Bloomberg Opinion — Se eu fosse projetar uma empresa automobilística para obter uma avaliação principesca no mercado de capitais, provavelmente ela seria muito parecida com a Porsche.
Como a Ferrari, a Porsche tem excelentes margens de lucro e uma reputação de tradição em carros esportivos e de luxo. Além disso, tem uma estratégia impressionante de veículos elétricos para desafiar a Tesla – o Porsche Taycan já supera o 911. Como empresa independente, a Porsche pode valer 80 bilhões de euros (US$ 91 bilhões) [1].
É por isso que eu e quase todos que seguem a controladora Volkswagen há bastante tempo argumentamos que a melhor coisa a fazer seria listar a Porsche separadamente. Afinal, toda a capitalização de mercado da VW mal ultrapassa os 100 bilhões de euros.
E vejam só, finalmente parece que vai acontecer! Na terça-feira (22), a VW confirmou discussões avançadas com a Porsche e a holding da família Piech sobre uma potencial oferta pública inicial do negócio de carros da Porsche.
Com a ameaça de guerra na Ucrânia e os aumentos das taxas de juros perturbando os mercados financeiros, este não é o momento ideal para listar qualquer tipo de empresa. Detalhes importantes ainda precisam ser esclarecidos e não há garantia de que a transação cruzará a linha de chegada. No entanto, o fato de termos chegado tão longe é um pequeno milagre.
Os investidores institucionais têm muito pouca influência na VW. As famílias Porsche/Piech, o estado da Baixa Saxônia e os sindicatos dão as ordens e, infelizmente, raramente concordam. Mas tendo coletado um impressionante conjunto de marcas ao longo dos anos, sua posição padrão não é vendê-las.
No entanto, mesmo os dinossauros na sala de reuniões da VW parecem ter percebido que o status quo não é sustentável. Na próxima década, a VW deve redesenhar completamente suas fábricas e parar de depender de motores de combustão. Com seu baixo valuation, a empresa não tem muito para onde fugir. A Tesla não vem com a mesma bagagem e, portanto, é avaliada em quase US$ 900 bilhões. A venda de ações deu à Tesla fundos para construir uma fábrica alemã no quintal da VW.
A Alemanha corporativa, que costuma não ser muito ágil, percebe que precisa mudar. A Daimler trocou de nome, ficando muito mais atraente como Mercedes-Benz Group e fez um spin off de seus negócios de caminhões no ano passado, por exemplo. Além do setor automotivo, a Siemens abriu caminho ao listar separadamente várias unidades. A fornecedora de autopeças Continental pode ser a próxima a passar pelo processo de separação.
Listar a Porsche é o passo mais importante que a VW pode dar para remodelar seu formato de conglomerado. A configuração atual não permite separar as atividades de combustão e elétrica da VW porque estão profundamente interligadas no nível da marca.
Não está claro por que aqueles que detém o poder da Porsche e da VW preferem um IPO em vez de um spin-off, que seria muito mais simples. Se, como foi noticiado na imprensa alemã, as famílias Porsche e Piech pretendem vender algumas de suas ações da VW para comprar uma participação maior na Porsche (sua menina dos olhos), isso pode criar alguns conflitos de interesse significativos.
Em um comunicado separado, a holding familiar (confusamente chamada Porsche Automobil Holding SE), disse que poderia adquirir ações ordinárias (com direito a voto) no IPO da Porsche.
É do interesse da VW obter o maior valor possível para a Porsche, enquanto as famílias, em teoria, têm interesse em adquirir ações baratas. Eles possuem uma participação majoritária na VW e têm vários assentos no conselho. Um aspecto que ajuda as famílias é que as ações ordinárias (com direito a voto) da VW atualmente alcançam um grande prêmio em relação às ações preferenciais (sem direito a voto), que são mais líquidas.
Dado seu histórico conservador, a VW pode decidir vender uma participação comparativamente pequena na Porsche, o que pode conter o potencial de valuation. Algo semelhante aconteceu quando a VW vendeu apenas 10% de participação em sua unidade de caminhões Traton, em 2019.
Mesmo assim, um IPO da Porsche seria um grande passo adiante. Os banqueiros amam seus Porsches; agora eles poderão comprar as ações também.
[1] A Porsche gera mais de 4 bilhões de euros de lucro operacional anual. Por alto, apliquei um múltiplo EBIT de 20 vezes, que é um grande desconto para onde a Ferrari negocia
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e seus proprietários.
Chris Bryant é colunista da Bloomberg Opinion que cobre empresas industriais. Anteriormente, trabalhou para o Financial Times.
– Este texto foi traduzido por Marcelle Castro, Localization Specialist da Bloomberg Línea.
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