Bloomberg — Eles chegaram lá de maneiras totalmente diferentes, mas as duas maiores economias da América Latina estão em um lugar semelhante e nada invejável dois anos após a pandemia: de volta à recessão.
A produção do México encolheu 0,1% no trimestre encerrado em dezembro, informou o instituto de estatísticas do governo, após uma contração de 0,4% no período anterior. A economia de US$ 1,6 trilhão do Brasil – a maior da região – entrou em recessão no segundo trimestre de 2021 e deve ficar estável durante todo este ano.
As políticas de gestão da pandemia nos dois países foram muito diferentes. O Brasil desembolsou mais dinheiro que outras economias emergentes e que muitos países ricos. Suas medidas de estímulo somaram cerca de 12% do produto interno bruto, segundo o Fundo Monetário Internacional, traduzindo-se em um déficit orçamentário historicamente grande.
O México foi tão rígido que até os economistas de Wall Street – que normalmente aplaudem a prudência fiscal nos países em desenvolvimento – pediram um pouco de tolerância. Excluindo os pagamentos de juros, o governo chegou perto de equilibrar seu orçamento em 2020 e 2021.
No entanto, ambos os países terminaram com economias estagnadas e poucos sinais de crescimento no futuro próximo – um resultado familiar na América Latina, região retardatária nas décadas pré-pandemia e agora mais atingida que a maioria pela covid-19.
Recessão sincronizada
“Ambas as economias enfrentam uma recessão sincronizada, que reflete uma combinação de problemas na cadeia de suprimentos, aumentos de taxas de juros, incertezas políticas e problemas estruturais”, diz Adriana Dupita, da Bloomberg Economics.
Mas também há diferenças entre eles.
Os grandes gastos do Brasil desencadearam uma recuperação muito mais rápida. A economia encolheu 3,9% – índice relativamente manejável– em 2020 e já havia recuperado e superado a perda em março do ano passado. Enquanto isso, os programas de controle da pandemia do governo, incluindo o auxílio para famílias de baixa renda, conseguiram reduzir brevemente a pobreza perto de níveis recordes.
Por outro lado, o México – que apresentou contração de mais de 8% em 2020 – não deve voltar aos níveis pré-pandemia até 2023. E agora há cerca de 4 milhões de pessoas a mais vivendo na pobreza que em 2018.
Mas o crescimento do Brasil diminuiu quando o estímulo fiscal foi encerrado no ano passado, enquanto o banco central embarcou no aperto monetário mais agressivo do mundo. O Banco Central elevou a taxa básica de juros em 725 pontos-base para conter a inflação, que passou de 10%, em parte impulsionada pelos gastos públicos. Espera-se outro aumento de 150 pontos-base.
O presidente Jair Bolsonaro iniciou mais uma repasses. No entanto, com a política monetária indo na direção oposta, não se espera que essas medidas levem o crescimento muito acima de zero para o resto deste ano.
Alguns analistas afirmam que os gastos visam garantir apoio político em vez de reforçar o potencial da economia, abordando suas fraquezas de longo prazo.
Sobrevivência política
“É a sobrevivência política ou o populismo”, disse Barbara Fritz, professora de economia do Instituto da América Latina da Universidade Livre de Berlim. “Não há política tão boa quanto elaborar políticas industriais, fomentar investimentos e simplificar a administração”.
O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, que todos os dias denuncia o neoliberalismo em suas coletivas de imprensa matinais, diz que sua austeridade na pandemia acabará valendo a pena. Manter baixo o peso da dívida, segundo o argumento, garantirá que o México evite o desvio de muitos recursos para pagamentos de juros em vez de programas sociais.
A dívida nacional gira em torno de 60% do PIB, segundo números do FMI, em comparação com cerca de 90% para o Brasil. O banco central do México não teve que aumentar as taxas de juros de forma tão agressiva quanto o do Brasil porque a inflação não aumentou tão acentuadamente.
Ainda assim, é necessário averiguar se haverá um grande dividendo de crescimento. O FMI espera que a economia do México cresça 2,8% este ano, bem abaixo da média de 4,8% dos mercados emergentes.
Debilidade extrema
O que impressiona também é que ambas as economias contam com motores de crescimento que são exatamente o oposto do que seus políticos prometeram.
Bolsonaro contratou Paulo Guedes – um economista de uma escola de pensamento associada à Universidade de Chicago, famosa por sua hostilidade aos gastos públicos – para administrar a economia. Ele liderou uma enorme ostentação fiscal, quebrando as regras orçamentárias que deveriam restringir os gastos.
Por sua vez, Obrador chegou ao poder prometendo reduzir a dependência de seu gigante vizinho ao norte. Mas o maior impulso que a economia do México obteve nos últimos dois anos foi o resultado indireto da generosidade fiscal dos Estados Unidos na pandemia, que desencadeou um boom na demanda por exportações mexicanas, bem como uma onda de remessas enviadas por imigrantes que receberam estímulo econômico do governo americano.
É “preocupante”, diz Alberto Ramos, economista-chefe para a América Latina do Goldman Sachs (GS), que o México só tenha chegado tão longe por ter pegado carona na política dos EUA. Ele também não está confiante nas perspectivas no Brasil: “ambos os países têm motores de crescimento extremamente fracos”.
Mais uma ‘década perdida’?
A pergunta que fica é: qual país (se é que algum deles conseguirá) vai crescer primeiro?
Para economistas orientados para o crescimento, como Arturo Huerta, da Universidade Nacional Autônoma do México, a política do Brasil de aquecer a economia e aliviar a pobreza por meio de repasses oferece melhores perspectivas.
Analistas que se preocupam mais com os riscos fiscais, principalmente com o Federal Reserve prestes a começar a aumentar as taxas de juros dos EUA, podem enxergar benefícios na cautela do México (e riscos para o Brasil).
O próprio presidente do Bacen, Roberto Campos Neto, parecia estar nesse grupo em novembro, quando alertou que a combinação brasileira de baixo crescimento, dívida alta, inflação e taxas de juros crescentes sugere uma perspectiva que “não é mais sustentável, mas explosiva”.
Nenhum dos países parece estar próximo de atingir o que já tem sido difícil para a economia da região recentemente.
A América Latina precisa de “crescimento inclusivo e de longo prazo”, diz Ernesto Revilla, chefe de economia da América Latina do Citigroup (C) e ex-economista-chefe do ministério das Finanças do México. “Nós não queremos mais uma década perdida. Mas esse risco existe”.
--Esta notícia foi traduzida por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.
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