Bloomberg — Os Estados Unidos ordenaram que todos os funcionários não emergenciais de seu consulado em Xangai deixassem a China, provocando uma repreensão por parte de Pequim e gerando críticas vindas até mesmo de americanos no centro financeiro fechado.
O Departamento de Estado ordenou as partidas na segunda-feira (11), de acordo com um post em seu site, já que a maioria dos 25 milhões de residentes de Xangai ficou impedida de sair de suas casas por pelo menos duas semanas. As tensões se intensificaram com a escassez de alimentos, a incapacidade de acesso a cuidados médicos e até mesmo assassinatos de animais de estimação.
Ainda assim, a medida dos EUA ocorre em um momento em que o governo de Xangai diminuiu algumas restrições e os moradores estão relatando maior acesso a suprimentos, levantando questões sobre o momento do anúncio. As relações entre os EUA e a China pioraram nas últimas semanas, com ambos os lados vendo a guerra da Rússia na Ucrânia como parte de uma disputa geopolítica maior entre as maiores economias do mundo.
A pandemia tem sido particularmente sensível para ambos os lados. O ex-presidente Donald Trump difamou a China em 2020 por espalhar o vírus pelo mundo, levando Pequim a divulgar a desinformação sobre a origem do vírus e alardear sua abordagem Covid Zero como superior à dos EUA em salvar vidas.
“Muitos americanos em Xangai ficaram consternados ao saber das saídas de funcionários do consulado, dada a situação atual”, disse Josef Gregory Mahoney, professor de política e relações internacionais da East China Normal University, em Xangai, referindo-se a um anúncio anterior de que os funcionários poderiam sair do país.
“Esta nova ordem certamente aumentará a impressão de que a situação está piorando apesar das indicações contrárias, ou que isso é uma postura política em nome dos EUA, ou que os funcionários do consulado – que já são bastante privilegiados – não conseguem tolerar o inconvenientes que outros são obrigados a suportar”.
Xangai está lutando para interromper a transmissão do pior surto de Covid na China em dois anos, com medidas de controle pesando na segunda maior economia do mundo e começando a interromper as cadeias de suprimentos globais. Havia 23.342 casos na cidade na segunda-feira (11), uma queda em relação ao recorde de domingo (10), mas ainda acima dos cerca de 5.000 há apenas duas semanas.
Pequim viu a decisão dos EUA como política, com o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Zhao Lijian, acusando o governo Biden de “atacar e difamar” a China. Ele disse que os canais de comunicação entre os países estão desimpedidos e a China está fornecendo “assistência e conveniência” ao corpo diplomático estrangeiro de acordo com as convenções internacionais.
“A China está fortemente insatisfeita e se opõe firmemente a uma atitude por parte dos EUA de politizar e instrumentalizar a evacuação”, disse Zhao. “Os EUA deve parar imediatamente de atacar as políticas de prevenção de epidemias da China e fazer manobras políticas sob o pretexto da epidemia”.
A última ordem dos EUA veio dias depois que Washington disse que todos os funcionários não emergenciais e seus familiares do consulado em Xangai foram autorizados a sair do país e pediu aos americanos que reconsiderassem as viagens à China devido ao que chama de “aplicação arbitrária” das restrições relativas ao vírus.
“Nossa mudança de postura reflete nossa avaliação de que é melhor que nossos funcionários e suas famílias sejam reduzidos em número e que nossas operações também se restrinjam, à medida que lidamos com as mudanças nas circunstâncias”, disse um porta-voz da Embaixada dos EUA em comunicado na terça-feira (12), observando que os funcionários e seus parentes partiriam em voos comerciais.
“Os Estados Unidos não têm prioridade maior do que a segurança dos cidadãos dos EUA no exterior, incluindo o pessoal da Missão China e suas famílias”, acrescentou o porta-voz.
O embaixador dos EUA na China, Nicholas Burns, e outras autoridades conversaram com seus pares chineses quanto a preocupações sobre a segurança e o bem-estar dos cidadãos americanos no país, disse o porta-voz, e informou Pequim sobre a ordem de partida que será revisada cada 30 dias.
Preocupações com o acesso a alimentos e cuidados médicos foram os principais impulsionadores da decisão, de acordo com um ex-funcionário dos EUA familiarizado com a situação. Também havia a preocupação de que a situação pudesse piorar se outras cidades da região entrassem em lockdown, dificultando a saída das pessoas da China no futuro.
O funcionário acrescentou que a decisão não afetará o relacionamento bilateral, mesmo que o governo chinês possa não estar satisfeito com a medida.
Frank Tsai, professor da Emlyon Business School no campus de Xangai e fundador da empresa de consultoria China Crossroads, disse estar preocupado que a ação dos EUA seja considerada puramente política pela China. A comunidade empresarial dos EUA adotaria uma abordagem pragmática, mesmo que o lockdown signifique um problema para os americanos no país, acrescentou.
“Embora a ação dos EUA também reflita preocupações reais de segurança para os funcionários em relação à covid, também é implicitamente crítica ao governo chinês”, disse Tsai.
– Com colaboração de Jon Herskovitz, Charlie Zhu, Philip Glamann e Jenni Marsh.
– Esta notícia foi traduzida por Marcelle Castro, Localization Specialist da Bloomberg Línea.
Veja mais em bloomberg.com
Leia também
- Covid não será erradicada e ‘cada um deve avaliar seu risco’, diz Fauci
- China retoma aprovação de videogames e alivia temor da comunidade gamer
© 2022 Bloomberg L.P.