Moro recebeu R$ 3,4 milhões da Alvarez & Marsal

Valor alcançou US$ 645 mil referentes a 11 salários e bônus de contratação por firma, que também administra recuperação judicial da Odebrecht. Ex-juiz nega conflito

Moro exibe nota fiscal de parte dos pagamentos que recebeu da Alvarez & Marsal, como consultor
28 de Janeiro, 2022 | 06:33 PM

Bloomberg Línea — Nos onze meses em que permaneceu contratado pela firma de consultoria Alvarez & Marsal, o ex-ministro da Justiça e ex-juiz Sergio Moro disse ter recebido um bônus de contratação de US$ 150 mil mais um salário mensal de US$ 45 mil dólares. No total, isso representa US$ 645 mil, ou R$ 3,46 milhões, considerando o câmbio de hoje.

A Alvarez & Marsal é uma consultoria que também é a administradora da recuperação judicial da Novonor (antiga Odebrecht), um dos principais alvos da operação Lava Jato. Moro abriu os detalhes de seus vencimentos numa live agora no final da tarde com o deputado Kim Kataguiri (Podemos-SP), seu aliado político.

Segundo ele, após os descontos de impostos nos Estados Unidos, ele tinha um salário líquido em torno de US$ 24 mil (R$ 128,8 mil). Ele afirmou que devolveu R$ 67 mil do bônus à empresa por ter encerrado o contrato antes do previsto.

Moro juntou-se à empresa após cumprir a quarentena da sua demissão do cargo de ministro da Justiça. Em novembro de 2021, após desligar-se da Alvarez & Marsal e filiou-se ao Podemos para disputar a Presidência da República.

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Na live, Moro disse que jamais prestou serviço à Odebrecht ou a qualquer empresa envolvida na Operação Lava Jato. Moro disse que foi incluído no seu contrato, a seu pedido, uma cláusula que vetava a sua atuação como consultor a qualquer empresa da Lava Jato.

“Eu nunca trabalhei para o Odebrecht, na verdade, eu desmantelei o império de corrupção da Odebrecht, eu decretei a prisão de diretores da Odebrecht, do dono da Odebrecht. Depois que eu saí do Ministério da Justiça, eu preciso ganhar minha vida, eu foi contratado por uma empresa de consultoria norte-americana, a Alvarez & Marsal”.

“Jamais recebi um tostão [da Odebrecht]. A Alvarez & Marsal é uma consultoria internacional. No Brasil, há várias unidades da empresa. Eu fui contratado pela unidade de disputas e investigações. A Alvarez & Marsal, antes de eu entrar nela, foi nomeada por um juiz para a recuperação judicial dela. Quem fez isso é uma outra unidade e não tem nada a ver com aquilo que eu recebia”, afirmou.

POR QUE ISSO É IMPORTANTE: A remuneração de Moro pela é alvo de investigação no TCU (Tribunal de Contas da União) por suspeita de conflito de interesse já que a Alvarez & Marsal também atua na recuperação judicial da Odebrecht, empresa que foi alvo da Lava Jato quando Moro era titular da 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba.

O movimento de abrir as contas de Moro nesta sexta – celebrada por ele como um “marco de transparência” – antecipa também a possibilidade que os dados viessem a público no âmbito da investigação do TCU.

Moro também disse que a investigação do TCU é um “abuso”. “É um abuso porque o UCU serve para quê? Para investigar governo, a administração pública, e não para investigar uma pessoa privada, que é o meu caso depois que deixei, e outra empresa privada”, disse Moro.

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CONTEXTO: Em junho de 2015, o então juiz Sergio Moro decretou a prisão de Marcelo Bahia Odebrecht e de toda a cúpula da empreiteira no âmbito de uma investigação da Operação Lava Jato.

Os dirigentes da empreiteira foram condenados em múltiplos processos por corrupção e lavagem de dinheiro, mas 77 executivos e ex-executivos do grupo firmaram um acordo de colaboração premiada com a Procuradoria-Geral da República em 2017.

Em junho de 2019, a Odebrecht protocolou o maior pedido de recuperação judicial da história do país para negociar dívidas de R$ 98,5 bilhões.

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No curso da apuração do TCU também veio a público que o ex-juiz recebeu R$ 200 mil por um parecer de 54 páginas, em novembro de 2020. O documento foi pago pelo empresário israelense Beny Steinmetz, que trava um litígio internacional com a Vale. O parecer foi entregue no intervalo entre o final da quarentena de Moro e antes da sua contratação pela Alvarez & Marsal.

(Esta reportagem foi atualizada às 19h18 desta sexta, 28 de janeiro. A primeira versão saiu antes da live do ex-ministro, com base em uma informação veiculada pelo site Antagonista, que atribuía a Moro pagamentos de R$ 656 mil dólares pelo contrato)

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Graciliano Rocha

Editor da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela UFMS. Foi correspondente internacional (2012-2015), cobriu Operação Lava Jato e foi um dos vencedores do Prêmio Petrobras de Jornalismo em 2018. É autor do livro "Irmã Dulce, a Santa dos Pobres" (Planeta), que figurou nas principais listas de best-sellers em 2019.