São Paulo — A queda do dólar (USD-BRL) comercial neste ano, que testou hoje o patamar abaixo dos R$ 4,90, provoca uma corrida por papel moeda nos maiores bancos privados do Brasil no último mês. A cotação do chamado “dólar turismo” ainda está acima da casa dos R$ 5,00. A transação do câmbio turismo tem de considerar o custo da incidência do IOF (imposto sobre operações financeiras) de 1,1%.
Itaú Unibanco (ITUB4) e Bradesco (BBDC4) forneceram dados à Bloomberg Línea sobre as vendas da moeda norte-americana e do euro para seus clientes. Em fevereiro, o montante em espécie comercializado pelo Bradesco foi 500% maior que o mesmo período de 2021. Em relação à dezembro, o crescimento foi de 145%.
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Já o Itaú informou que bateu recorde de venda de dólar e euro em espécie para clientes em fevereiro. O montante transacionado cresceu 108% e foi mais que o dobro do registrado em dezembro, recorde anterior. Na comparação com fevereiro de 2021, o aumento é foi quase 13 vezes maior.
Em nota enviada à Bloomberg Línea, o Itaú Unibanco diz que as oscilações do câmbio em fevereiro – e a retomada das viagens ao exterior – levaram a uma alta na procura por dólar e euro em espécie, com as compras das duas moedas por clientes Itaú Unibanco alcançando o maior patamar desde o início da pandemia.
Segundo o Itaú, o euro segue caminho semelhante do dólar: as vendas da moeda em espécie foram 105% maiores em fevereiro na comparação com dezembro, e quase 22 vezes maiores que o mesmo mês do ano passado. Em fevereiro deste ano, o dólar em espécie representou cerca 65% do total comprado no Itaú; os outros 35% correspondem às vendas de euro (o banco comercializa as duas moedas em espécie, que representam cerca de 95% do mercado de moeda estrangeira).
Os clientes do Itaú podem realizar a compra de moeda estrangeira via app, com fechamento da taxa de câmbio no momento da transação, e efetuar a retirada de dólar e euro em espécie em caixas eletrônicos exclusivos do Banco24Horas Moeda Estrangeira, disponíveis atualmente em pontos autorizados da cidade de São Paulo. O processo também pode ser realizado na rede de agências Itaú habilitadas.
Já o Bradesco lançou recentemente a compra de moeda em espécie pelo app com retirada em 150 ATM’s espalhados em locais estratégicos ou através de 630 agências credenciadas em todo o país, inclusive para retirada em aeroportos como o de Guarulhos, na Grande São Paulo.
É preciso monitorar as cotações do dólar turismo antes de fechar o negócio. O noticiário econômico e atualmente o geopolítico também vai ditando o movimento dos preços, fazendo com que ao longo do dia, os valores mudem de acordo com as cotações do dólar comercial e com o tamanho da demanda. Vale também comparar com as cotações dos bancos tradicionais com as das fintechs, que têm a desvantagem de não contar com uma rede de agências físicas, onde a retirada das verdinhas pode ser mais ágil, sem a incidência de taxas de entrega domiciliar.
No app do Bradesco, o dólar turismo era vendido nesta tarde a R$ 5,1091 e o euro a R$ 5,6237. Na Câmbio Online, da corretora Frente, o dólar em papel moeda tinha cotação de R$ 5,0081 nesta tarde. Com o custo do IOF, o VET (valor efetivo total) chegava a R$ 5,0632. Já o euro era comercializado a R$ 5,50. Na Remessa Online, o dólar turismo estava cotado a R$ 5,188, enquanto o euro era vendido a R$ 5,32.
Vai cair mais?
Ontem, o dólar comercial fechou em R$ 4,915, menor valor dos últimos nove meses, segundo o Grupo Travelex, dono da corretora Travelex Confidence. Em nota, a instituição diz que a baixa acumulada da moeda americana ocorre em razão da valorização das commodities brasileiras em meio ao conflito no leste europeu e que, juntamente com a taxa elevada de juros, têm atraído investimentos estrangeiros em ações de empresas brasileiras exportadoras de matérias-primas e em renda fixa.
Para Marcos Weigt, head da tesouraria do Travelex, a valorização do real frente ao dólar não deve perdurar. “Daqui em diante, o dólar tem menos para cair do que para subir. A partir de abril, as eleições devem entrar de vez no radar dos investidores e obviamente impactar esse cenário. Hoje, analiso que seja um momento propício para empresas e investidores fazerem hedge”, diz o especialista.
Já Mariana Gonzalez, especialista em mercado financeiro do ISAE Escola de Negócios, uma combinação de fatores locais e externos trouxe um forte fluxo de capital estrangeiro que contribuiu para o ganho de força do real, entre eles a alta da taxa de juros básica.
“Em termos de juros, sempre fomos um país atraente do ponto de vista do investidor estrangeiro, com uma das mais altas taxas do mundo comparado aos pares emergentes. Agora, com a Selic a 11,75% e com possibilidade de ultrapassar 13% ainda neste ano, mais ainda”, comentou Gonzalez.
