Novas exigências do BC afetam apenas fintechs grandes, dizem analistas

Nova regulamentação do Banco Central endureceu regras prudenciais para instituições de pagamento como o Nubank

O Banco Central agora eleva a barra para que as grandes fintechs não gerem um risco sistêmico ao sistema financeiro
16 de Março, 2022 | 02:26 PM

Bloomberg Línea — Na última sexta-feira, o Banco Central brasileiro ajustou a assimetria regulatória para as fintechs, endurecendo os requerimentos de capital para instituições de pagamento que queiram oferecer crédito.

Depois das mudanças regulatórias de 2013 para colocar concorrência no concentrado mercado financeiro brasileiro, o Banco Central agora eleva a barra para que as grandes fintechs não gerem um risco sistêmico ao sistema financeiro. O Nubank (NU), por exemplo, não tem a mesma licença de um banco. A empresa é licenciada pelo Banco Central como uma instituição de pagamento.

Com a nova mudança, as instituições financeiras lideradas por instituições de pagamento que têm cartão de crédito terão que começar a ter requisitos de capital. Ou seja, sempre que essas empresas cederem um real em crédito, elas devem ter uma porcentagem proporcional em capital, o que é uma equiparação aos requisitos de capital para os bancos grandes.

O que diz a nova regra do Banco Central

A nova resolução traz um aumento gradual do requerimento de capital para instituições de pagamento, o que, na prática, só impacta o modelo de negócio das grandes fintechs, como o Nubank, PagSeguro (PAGS), PicPay e Mercado Pago, por exemplo.

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As novas regras começam a valer em janeiro de 2023 e estarão completamente em vigor a partir de janeiro de 2025. A norma classifica as fintechs em três grupos, em que cada um tem um requisito de capital distinto.

Faz parte do grupo tipo 1 o conglomerado liderado por instituição financeira, com segmentação prudencial já em vigor. No tipo 2 faz parte o conglomerado liderado por empresas com licença de instituição de pagamento e não consolidado por instituição financeira ou outra entidade licenciada pelo Banco Central.

Já a que mais interessa o mercado é o tipo 3, o conglomerado liderado por instituição de pagamento e consolidado por instituição financeira ou outra entidade licenciada pelo Banco Central. É onde figura o Nubank, por exemplo.

A regulação prudencial dita como ponderar o risco e que tipo de exigências de capital a fintech deve ter dentro do seu balanço para se precaver de um risco na carteira de crédito.

“O que o BC propõe é que de alguma forma essas instituições de pagamento, tal qual o Nubank, tenham as mesmas exigências do produto do cartão de crédito que um banco normal tem”, explica o diretor sênior da consultoria alemã Roland Berger, João Bragança.

A proposta do Banco Central é que sempre que existir uma carteira de crédito originada por um cartão de crédito, essas fintechs tenham que fazer os cálculos da mesma forma que um banco tradicional faz. A exigência de capital será progressiva sobre o valor total do banco de ativos ponderados pelo risco: 6,75% em 2023, 7,5% em 2024, e 8% a partir de 2025.

O que dizem os analistas

Os analistas do Credit Suisse, Bruna Amorim, Marcelo Telles e Daniel Vaz, disseram em relatório que a assimetria regulatória entre bancos e instituições de pagamento já era um tópico de debate no Brasil, já que as fintechs ganharam maior relevância e escala.

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Quando fez o IPO (oferta pública inicial) em 2021, o Nubank chegou a valer mais do que o Itaú, tornando-se a instituição financeira mais valiosa da América Latina. Os analistas do Credit Suisse consideram que as novas regras cumprem o papel de salvaguardar o risco sistêmico, ao mesmo tempo que deixam as portas abertas para a competição por conta do princípio de proporcionalidade, com uma implementação faseada da nova regulamentação.

Bragança complementa que os impactos da nova norma não são muito diferentes daquilo que já se esperava. “Temos um faseamento da regulação anterior para a nova regulação até janeiro de 2025, o que facilita o gerenciamento dos impactos que essa nova regulação pode ter e de alguma forma facilita o planejamento do negócio”, disse.

Sobre o impacto da norma nas instituições do tipo 3, ou seja, instituições financeiras lideradas por uma instituição de pagamento, Berger disse que a regulação está muito centrada na questão do cartão de crédito. “O que o Banco Central (BC) está fazendo é adequar a regulação àquilo que é a transformação do próprio mercado”, disse.

Quando o BC, de forma propositada, ao longo da última década, criou uma regulação direcionada para modelos de negócio inovadores migrando para uma postura pró-concorrência, fintechs como o Mercado Pago, PagSeguro, Picpay, foram beneficiadas. Agora, o que o BC faz, é como se fosse um “passo atrás”, segundo Berger, já que esses modelos de negócio inovadores cresceram e colocaram pressão sobre os concorrentes grandes, que era o objetivo inicial.

“Agora foi preciso fazer uma readequação com todos esses requisitos de capital e essa equiparação da regulação de uma instituição bancária. Ainda assim existe graduação no que está sendo criado pelo BC. Aquilo que mudou na sexta-feira está muito centrado nas fintechs que têm risco sistêmico. Não temos um grande impacto em uma pequena fintech que pode surgir amanhã”.

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Isabela  Fleischmann

Jornalista brasileira especializada na cobertura de tecnologia, inovação e startups