Vida em tempo de guerra: Ucraniana conta como foi o 1º dia após invasão

Estima-se que o conflito possa deslocar mais de um milhão de pessoas da Ucrânia; Polônia seria o primeiro ponto de fuga para muitos

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Bloomberg Línea — Maryna Titarenko acordou às 5h da manhã na quinta-feira (24) com o celular tocando sem parar. Não era o despertador, estava cedo demais. Era um amigo que ligava para avisá-la: Kiev tinha sido bombardeada.

“Havia avisos sobre a Rússia podendo nos atacar em breve, mas a minha tarde na quarta-feira foi normal. Fui para a faculdade em um país relativamente seguro”, conta a jovem à Bloomberg Línea.

No dia seguinte, os russos tomaram conta do aeroporto militar e destruíram diversos ativos estratégicos. “Ficamos por um tempo sem energia e internet; eu não conseguia ligar para ninguém”, lembra.

“Por volta das 13h, vimos aviões militares voando baixo, próximos do chão. Achei que seria um cenário igual ao 11 de setembro [nos EUA], em que eles simplesmente iriam destruir o meu prédio.”

Maryna é uma das milhares de pessoas que moram na capital Kiev e que tiveram que deixar suas casas nos últimos dias após a invasão pela Rússia. Estima-se que o conflito possa deslocar mais de um milhão de pessoas da Ucrânia. A ONU já relatou movimentos substanciais de pessoas no país, com mais de 100 mil deixando suas casas e “vários milhares” cruzando fronteiras desde o início da invasão.

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A Polônia, que já abriga mais de um milhão de ucranianos, seria o primeiro ponto de fuga para muitos que desejam fugir do conflito.

“Muitos dos meus colegas deixaram a cidade [Kiev] pela manhã. O trânsito para a região oeste do país estava insano; todo mundo queria ir para lá, porque é onde dividimos a fronteira com a Polônia. Houve falta de gás e limitações para sacar dinheiro nos caixas eletrônicos”, conta.

O primeiro-ministro Mateusz Morawiecki alertou este mês que mais uma guerra poderia desencadear um “êxodo da Ucrânia”. Países da União Europeia localizados no leste europeu se preparam para receber um grande fluxo de refugiados.

“Eu não tinha me planejado para sair da cidade, porque nos disseram que eles não matariam civis. Mas depois, por volta das 16h, recebemos um alerta de segurança [do governo] orientando todos a irem para um abrigo mais próximo o mais rápido possível. Todo mundo começou a correr, carregando crianças, animais de estimação, alguns cobertores e roupas”, lembra.

O abrigo mais próximo de seu apartamento era uma estação de metrô. “Estava muito lotada, então eu sentei no chão e fiquei lá por cerca de três horas”, lembra.

Em Kiev, estações de metrô viraram bunkers improvisados e a população tem sido encorajada a permanecer escondida diante do conflito.

Maryna conta que muitos prédios possuem ainda um espaço no subsolo, que as pessoas têm usado como abrigo nos últimos dias. Esses, contudo, são mais apertados, sem iluminação ou ventilação adequados.

Depois de um dia escondida nos bunkers, Maryna conseguiu carona com alguns amigos para sair da cidade. “Não sabíamos se seria uma boa ideia, porque deveríamos nos esconder, não dirigir, mas decidimos sair da capital e viemos para a minha cidade natal, Khorol”. A cidade fica cerca de três horas de Kiev.

“Onde estou é um pouco longe das instituições militares e do governo, então espero que não sejamos um alvo logo. Nesta manhã [25 de fevereiro], tanques russos invadiram a capital. Estou muito feliz que saí, porque seria loucura ficar por lá.”

Mais cedo, as autoridades ucranianas acusaram as tropas russas de atacar alvos civis, enquanto o ataque liderado por Moscou continuava a reboque na capital, Kiev. O Ministério das Relações Exteriores da Rússia disse que está atacando apenas ativos militares.

“Eles prometeram que não vão matar civis, mas têm centenas de tanques russos na capital, dirigindo pelas ruas”, diz Maryna.

Após dias de escalada nas tensões e depois de o presidente russo negar ter planos de invadir a Ucrânia, Vladimir Putin autorizou, em pronunciamento pela TV, uma operação militar nas regiões separatistas do leste da Ucrânia. Explosões e sirenes foram ouvidas em várias cidades do país.

Em seu pronunciamento, Putin justificou a ação ao afirmar que a Rússia não poderia “tolerar ameaças da Ucrânia”. Putin recomendou ainda aos soldados ucranianos que “larguem suas armas e voltem para casa”. O líder russo afirmou que não aceitará nenhum tipo de interferência estrangeira.

Até o momento, ao menos 200 ucranianos, civis e militares, foram mortos, enquanto as forças ucranianas reagem contra as tropas russas, que também sofreram centenas de baixas.

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