São Paulo — Sócio da Euro Capital Securitizadora, empresa de Campinas (interior de São Paulo) acusada de enganar clientes com uma oferta irregular de debêntures (títulos de dívida privada), leva uma vida de ostentação exposta nas redes sociais, enquanto as vítimas do golpe ingressaram com 236 processos na Justiça paulista para tentar reaver suas economias. O relato foi feito à Bloomberg Línea pelo advogado Nilton Lima Júnior, contratato por oito clientes que se dizem lesados.
“Dois clientes seguem um dos sócios em rede social e relatam que ele vive no Paraguai, tem empresa no Paraguai, namora a Miss Paraguai e leva uma vida de ostentação. E é isso que deixa eles mais frustrados com o golpe”, diz o advogado.
A Euro Capital Securitizadora é nome fantasia da VebCap Securitizadora de Ativos. Outra empresa, a JNX, dos mesmos sócios da VebCap, também está envolvida no caso. Em março, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) alertou que a VebCap não tinha autorização para realizar oferta de debêntures.
Segundo levantamento realizado por Lima Júnior, já existem 176 processos judiciais contra a Vebcap e 60 contra a JNX. “A partir dos relatos dos clientes, estimo que 30% dos lesados já ingressaram com processo”, diz o advogado.
As denúncias apresentam pontos de convergência. “O procedimento comum é o pedido de mútuo com a oferta de ganhos altíssimos como juros na remuneração desses mútuos. Outro aspecto é que o mútuo era realizado por uma empresa do grupo e o dinheiro captado dirigido para outra empresa. Temos que dividir a situação jurídica em dois aspectos: o civil que é a dívida não paga, o mútuo inadimplente. O outro é o criminal que dependerá da situação probatória ao longo de cada processo. Pelas análises iniciais vemos sim que existem indícios de crime, sendo estelionato e crime contra a ordem financeira. O estelionato pelo fato de ter um ‘engodo’, uma falsa promessa para ter uma vantagem que foi a obtenção do aporte do dinheiro sem utilização na operação”, comentou o advogado.
Segundo ele, todos os processos se encontram na fase inicial, aguardando arresto de bens para garantir a decisão final. Quanto às expectativas em relação ao sucesso dessas ações, Lima Júnior diz que a chance é grande, mas o desafio é recuperar o dinheiro aplicado pelos investidores. “No mérito, quando ao direito, a expectativa é grande, ou seja, quanto ao direito de receber os valores de volta, é muito provável. Mas em relação à efetiva obtenção dos valores dependerá dos bens que serão localizados em nome dos demandados ou de terceiras pessoas”, afirmou.
Interior paulista
Bloomberg Línea consultou a certidão emitida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo sobre a distribuição de processos contra a Vebcap Securitizadora de Ativos. Pelo menos 115 dos 176 processos contra a empresa transmitam na Justiça de Campinas. O restante está em foros de outros 13 municípios (São Paulo, Americana, Andradina, Bertioga, Caraguatatuba, Carapicuíba, Piracicaba, Ribeirão Preto, São Caetano do Sul, São José do Rio Preto, São Roque, Sumaré e Votuporanga).
Já a JNX Cashback Consultoria e Assessoria de Recebíveis LTDA tem pelo menos 55 dos 60 processos em Campinas, e o restante na cidade de São Paulo, Bertioga, Itu e Votuporanga, segundo outra certidão emitida pelo TJ paulista.
“Nos contratos de investimentos, o cliente fechava o contrato com a Vebcap, fazia o aporte de valor e o depósito na conta da JNX. Essa confusão patrimonial entre as empresas não sei se já era utilizado com má-fé. Sabemos também que alguns clientes davam seu carro como parte do investimento. Eles [sócios da Euro Capital Securitizadora] tinham outra empresa, a Royal Motors, que fazia a comercialização de veículos voltados para o segmento premium. Eles já tinham para quem repassar esse veículo. Havia toda uma organização bem arquitetada”, observa o advogado das vítimas.
Sobre os valores investidos pelos clientes da Euro Capital, Lima Júnior diz que há pessoas que perderam entre R$ 10 mil e mais de R$ 200 mil. “Para evitar cair em golpes como esse, é preciso pesquisar antes os processos contra a empresa com que você vai fazer negócio. É preciso ter malícia e não se deixar levar pelo marketing”, recomenda o advogado.
Um gerente de contas, de 29 anos, relatou à Bloomberg Línea ter investido R$ 8.500 com a promessa de receber um total de R$ 11.500 em cinco parcelas mensais. Após assinar o contrato em maio do ano passado, ele disse ter recebido só uma parcela de R$ 2.300 em outubro. Ao procurar a securitizadora, ouviu que a empresa estaa com “problema de fluxo de caixa”. Ele inicialmente buscava financiamento para comprar um carro, e a empresa ofereceu opções como a aplicação em debêntures.
Em uma queixa postada no site Reclame Aqui no dia 27 de janeiro, outro usuário contou que investiu R$ 15 mil e que começaria a receber as parcelas em agosto do ano passado, quando recebeu R$ 150. Depois disso, não houve mais pagamento.
A securitizadora captava clientes usando a força de engajamento de redes sociais. A empresa patrocinava o podcast e canal do delegado youtuber Carlos Alberto da Cunha, o Da Cunha, no Youtube, voltado para policiais e que se tornou um fenômeno das redes sociais com a divulgação de vídeos de operações policiais na capital.
“Além de serem empresários, eles são amigos de vários policiais Tenho meus investimento lá também. Recomendo”, disse o youtuber, em uma transmissão no dia 18 de maio de 2021. Bloomberg Línea tentou ouvir os responsáveis pela Vebcap e pela JNX, mas não obteve resposta no número telefônico e no e-mail disponibilizados em seu site, que acabou saindo do ar após o alerta da CVM sobre a atuação irregular na oferta das falsas debêntures.
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