Por que a agência de rating S&P está pessimista com a Via em 2022?

S&P rebaixa nota com alertas sobre provisões judiciais, inadimplência e cenário de juros e inflação

Em novembro, a Via inaugurou a loja Casas Bahia Marginal Tietê em uma área de 18 mil m² , em São Paulo; S&P Global faz alerta sobre plano de expansão da companhia
/
27 de Janeiro, 2022 | 04:27 PM

São Paulo — A Via (VIIA3), uma das maiores varejistas do Brasil, mergulhou numa espiral de avaliações negativas neste começo de 2022. Os investidores já tratam publicamente sobre os riscos de uma recuperação judicial no horizonte, como revelou um recente relatório do grupo financeiro XP. Nesta quinta-feira (27), a companhia, dona das marcas Casas Bahia e Ponto, confirmou que teve seus ratings rebaixados pela agência de classificação de riscos S&P Global. A ação da empresa já perde quase 15% em janeiro e 69% em 12 meses.

“A Via poderá enfrentar dificuldades para reduzir sua alavancagem nos próximos trimestres, dada a significativa deterioração do ambiente macroeconômico brasileiro, com elevadas taxas de juros, inflação e desemprego, afetando a renda disponível das famílias. Tais fatores podem pressionar sua rentabilidade, geração de caixa e aumentar o custo de sua dívida”, citou relatório da S&P, assinado pelos analistas Henrique Koch, Fabiana Gobbi, Matheus Cortes e Wendell Sacramoni.

Veja mais: Pedido de recuperação judicial da Via é improvável, diz relatório da XP

A S&P Global projetou que a empresa apresentará alavancagem maior que sua expectativa anterior devido às elevadas provisões para processos trabalhistas e maior endividamento ajustado. Por outro lado, a agência de classificação espera que a varejista apresente menor nível de estoque e alongue prazos com fornecedores, permitindo uma geração de caixa operacional ao final de 2022.

PUBLICIDADE

“Como resultado, a S&P Global Rating rebaixou seus ratings de crédito de emissor e emissão da Via na Escala Nacional Brasil de ‘brAA’ para ‘brAA-” e alterou a perspectiva do rating de emissor para negativa”, anunciou a agência.

A perspectiva negativa indica que a S&P Global poderá rebaixar os ratings em mais de um degrau se a empresa não for bem-sucedida na implantação do seu plano para melhorar margens e manter o endividamento pelo menos estável nos próximos seis e 12 meses. “Se esse cenário se confirmar, veríamos a dívida líquida ajustada sobre Ebitda consistentemente acima de 5x e pressões de liquidez por uma fraca geração de caixa”, diz o relatório.

A agência traça ainda um cenário de rebaixamento de mais de um degrau no rating da companhia nos próximos 6-12 meses, que poderia resultar de uma deterioração da rentabilidade e das métricas de crédito da Via diante de novos processos trabalhistas, o que aumentaria a necessidade de provisão e/ou de maior inadimplência. “Além disso, a Via poderá apresentar margens pressionadas se houver um acirramento de concorrência no varejo online”, observam os analistas.

No comércio eletrônico, os marketplaces nacionais atualmente sofrem com a competição chinesa liderada pelo grupo Alibaba com sua plataforma AliExpress, entre outros, que investem em publicidade massiva na TV brasileira com promoções agresssivas de preços.

Veja mais: Via compra logtech CNT para fortalecer estratégia no e-commerce

A agência também cita a condição para um cenário de uma possível melhora para o rating neste ano. “Podemos alterar a perspectiva novamente para estável nos próximos 12 meses se a Via reportar métricas de crédito em linha com nosso cenário-base, incluindo dívida sobre Ebitda abaixo de 4x e cobertura de juros pelo Ebitda acima de 3x ao final de 2022″, escrevem os analistas.

Dívida

PUBLICIDADE

A provisão da Via por demandas judiciais somava, segundo a agência, cerca de R$ 1,5 bilhão em 2021, R$ 700 milhões em 2022 e R$ 450 milhões em 2023. Entre as premissas consideradas pela S&P Global, está a de que a margem Ebitda da Via seguirá pressionada em 2022 devido às maiores provisões e representatividade do e-commerce nas vendas totais comparado a 2021.

Em 2022 e 2023, esperamos melhora gradual, por redução nas provisões, melhor desempenho das lojas físicas, redução de custos e despesas. Esperamos menores níveis de estoque em 2022-2023 comparado com 2021, por menores riscos de desabastecimento na cadeia, além de alongamento de prazos com fornecedores”, afirmou o relatório.

A S&P afirma ainda que a Via tem um histórico bem-sucedido em operar com refinanciamentos de dívida constantes e com relativa concentração de dívida de curto prazo, dado seu bom relacionamento com os maiores bancos brasileiros e o fato de administrar sua liquidez considerando recebíveis de cartões de crédito que somavam R$ 4,2 bilhões no fim de setembro. “Porém, como não consideramos esses recebíveis em nosso cálculo de liquidez, as fontes sobre usos de liquidez da Via ficam próximas de 1,0x”, ressalva o relatório.

Para os analistas da S&P, as elevadas necessidades de capital de giro reduzem a capacidade de resiliência da companhia diante de choques externos. “Avaliamos a liquidez da Via como menos adequada, refletindo suas elevadas necessidades de capital de giro, com picos entre trimestres e investimentos para suportar seu plano de expansão nos próximos anos. Apesar de acreditarmos que a empresa possui sólido relacionamento com bancos e que deve continuar refinanciando seus vencimentos de dívida, não esperamos que seja capaz de absorver eventos de baixa probabilidade e alto impacto”, diz o relatório.

No fim do terceiro trimestre de 2021, a Via tinha 1.029 lojas em todo o Brasil, com 28 centros de distribuição para dar suporte a essas lojas e às operações onoline. O grupo possui um portfólio de produtos que inclui tecnologia e eletroeletrônicos, eletrodomésticos, móveis e utilidades domésticas. “A Via é uma true corporation, sendo seus acionistas de referência os fundos administrados pela família Klein, que detém cerca de 9,8% do total de ações da empresa, seguido pelos fundos Goldentree Fund, com 7,6%, EK-W Limited, com 5,1%, e a BlackRock, com 5%. O restante é livremente negociado na B3″, descreve a S&P.

Leia também

Arezzo confirma oferta pública após 2 semanas de oscilações atípicas

Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 29 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.