Xangai: Residentes em lockdown não conseguem comprar alimentos

Aplicativos e entregadores atingiram capacidade máxima; rede de voluntários será criada para suprir necessidade

Governo tem dado preferência para funcionários de supermercados que fazem entregas para que estes possam voltar ao trabalho mais rapidamente
Por Bloomberg News
24 de Março, 2022 | 07:52 PM

Bloomberg — Um crescente surto de covid-19 em Xangai gerou lockdowns em edifícios de apartamentos para testes, deixando alguns moradores frustrados e com dificuldades para garantir alimentos frescos por quase uma semana.

A testagem em massa é realizada em um momento em que os casos na cidade de cerca de 25 milhões de habitantes batem um recorde e fazem parte de uma onda mais ampla que está colocando em xeque a abordagem de tolerância zero da China ao vírus, e no resto do mundo, governos suspendem medidas restritivas. As pessoas estão sendo orientadas a ficar em casa para fazer o teste, aumentando a demanda por entregas e também levando à falta de motoristas.

Continuo sendo informada de que todos os motoristas estão ocupados, mesmo usando um despertador para acordar às cinco da manhã para fazer meu pedido”, disse Chen Mei, uma aposentada de 60 anos que mora no distrito de Pudong. A situação a lembrou de sua infância, quando ela ficava em longas filas com sua mãe para comprar carne enquanto a China enfrentava escassez, disse.

O ocorrido estimulou algumas soluções criativas: a corretora Tianfeng Securities se ofereceu brevemente para entregar vegetais a clientes em algumas partes de Xangai, embora rapidamente tenha suspendido a prática depois que usuários a criticaram nas redes sociais alegando que era uma campanha de marketing. A corretora não quis comentar à Bloomberg.

PUBLICIDADE

Analistas da corretora Guotai Junan compilaram um guia de todos os aplicativos que vendem vegetais, embora estes estejam sobrecarregados. A Hema e a Dingdong Maicai, do Alibaba Group (BABA), estão alertando os clientes sobre atrasos devido à capacidade de entrega limitada, que é preenchida rapidamente.

A escassez mostra os desafios que as autoridades enfrentam na implementação dos objetivos do presidente Xi Jinping de continuar visando a eliminação do vírus ao mesmo tempo em que minimiza os impactos econômicos e sociais da estratégia Covid Zero. Enquanto o país ainda está tomando medidas como lockdowns rigorosos em algumas áreas – por exemplo, toda a província de Jilin, no nordeste da China, está confinada – a disseminação da cepa ômicron em seus centros economicamente mais significativos levou a uma mudança rumo a abordagens mais direcionadas.

As autoridades de Xangai descartaram um amplo lockdown, embora algumas partes da cidade estejam isoladas e testadas. O hub financeiro planeja usar estádios e centros de exposições para a quarentena de casos leves ou assintomáticos de covid – instalações nos distritos de Jiading e Minhang já foram reformadas para esse fim. O Pudong Shangri-La, hotel de luxo localizado no coração do distrito financeiro da cidade, começou a ser usado como hotel de quarentena esta semana, segundo funcionários.

Alguns moradores correram para acumular suprimentos devido às incertezas sobre o fim do lockdown e à falta de confiabilidade dos aplicativos de entrega. A polícia de Xangai deteve dois homens na quarta-feira (23) por suspeita de espalhar rumores de que toda a cidade estava entrando em um lockdown total.

Chen, que vive em uma das áreas com maior número de infecções e lar de diversas instituições financeiras nacionais e estrangeiras, além da Bolsa de Valores de Xangai, está trancada em seu apartamento com seu filho e dois netos desde sexta-feira (18).

Ela estocou comida por três dias depois de receber a informação de que o lockdown duraria apenas dois dias, mas entrou em pânico quando o período foi prorrogado estendido duas vezes e teve dificuldades para fazer pedidos por aplicativos de supermercado on-line. Como não conseguia receber entregas, uma amiga que mora em outro bloco acabou trazendo suas compras.

Os moradores de Jilin, que ainda registra o maior número de casos na onda atual da China, fazem reclamações semelhantes nas redes sociais sobre receber pouco apoio dos governos locais para obter comida e assistência médica. A província que faz fronteira com a Rússia registrou mais de 2 mil infecções diárias, porém atualmente seus cerca de 24 milhões de habitantes marcam mais de uma semana de confinamento.

PUBLICIDADE

Acumuladores

As autoridades locais de Xangai pediram aos moradores que não acumulem alimentos e outros produtos básicos e disseram que estão se esforçando para garantir suprimentos suficientes. O governo de Pudong organizou serviços de compras coletivas para os moradores pedirem vegetais a partir desta semana. O distrito de Minhang disse na quinta-feira (24) que organizará um grupo de voluntários para ajudar a entregar alimentos e priorizará o teste de funcionários de negócios de supermercados on-line para que voltem ao trabalho mais rapidamente.

Xangai registrou 983 novas infecções por Covid na quarta-feira – os casos diários quase dobraram desde o fim de semana. O aumento foi registrado depois que as autoridades expandiram a testagem de forma a rastrear as cadeias de transmissão.

O acesso aos serviços de saúde é outra causa da frustração, pois alguns centros se recusam a deixar as pessoas saírem e os hospitais focam em priorizar pacientes positivos para covid ou fechar seus serviços ambulatoriais.

O médico de emergência Hao Xichun disse em uma publicação na rede Weibo na semana passada que Xangai tem os melhores recursos médicos do país, atraindo pacientes de todo o país. No entanto, algumas pessoas arriscam a viagem e então descobrem que não são aceitas pelos hospitais; outras enfrentam vários dias de quarentena quando retornam às suas cidades natais, disse.

“Precisamos ajustar as práticas porque a pressão agora não é mais apenas para oferecer tratamento, mas também para evitar quaisquer tragédias desencadeadas pelas rígidas medidas anti-covid”, disse ele na publicação.

--Com a colaboração de Amanda Wang e Chunying Zhang.

--Este texto foi traduzido por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também