São Paulo — Em conversa com analistas de bancos, o CEO do Magazine Luiza (MGLU3), Frederico Trajano, tentou nesta terça-feira (15) tranquilizar o mercado após a rede varejista reportar um prejuízo de R$ 79 milhões no quarto trimestre de 2021. Ele admitiu que a companhia foi surpreendida pelo tamanho do impacto negativo da alta dos juros e da inflação no poder de compra dos consumidores, mas sinalizou a confiança de que o desempenho do varejo no segundo semestre deverá ser melhor, apesar da continuidade das incertezas econômicas e geopolíticas.
Em fevereiro, a Magalu iniciou um período de ajustes de “capacity”, adaptando sua estrutura aos tempos de vacas magras do aperto monetário que castiga as vendas de bens duráveis como eletrodomésticos em lojas físicas, o que exigiu da companhia reprecificar as tarifas (comissões) cobradas dos seus parceiros e evitar frete grátis, com adoção de tarifa adicional de R$ 3. “Estamos jogando menos para a torcida”, afirmou ele, em referência aos esforços da companhia para proteger suas margens de lucro diante de um ambiente de maior competição do setor, com o crédito mais caro, maiores custos, além da entrada de players chineses mais agressivos no e-commerce brasileiro.
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No quarto trimestre, a economia brasileira saiu da recessão técnica (duas quedas trimestrais seguidas do PIB), mas a onda da variante ômicron e as pressões inflacionárias com a alta os custos com insumos, logística e energia (combustíveis e eletricidade), combinada às incertezas com os juros nos EUA, elevaram a volatilidade dos mercados e frearam o otimismo com o ritmo de recuperação da economia mundial após dois anos de pandemia da covid.
“A gente não estava esperando o que aconteceu no quarto trimestre, aquela desaceleração da economia. Mas as margens vão melhorar gradualmente neste primeiro semestre. A partir de março, começamos a ver uma melhora após ajustes para rentabilizar a operação”, disse o executivo, durante a teleconferência sobre o resultado financeiro.
Em fevereiro, o volume de vendas do marketplace, motor de crescimento da varejista, superou o das lojas físicas, uma performance obtida em cinco anos, destacou o CEO, citando que hoje a companhia tem 160 mil sellers, além de 1.481 lojas físicas em 3.600 municípios. “Triplicamos a venda de e-commerce desde 2019. O marketplace já é o principal canal de entrada de clientes novos”.
Logística
Trajano afirmou que as lojas seguem resilientes, superando o desempenho das vendas do período pré-pandemia. A estratégia da companhia é transformar as unidades físicas em pontos de apoio logístico e de captação de clientes para seus serviços financeiros. Com o aumento de custos com a alta dos combustíveis, que encarece o frente, o Magalu tenta reduzir ao máximo a distância percorrida entre seus entregadores e a residência do cliente, apostando em “entregas ultrarápidas”.
“Buscamos maiores ganhos de produtividade, otimização logística de rotas, redução da conta do frete sobre a receita”, destacou o CEO.
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Ele descartou uma nova temporada de aquisições, lembrando que a rede fez 20 operações em dois anos para reforçar sua presença no comércio eletrônico, melhorar logística e entrar em novos segmentos de mercado. “Precisamos digerir essas 20 aquisições. Nosso time de integração tem muito trabalho paa colher todos os frutos, ampliar conexões. Vamos nos concentrar nos ativos que estão no nosso ecossistema”.
O executivo exaltou o potencial comercial do KaBum!, plataforma de venda de games e outros produtos de tecnologia, adquirido no ano passado, e da fidelidade do cliente desse segmento de apelo jovem, além do ticket elevado da categoria de produtos, que incluem até equipamentos para mineração de criptomoedas. Essa plataforma opera em em cooperação com o Jovem Nerd e o Canaltech, negócios adquiridos e que dialogam com o mesmo universo de clientes.
Juros
Embora diga que a estratégia de longo da companhia não vai mudar, mesmo após o resultado financeiro do quarto trimestre abaixo das expectativas, o CEO do Magalu disse que a rede busca melhorar sua geração de caixa, fez uma reprecificação com seus sellers em fevereiro, alterando tarifas, e está fazendo um “trabalho intenso” para redução de estoques, além de um controle maior de despesas operacionais e busca por novas receitas. Também pretende monetizar ativos ganhando disputas judiciais e aumentar receita com publicidade vendida a seus parceiros do marketplace.
“Infelizmente, no Brasil, a gente teve o público de baixa renda perdendo o poder de compra. A gente sentiu isso. O impacto da inflação na renda é alto. O Brasil virou o Brasil de poucos. Isso me deixa triste, pois temos a vocação de vender para as massas”, desabafou o executivo, expressando também confiança de que o país vai voltar a ter maior distribuição de renda no futuro (“A gente espera e torce que a situação macroeconômica se normalize”).
