Como a escalada do conflito entre Rússia e Ucrânia afetaria a AL?

Gás, petróleo, grãos e infraestrutura; confira quais são os desafios que o governo da região deverá enfrentar

Se Putin invadir o território novamente, sanções serão aplicadas – mas a Rússia deve revidar
08 de Fevereiro, 2022 | 03:45 PM

Bloomberg Línea — No âmbito das probabilidades, um conflito armado entre Rússia e Ucrânia é algo impossível para muitos analistas. Contudo, o tsunami econômico do confronto já é objeto de estudos.

Nos últimos dias, o presidente russo Vladimir Putin, que, segundo diferentes análises já alocou cerca de 100 mil militares na fronteira com a Ucrânia, criticou as propostas de segurança dos Estados Unidos e da OTAN destinadas a encerrar uma crise no antigo território soviético, embora tenha mostrado disposição para novas conversas.

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A OTAN rejeitou amplamente as exigências do Kremlin de que a aliança ocidental seja fechada para a possível futura adesão da Ucrânia.

Biden y Putin

Diante disso, os aliados ocidentais enviaram tropas para a região, embora não para a Ucrânia.

Certamente, se Putin invadir a Ucrânia novamente, o Ocidente imporá sanções à Rússia, o que pode causar retaliação. Nesse contexto, a Bloomberg Línea consultou diversos especialistas sobre como a América Latina poderia ser afetada pelo possível conflito, apesar de a região estar posicionada à margem dessa tensão geopolítica.

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“Estamos acostumados a olhar para os Estados Unidos e a Europa, mas neste conflito devemos permanecer vigilantes e estar atentos às decisões do presidente russo”, diz Diego Guelar, ex-embaixador argentino na China que, como outros especialistas, sustenta que a ocorrência de uma guerra dependerá de Putin.

Uma possível retaliação russa às nações ocidentais seria o fechamento de todos os gasodutos que transportam gás russo para países do Ocidente. A Rússia envia cerca de 230 milhões de metros cúbicos por dia de gás para a Europa, dos quais um terço passa pela da Ucrânia. Em 2021, o gás natural russo representou quase 13% de todas as exportações russas, ou cerca de US$ 62 bilhões, mostrando a magnitude desse comércio com o outro lado do mundo.

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Un gasoducto de la rusa Gazprom.

A professora de assuntos internacionais da Universidade de Harvard, Meghan L. O’Sullivan, destaca em sua coluna na Bloomberg que existe outra arma russa em potencial que pode ser muito eficaz: a capacidade de perturbar os mercados mundiais de petróleo, que afetaria diretamente os consumidores americanos.

A Rússia poderia aumentar unilateralmente os preços mundiais se cortar seus atuais 10 milhões de barris por dia de produção de petróleo, mesmo que o aumento seja relativamente pequeno. Um aumento no preço do petróleo afetaria diretamente os EUA.

De acordo com a Bloomberg, está previsto um aumento instintivo de até US$ 10 para o petróleo bruto se a Rússia invadir a Ucrânia, e os preços do GNL também devem subir ainda mais, já que o fornecimento para a Europa já está apertado.

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Além da energia, a Rússia e a Ucrânia respondem por um quarto das exportações globais de grãos, e os preços do trigo e do milho subiram com a perspectiva de uma repentina escassez na oferta. O mesmo vale para o alumínio, já que a Rússia é um dos principais produtores do metal.

Tensões entre Rússia e Ucrânia elevaram o preço do trigo

Assim, a possibilidade de retaliação contra o Ocidente em termos econômicos está em jogo no desenrolar do conflito.

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Efeito rebote

Federico Merke, diretor do programa de mestrado em política internacional da Universidade de San Andrés, explica que o estopim de um conflito geraria um impacto indireto na América Latina, não relacionado ao que poderia gerar na Europa. No entanto, ele alerta: “É importante olhar para os laços muito estreitos que a Rússia tem com governos como os da Venezuela, Cuba e Nicarágua, e a possibilidade de enviar tropas para esses países. Embora as autoridades americanas considerem isso improvável, essa decisão representaria uma posição da região”.

De qualquer forma, isso indica que a Rússia não tem capacidade logística para estabelecer várias frentes de guerra ao mesmo tempo, embora não signifique que os laços com a região não estejam se estreitando. “A comercialização de armas e o intercâmbio de militares já é uma realidade com Venezuela, Cuba, Peru e até com a Argentina, que está negociando a compra de aviões russos”, diz o acadêmico.

A preocupação dos analistas existe pois, em um conflito armado, haveria mais polarização na América Latina: países que seriam pressionados a estar do lado da Rússia e apoiá-la política e ideologicamente.

Merke também se preocupa com o gás, que poderia ser um grande problema se houvesse uma escalada. Vários países da América Latina importam gás liquefeito dos EUA e do Oriente Médio e o preço continua subindo. E na América Latina, a demanda também aumentou, pois a produção diminuiu devido à pandemia. “Com o preço do gás mais alto, um conflito armado o aumentaria ainda mais”, explica Merke. “A Europa teria de usar carvão ou energia nuclear, e isso afetaria a região.”

“É um estado de alta tensão, mas não acho que chegaremos a um conflito armado”, reafirma Guelar. O impacto vai além do preço do trigo. É importante que Putin esteja considerando a necessidade de implantar infraestrutura militar, pois acredito que ele está tomando uma posição militar com os Estados Unidos”, indica o diplomata.

A atual configuração de poder internacional não é a da guerra fria. Hoje, a Rússia tem um governo conservador. Qualquer país da América Latina que fizer qualquer tipo de manifestação seria irresponsável e desnecessário, porque coloca em risco o interesse nacional desses países”, diz Gabriel Puricelli, coordenador do programa de política internacional do Laboratório de Políticas Públicas. “A região é uma área de paz e desprovida de armas nucleares, então deve se afastar absolutamente de qualquer posição. Não acho que a abordagem que Putin poderia ter vá além da retórica”.

--Esta notícia foi traduzida por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.

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Lorena Guarino

Periodista argentina, especializada en negocios y economía desde hace más de 20 años. Fue editora general de Forbes Argentina y anteriormente se desarrollo en diarios como La Nación, El Cronista Comercial y Buenos Aires Económico e Infobae entre otros.