EUA precisam de uma reserva estratégica para energia verde

Criar uma economia mais verde exigirá trilhões de dólares em investimentos e é do interresse dos EUA mitigar desconfortos gerados por grandes eventos

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Bloomberg Opinion — A Reserva Estratégica de Petróleo dos Estados Unidos foi criada para proteger o país de interrupções no fornecimento de uma commodity essencial para sua economia. À medida que o mundo se move em direção a fontes de energia mais verdes, não faria sentido ter um plano semelhante para commodities vitais para uma transição suave?

Criar uma economia mais verde exigirá trilhões de dólares em investimentos, e o governo dos EUA tem interesse em estabelecer políticas que mitiguem os desconfortos gerados por grandes eventos ou transtornos ao longo do processo. O uso da Reserva Estratégica de Petróleo - SPR na sigla em inglês - pelo governo Biden para acalmar um mercado de petróleo agitado pela guerra na Ucrânia representa um plano que pode ser aplicado a outros materiais industriais necessários para veículos elétricos, baterias ou painéis solares – e a tecnologia que os acompanha.

Usar sinais de preços para gerenciar estoques controlados pelo governo de metais cruciais como cobre e níquel é uma maneira do setor público trabalhar com o setor privado para evitar problemas de fornecimento e garantir que o país cumpra suas metas climáticas.

O plano começa com a revisão dos objetivos da política de SPR do governo e como ela deve funcionar. Por causa da guerra na Ucrânia, há incerteza sobre a oferta global de petróleo, ou pelo menos, o acesso a essa oferta. Isso levou a um aumento nos preços, o que pesa para os consumidores e grande parte da economia, que já está sofrendo com a inflação acelerada.

Assim, o objetivo é reduzir os preços, o que, segundo o presidente Biden, significa aumentar a oferta. Como o governo tem um estoque de petróleo, está em condições de fornecer esse suprimento imediatamente. Mas, como há um limite, eventualmente as reservas do governo acabariam, a menos que também houvesse uma resposta do setor privado. Ao afirmar que os recursos da venda do petróleo da SPR serão usados para reabastecê-la ao longo do tempo, os produtores têm a garantia de que a demanda futura será garantida, incentivando-os a investir na produção que pode levar tempo para entrar em operação.

Os mercados de petróleo responderam de acordo com as expectativas de quem estruturou a política. O contrato de petróleo bruto West Texas Intermediate para o prazo mais próximo, o front month, caiu mais de US$ 7 o barril na quinta-feira (31), com os traders precificando a oferta adicional de curto prazo, o que deve proporcionar algum alívio aos consumidores no curto prazo. O contrato de 12 meses – abril de 2023 – caiu pouco mais de US$ 1 por barril, já que é improvável que a oferta adicional de SPR esteja nesse nível daqui a um ano – além do governo poder estar no modo de compra até lá. O sinal de preço ainda está lá para as empresas petrolíferas decidirem se devem aumentar a produção em 2023.

Se isso funciona para o petróleo, por que não aplicá-lo a outras commodities industriais importantes? A economia verde do futuro promete ser uma economia com muito menos consumo de petróleo, gás natural e carvão, mas desenvolvê-la exigirá toda uma série de commodities como cobre, níquel e alumínio fornecidas por países de todo o mundo, que são vulneráveis a potenciais interrupções de fornecimento. E embora os preços crescentes do níquel possam não causar o mesmo choque para consumidores e eleitores como a gasolina a mais de R$7 por litro (ou US$ 4 por galão nos EUA), isso aumenta o custo e prolonga o processo de transição para fontes de energia mais verdes.

Pior ainda seria ter uma quebra de commodities ao longo do caminho. Um declínio significativo nos preços pode levar as empresas a reduzir a produção para sobreviverem ou manter a lucratividade. Mesmo após uma recuperação, levaria tempo para que a produção voltasse a funcionar – exatamente o tipo de dinâmica que a indústria do petróleo está experimentando hoje.

O programa mais próximo como este que existe hoje é o National Defense Stockpile, sob coordenação do Departamento de Defesa. Mas foi projetado principalmente com os militares em mente e não se destinava a proteger a indústria contra choques de oferta. O valor total de suas participações hoje é inferior a US$ 1 bilhão, lamentavelmente inadequado para a tarefa em questão.

Agora que o governo mostrou que está disposto a ser ágil no uso da SPR para suavizar a volatilidade dos preços e garantir suprimento suficiente para a economia, ele pode fazer o mesmo em outros mercados de commodities vistos como fundamentais para a economia verde.

Poderia anunciar que, quando os preços caírem abaixo de um certo nível, o governo construirá estoques. Mesmo que haja uma recessão em 2024, vamos precisar de cobre e níquel eventualmente, então não faria mal ter um suprimento seguro disponível. Isso também reforçaria os preços e ajudaria a manter a produção durante um período transitório difícil na economia.

Então, se houvesse uma interrupção no fornecimento ou qualquer outra coisa que fizesse os preços dispararem, o governo poderia liberar suprimentos de sua reserva para ajudar a estabilizar o mercado.

As reservas estratégicas desempenham um papel ainda mais essencial em um mundo onde o futuro do consumo e da produção de petróleo é obscuro e onde muitos outros tipos de commodities serão fundamentais para construir e manter a nova economia.

Conor Sen é colunista da Bloomberg Opinion e fundador da Peachtree Creek Investments. Ele já contribuiu para a The Atlantic e para o Business Insider e reside em Atlanta.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

– Esta coluna foi traduzida por Marcelle Castro, localization specialist da Bloomberg Línea.

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