Lula diz que não pedirá voto ao mercado e critica lucro dos bancos

“O que vocês vão fazer para parar de cobrar 300% de juro no cartão de crédito?”, indagou o petista em entrevista no Nordeste

Críticas ao lucro dos bancos e promessa de "abrasileirar" o preço dos combustíveis
17 de Fevereiro, 2022 | 03:00 PM

Bloomberg — Em uma entrevista a uma rádio do interior do Ceará, o líder nas pesquisas Luiz Inácio Lula da Silva (PT) subiu o tom das críticas ao mercado financeiro do país e criticou genericamente o lucro dos bancos no país

“Primeiro, não vou pedir voto para o mercado. Vou pedir voto para o povo brasileiro, que é o grande mercado que quero ajudar neste país. Na hora que o povo estiver comendo, bebendo, se vestindo e trabalhando, na hora que estiver podendo comprar as coisas, ele vai ser a coisa mais importante para o mercado”, disse Lula, em entrevista à rádio Progresso, de Juazeiro do Norte (CE).

“O mercado não existirá se não existir povo com capacidade de trabalhar e com capacidade de consumir”.

“Essa é uma coisa que o mercado vai ter de se acostumar. Não quero que o mercado venha fazer pergunta para mim (sobre) o que é que eu vou fazer. Eu vou perguntar para o mercado o que vocês vão fazer para acabar com a fome nesse país, para gerar emprego, para tornar o crédito mais barato, o que vão fazer para ajudar a gente”, disse.

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O tom mais ácido foi reservado aos bancos.

“O que vocês vão fazer para parar de cobrar 300% de juro no cartão de crédito. Chegar no banqueiro e perguntar: ‘Ô cara, me conta, qual o Brasil você quer? Você quer um Brasil onde no final do ano você faça um balanço onde teve um lucro de R$ 30 bilhões e o povo aumentou a pobreza? Ou você quer um país onde você ganhe um pouco menos e o povo ganhe um pouco mais? É a discussão que temos que fazer nesse país”, afirmou.

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Em 2021, os maiores bancos de varejo do país recuperaram a lucratividade, depois que as provisões para devedores duvidosos, aumentadas durante o auge da pandemia em 2020, foram gradualmente reduzidas. Em 2021, Itaú-Unibanco lucrou R$ 26 bilhões, seguido pelo Bradesco (R$ 22 bi), Banco do Brasil (R$ 21 bi) e Santander (R$ 16 bi).

POR QUE ISSO É IMPORTANTE: O tom beligerante das críticas ao mercado financeiro e aos bancos – numa rádio cujo sinal chega a 54 municípios do Cariri, sertão cearense – foi adotado numa região que é uma das fortalezas eleitorais de Lula. Desde 2002, o PT é o partido mais votado no Ceará em eleições presidenciais. No segundo turno de 2006, Lula obteve 82% dos votos válidos no Estado.

No atual ciclo eleitoral, Lula vem fazendo acenos ao centro, como a escolha do ex-tucano Geraldo Alckmin (sem partido) para ser seu companheiro de chapa e tem defendido, como voltou a fazer hoje, que quer ser candidato “não só do PT, mas de um movimento” para derrotar Bolsonaro. Ele também já afirmou que a ex-presidente Dilma Rousseff não integrará um novo governo, caso seja eleito.

Com estes movimentos, o petista busca encurralar a chamada terceira via.

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Na entrevista desta quinta, quando estava respondendo a uma pergunta de sua relação com o mercado, Lula lembrou da declaração de Mario Amato, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) em 1989, que previu que “800 mil empresários” deixariam o país se o petista vencesse aquela eleição [Fernando Collor foi eleito naquele ano].

“Demorou um pouco e eu ganhei as eleições e nunca os empresários ganharam tanto dinheiro, como ganharam no meu governo. O que faz bem para a economia é a inclusão, não a exclusão”, disse.

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“VAMOS ABRASILEIRAR O PREÇO DA GASOLINA”: Lula voltou a bater numa tecla que pesquisas de opinião mostram que é uma fonte permanente de desgaste do governo Bolsonaro: o preço dos combustíveis. Ele criticou a “canalhice que estão fazendo com a Petrobras” (PETR4) e voltou a prometer o fim da política de paridade de preços da estatal com o mercado internacional.

“Eu quero dizer aqui em alto e bom som, eu sei que o mercado fica nervoso quando eu falo isso, mas eu quero que pensem o seguinte: nós vamos abrasileirar o preço da gasolina. Os preços vai ser brasileiro porque os investimentos são feitos em reais. A gente vai tirar gasolina e aumentar a capacidade de refino”, disse.

“O povo está pagando o gás, o diesel e a gasolina a preços que jamais deveria estar pagando”, segundo ele, porque a atual política da companhia abandonou projetos de refino de petróleo no Brasil. Ele voltou a defender que a Petrobras aumente a capacidade de transformar petróleo cru em derivados para diminuir as importações de combustíveis já prontos.

Referindo-se à política estabelecida ainda no governo Temer de desinvestimentos da Petrobras em áreas que não sejam a da exploração e produção de petróleo, Lula destinou as seguintes palavras: “Esses malandros estão destruindo a Petrobras, fatia por fatia”.

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ELETROBRAS: O ex-presidente também criticou a proposta do governo Bolsonaro de privatizar a Eletrobras (ELET3), que nesta semana deu um passo com a aprovação, pelo TCU (Tribunal de Contas da União), dos estudos técnicos para a venda dos ativos da holding, que controla as estatais federais de energia elétrica.

“Agora vão querer privatizar a Eletrobras para aumentar mais a energia elétrica, para deixar o povo mais no escuro. Os empresários privados não têm preocupação se o povo está vivendo mais no escuro, se está cozinhando na luz do candeeiro, se a mulher está costurando na luz de candeeiro. O que querem é lucro. Quem tem que cuidar do povo é o Estado”, disse.

O petista afirmou que o programa Luz para Todos, de universalização do acesso à energia elétrica, não teria sido possível se a Eletrobras estivesse sob controle privado. Segundo ele, o Luz para Todos mobilizou R$ 20 bilhões em investimentos para beneficiar 15 milhões de pessoas.

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Graciliano Rocha

Editor da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela UFMS. Foi correspondente internacional (2012-2015), cobriu Operação Lava Jato e foi um dos vencedores do Prêmio Petrobras de Jornalismo em 2018. É autor do livro "Irmã Dulce, a Santa dos Pobres" (Planeta), que figurou nas principais listas de best-sellers em 2019.