Mesmo fazendo a ressalva de que não tem “bola de cristal”, Trajano disse esperar que a dinâmica econômica de 2022 seja a oposta de 2021, quando o primeiro semestre foi melhor do que o segundo para o varejo, quando o ciclo de alta dos juros, iniciado em março do ano passado pelo Banco Central, levou a taxa Selic de 2% para os atuais 10,75% ao ano, com os bancos prevendo chegar ao fim de 2022 ao redor dos 13%.
“Não vi uma mudança significativa do cenário macro do quarto trimestre para o primeiro trimestre de 2022″, afirmou o CEO, que não descartou a possibilidade de que a situação do setor melhore antes do segundo semestre.
No mês passado, o governo federal publicou decreto reduzindo o IPI (imposto sobre produtos industrializados) em até 25%. Por outro lado, a Petrobras elevou o preço dos combustíveis, refletindo a disparada da cotação internacional do barril de petróleo com o conflito militar entre Rússia e Ucrânia, e novas preocupações com a inflação de commodities e desaceleração econômica da China diante do retorno de lockdowns para conter um novo surto de covid.
Nova mínima
Nesta manhã, as ações da Magalu apresentam forte queda, cravando uma nova mínima de R$ 5,30, desvalorização de 6,85%. Em 52 semanas, o papel oscilou entre uma mínima de R$ 5,30 e uma máxima de R$ 24,76, ou seja, perdeu 78,6% de valor no período de um ano.
“O Magazine Luiza reportou resultados do 4º trimestre abaixo do esperado. A dinâmica de receita segue impactada pela deterioração macroeconômica, principalmente nas lojas físicas e 1P (estoque próprio online), enquanto a margem Ebitda foi o destaque negativo (-2,6 pontos percentuais na comparação ano/ano), reflexo da fraca performance das lojas físicas no período”, comentou relatório da XP.
Do lado positivo, o relatório citou que o Magalu deu uma maior abertura da diversificação de produtos em sua plataforma, com as novas categorias representando 45% das vendas do e-commerce em 2021, com destaque para R$ 4 bilhões de GMV (vendas totais) do KaBum!, R$ 1 bilhão de GMV da Época Cosméticos, R$ 1,3 bilhão do AiQFome e R$5 bilhões em Netshoes/Moda. “Além disso, destacamos o avanço da penetração do Magalu Entregas e Agencias Magalu, que reduzem os custos de frete e tempo de entrega, enquanto a companhia sinalizou uma tendência positiva para capital de giro com mais de R$ 1 bilhão de redução em estoques no primeiro trimestre de 2022″, detalhou a XP.
A casa de análise Levante também focou nos dados positivos do balanço, como o aumento da participação das novas categorias de produtos no e-commerce decorrente dos ativos recém-adquiridos. “Desde 2018, com aquisições que consideramos certeiras e com investimentos orgânicos, o Magalu vem diversificando e ampliando suas fontes de receitas. Em 2021, as vendas de produtos de novas categorias representaram 45% das vendas do e-commerce (em termos anualizados), impulsionadas principalmente pelo marketplace, um dos que mais crescem no país. O espaço para a expansão desses negócios - todos fora das categorias tradicionais do Magalu – ainda é gigantesco”, analisou a Levante em relatório matinal.
Fevereiro
Em fevereiro, o e-commerce brasileiro retraiu 14% com relação ao mês anterior. Os dados foram divulgados hoje no Relatório Setores do E-commerce, da Conversion, agência de Search Engine Optimization (SEO), que aponta que em fevereiro os 10 principais e-commerces brasileiros receberam um total de quase 700 milhões de acessos. A lista dos 10 maiores sites é composta de: 1. MercadoLivre, 2. Americanas, 3. Amazon Brasil, 4. Magazine Luiza, 5. Shopee, 6. Casas Bahia, 7. AliExpress, 8. Netshoes, 9. Samsung e 10. Hurb.
Segundo a Conversion, a queda, que já era esperada, foi menor que a redução registrada no mesmo período no ano passado. Em fevereiro de 2021, o comércio eletrônico nacional registrou 1,49 bilhão de visitas e uma queda de mais de 16%. De acordo com o relatório, em média cada brasileiro acessou cerca de 8 vezes sites de e-commerce no mês. Cada acesso, por sua vez, pode ter a visualização de muitas páginas.
Os canais preferidos para chegar às lojas são “direto” (quando ele digita o endereço da loja e representa 44,3% dos acessos), busca orgânica do Google (27,2%) e busca paga (18,7%). Tráfego de redes sociais representam 3,1%.
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