E se ninguém fosse dono do Chelsea FC?

Alguns clubes amadores já optam por se tornar um veículo corporativo que não pertence a ninguém

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Bloomberg Opinion — O Chelsea Football Club está tendo que funcionar sem seu rico acionista depois que o proprietário Roman Abramovich foi sancionado por suas ligações com o presidente Vladimir Putin, após a invasão da Ucrânia pela Rússia. Os compradores estão fazendo fila na expectativa de que o governo do Reino Unido permita a venda da equipe do oeste de Londres. A situação traz à tona questões sobre a propriedade dos clubes de futebol. Eles devem ter um dono rico - ou mesmo ser de propriedade de qualquer pessoa?

Os diretores do Chelsea FC, clube controlado por Abramovich e dono do time, estão sendo forçados a administrar o clube como se não tivesse acionista. O time pode continuar suas atividades esportivas, mas Abramovich não pode mais se beneficiar financeiramente. Existem restrições impostas pelo governo às atividades que geram receita e sobre os gastos. O foco necessariamente muda para as outras partes interessadas e credores, incluindo torcedores com ingressos para a temporada, jogadores, funcionários e fornecedores. Em particular, deve haver uma avaliação diária sobre a possibilidade do Chelsea evitar a entrada de uma nova administração.

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A massa salarial mensal, supostamente de 28 milhões de libras (37 milhões de dólares), aumentará em julho, à medida que os jogadores retornarem de empréstimos a outros clubes. Embora uma venda possa ser uma maneira conveniente de suspender as atuais restrições pelas quais o clube tem passado, a empresa sem acionistas é de fato um bom modelo para o futebol – e um modelo que pode servir de inspiração para o esporte.

Alguns clubes amadores, assim como instituições de caridade e organizações sem fins lucrativos, já optam por se tornar o que se conhece como empresas limitadas por garantia, um veículo corporativo que não pertence a ninguém. A governança assume a forma de um conselho regular, nomeado pelos “membros”. Nos esportes, eles normalmente seriam torcedores: o modelo é efetivamente uma forma de propriedade dos torcedores, mas sem que os torcedores coloquem muito dinheiro.

A vantagem dessa estrutura é que o investimento é financiado apenas por dívidas ou lucros acumulados, e não por capital próprio. As equipes devem viver dentro de suas possibilidades. Tudo bem, desde que todos os clubes operem sob as mesmas restrições e a governança seja forte o suficiente para evitar que os empréstimos fiquem fora de controle. Mas enquanto um punhado de rivais adotar um modelo de acionista, o campo de atuação financeiro fica desigual. Ser um clube sem dono funciona apenas se todos tiverem a mesma estrutura, ou se houver restrições aos rivais de propriedade dos acionistas, seja na forma de regulamentação ou pressão do mercado de ações.

As regras de fair play financeiro introduzidas há mais de uma década limitaram a capacidade de proprietários ricos de comprar seu caminho para o sucesso esportivo, que foi o que Abramovich fez com o Chelsea. Dito isso, continua sendo possível que os clubes não sejam lucrativos, e há claramente espaço para que a estrutura se torne mais difícil. Uma revisão liderada por torcedores do futebol inglês pediu, em novembro, o estabelecimento de um regulador independente, com a função de garantir a sustentabilidade financeira, para que os clubes de futebol não fossem “brinquedos dos proprietários”. Também defendeu restrições aos subsídios dos proprietários se tais injeções desestabilizassem a liga como um todo. Estas propostas fazem sentido e devem agora receber um novo impulso.

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Para alguns pretendentes, como empresas de private equity com foco em um retorno financeiro sólido, a perspectiva de futuras restrições mais duras aos gastos com jogadores pode ser atraente. Se o futebol em geral é forçado a se tornar mais disciplinado, um investimento no Chelsea se torna menos arriscado. A abortada Superliga Europeia, com sua tentativa de criar uma competição fechada onde os piores desempenhos não fossem rebaixados, foi essencialmente uma iniciativa para remover o incentivo para os clubes gastarem mais do que os outros.

Talvez descartar acionistas seja um modelo muito idealista para o esporte. Mas pelo menos não vamos ter donos que usam o dinheiro para se safar ou ganhar notoriedade.

Chris Hughes é um colunista da Bloomberg Opinion que escreve sobre negócios. Ele trabalhou anteriormente para a Reuters Breakingviews, bem como para o Financial Times e o jornal Independent.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

– Esta coluna foi traduzida por Marcelle Castro, localization specialist da Bloomberg Línea.

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