Fim do IOF
A nova medida adotada pela atual gestão do governo federal para tentar o ingresso no grupo dos 38 países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) deverá favorecer o turismo de brasileiros no exterior ao simplificar e baratear os custos das transações financeiras internacionais. O Planalto decidiu zerar o IOF em negociações com moeda estrangeira, uma das exigências para ser aceito no colegiado que reúne representantes das nações mais industrializadas do planeta.
“O prazo para que isso ocorra ainda é longo, porém, precisamos olhar com bons olhos um movimento de redução de impostos. Essa decisão irá, neste longo prazo, facilitar as operações de trocas de moedas e transações internacionais da população, facilitando o acesso e consequentemente impulsionando o turismo internacional”, comenta Anderson Souza Brito, especialista em câmbio, finanças e banking e CEO da Revhram, especializada em intermediação de operações cambiais e trade finance.
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Desde 2007 onde o IOF foi regulamentado por meio do Decreto nº 6306, de 14/12/2007, ocorreram alterações em percentuais de diversos serviços, mas nenhuma alteração trouxe uma previsão de impacto em alíquotas como se pretende o governo realizar neste momento. “Então, o que estamos acompanhando agora é uma expansão desse movimento em relação a redução do IOF, devido aos diálogos do governo com o setor produtivo, atendendo a algumas demandas para tentar favorecer o ambiente de comércio exterior”, acrescentou a nota do especialista.
O sistema vigente provoca o que o Fundo Monetário Internacional (FMI) chama de “câmbios múltiplos”, contexto em que uma determinada operação financeira é favorecida em detrimento de outra. A prática é condenada pela OCDE e pelo próprio FMI. No final do ano passado, o Congresso Nacional aprovou a nova Lei Cambial (14.286/2021), acelerando a adesão do País aos novos protocolos, propondo a eliminação do IOF cambial. A estimativa é que o governo deixe de arrecadar cerca de R$ 6,5 bilhões com a decisão.
Faixas de redução
A medida ocorrerá de forma gradual com quatro faixas de redução do IOF:
Primeira faixa – a redução do imposto inicia ainda em 2022, prevista para operações de ingresso e saída de recursos estrangeiros de curto prazo, ou seja, de até 180 dias
Segunda faixa – avançará sobre transações com cartões de crédito ou débito, os cheques de viagem e os cartões pré-pagos internacionais, cuja alíquota atual é de 6,38%. Início em 2023, com redução de um ponto percentual ao ano, até zerar em 2029
Terceira faixa – redução da taxa de 1,10% sobre as operações de câmbio para aquisição de moeda estrangeira à vista no Brasil e para transferência de recursos de residentes no país para disponibilidade no exterior. Acontece de uma só vez em 2028
Quarta faixa – a última etapa, enfim, alcançará as outras operações de câmbio
Turismo
O gasto dos brasileiros com as viagens a outros países chegou ao nível mais baixo, após quase 16 anos, segundo dados do Banco Central. Em 2021, as despesas com viagens para outros países somaram US$ 5,25 bilhões. O valor é 2,66% menor que o registrado em 2020, quando foram gastos US$ 5,394 bilhões. Esse total está distante do que fora registrado antes da pandemia (US$ 17,593), em 2019. É o menor volume desde 2005, ano em que o montante atingiu US$ 4,720 bilhões.
“Devido especialmente à pandemia e à crise econômica atual, com o dólar elevado, os brasileiros reduziram as viagens e os gastos no exterior, e a medida significa uma economia de um ponto percentual ao ano no bolso do turista até “, diz Anderson.
O especialista avaliou ainda que “essa adaptação ao marco cambial dá mais liberdade para quem está negociando moedas e deixa esse mercado menos inacessível, mesmo em alguns cenários econômicos não tão favoráveis”.
Vantagens da conta internacional
Para facilitar o dia a dia de brasileiros que viajam para o exterior, ou mesmo para quem costuma fazer transações em moedas estrangeiras com frequência, a abertura de uma conta corrente internacional é uma boa alternativa, segundo especialistas. Com a expansão dos bancos digitais no mercado, as facilidades e ofertas oferecidas por este de tipo serviço têm atraído e conquistado novos clientes.
Entre as vantagens da conta corrente internacional está a conversão instantânea , baseada na cotação do dólar americano comercial, que é mais barato que o dólar turismo, dispensando a compra do papel moeda e também do cartão de crédito internacional, que no Brasil tem incidência de 6,38% de IOF nas transações de uso no exterior.
A conta global internacional é uma modalidade financeira onde brasileiros residentes e domiciliados no país conseguem, por meio de uma instituição bancária, ter uma conta corrente com saldo em moeda estrangeira, sem precisar morar ou comparecer em um banco fora do país. Geralmente a abertura se dá por meio de aplicativo. C6 Bank, BS2, Avenue, Wise e Nomad Global são algumas instituições que oferecem esse tipo de produto. Nos EUA, bancos como Wells Fargo e Bank Of America aceitam que não residentes no país abram conta corrente nestas instituições.
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