos, mas não acarreta em aumentos ou promoções. Nós vimos isso de novo e de novo.
Mas um novo estudo sobre mulheres na tecnologia, escrito por mim, Rachel Korn e Asma Ghani, mostrou um padrão mais rígido. Essas mulheres não estavam apenas planejando festas ou tomando as notas em reuniões; algumas estavam até atuando como chefes de diversidade e inclusão ou RH sem remuneração adicional, algo que nunca vimos em outros setores que estudamos, como advocacia, arquitetura e até na universidade.
As disparidades raciais também foram mais amplas do que em outros campos. Enquanto as mulheres brancas na tecnologia fazem mais tarefas domésticas de escritório e trabalho de diversidade do que os homens brancos, as mulheres de grupos minoritários fazem muito mais do que as mulheres brancas. No estudo, identificamos entre as mulheres pertencentes a minorias uma propensão de 39 pontos percentuais a mais do que as mulheres brancas de relatar fazer mais trabalho de diversidade do que seus colegas e 20 pontos percentuais a menos de relatar acesso às melhores atribuições.
Um estudo que realizamos em engenharia descobriu que 26% dos homens brancos, mas 55% das mulheres negras relatam que fazem mais trabalho subvalorizado do que seus colegas com os mesmos níveis de experiência ou tempo de serviço. O mesmo estudo descobriu que 61% dos homens brancos, mas menos da metade das mulheres de grupos minoritários, relatam que eram mais propensos do que seus pares femininos a serem designados para tarefas ou equipes de alto nível.
Isso é muitas vezes chamado de imposto de minoria. Quando pesquisamos 216 mulheres negras que trabalham com computação em empresas de tecnologia, encontramos cargas absurdamente grandes de “trabalho doméstico de escritório”.
As entrevistas de acompanhamento mostraram padrões comuns. Aqui está uma: pedir às únicas mulheres negras da equipe para se tornarem especialistas não remuneradas em diversidade, equidade e inclusão (DEI).
“Atualmente, estou atuando como gerente de produto [mas] também sou gerente de programa de diversidade e inclusão”, disse uma engenheira negra. “Não sou paga pela minha função de diversidade e inclusão, mas é um cargo em tempo integral.” Ela foi informada de que a empresa não poderia remunerá-la por isso porque não tinha o orçamento.
Pedi a uma engenheira de software latina para estimar a porcentagem de seu tempo que os esforços de DEI não remunerados representavam: “Eu diria que pelo menos 25% do meu tempo… e isso não ajuda ninguém a ser promovido”. É realmente voluntariado, disse ela. Ela descreveu passar muito tempo recrutando palestrantes para eventos, observando que “nada disso está relacionado ao meu trabalho”.
Às vezes, espera-se que as mulheres nas startups assumam todos os recursos humanos ou atuem como assistentes de escritório, porque as empresas não têm orçamento alocado para ambos. “Algumas das tarefas menores no escritório (…) estão sempre recaindo sobre meus ombros”, disse outra engenheira de software latina que era a única mulher com cargo de liderança na sua empresa. Ela disse a seus colegas: “Quando temos esses problemas de organização do espaço ou reposição de guardanapos ou não temos um assistente de escritório, lembrem-se que essa não é minha função. Então todo mundo aqui tem que contribuir.” Os outros gerentes concordaram, mas nunca fizeram nada a respeito. Na próxima vez que os suprimentos precisaram ser repostos, ela enviou um e-mail dizendo: “Ok. Pessoal... quando estiverem prontos.”
Isso mostra como é difícil para as mulheres se livrarem do tal imposto de minorias, que já correm o risco de serem rotuladas como “difíceis” por causa de estereótipos raciais e de gênero.
Pode haver um custo financeiro sobre a sobrecarga com o trabalho doméstico no escritório. Embora os colegas esperassem que as mulheres com quem conversamos assumissem esse trabalho não remunerado, ironicamente elas também foram penalizadas por fazê-lo. Isso porque suas avaliações de desempenho foram baseadas apenas no trabalho técnico para o qual foram contratadas. Manter a casa em ordem reduzia a quantidade de tempo que elas poderiam gastar fazendo seu trabalho técnico.
As mulheres de grupos minoritários acabam deixando as empresas de tecnologia – e até mesmo a indústria – porque se sentem sobrecarregadas, subutilizadas e desvalorizadas. O trabalho doméstico do escritório não é o único motivo. Mas é um dos mais fáceis de corrigir.
Permita que as mulheres de grupos minoritários façam o trabalho técnico para o qual foram contratadas. Dê suporte administrativo se elas estiverem recrutando palestrantes para eventos da empresa ou outras atividades relacionadas à diversidade. Contrate um assistente de escritório para reabastecer o estoque de material ou estabeleça um sistema de rotatividade. Não peça a cientistas da computação para brincar de chefe de RH.
E, no mínimo, remunere-as pelo trabalho extra.
Joan C. Williams é uma Distinguished Professor of Law na Hastings College of Law da Universidade da Califórnia e diretora fundadora do Center for WorkLife Law. Ela é a autora de “Classe trabalhadora branca: superando a falta de noção de classe na América”.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e seus proprietários.
– Esta coluna foi traduzida por Marcelle Castro, Localization Specialist da Bloomberg Línea.
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