Ideias Bloomberg Línea — “Existe dinheiro de sobra para resolver a maioria dos problemas do mundo”, disse ninguém mais, ninguém menos que Abigail Disney, ativista, documentarista e membro do Patriotic Millonaires no prefácio do relatório global de 2022 da Oxfam.
O documento é uma compilação de dados que começam com um fato poderoso: desde o início da pandemia, um novo bilionário surgiu no mundo a cada 26 horas.
A pandemia de covid-19 conseguiu dobrar as fortunas dos 10 homens mais ricos do mundo, ao passo que 160 milhões de pessoas entraram na linha de pobreza.
A solução para o meio termo entre recursos extremos e escassos deve ocorrer com a implementação de um modelo tributário global progressivo que proporciona aos governos maior acesso aos recursos (ou melhor distribuição da prosperidade nacional) para melhorar os serviços básicos de que um país precisa para reduzir essa lacuna: educação, saúde e segurança.
Tomemos como exemplo o México – os dados informados pela filial mexicana da Oxfam reforçam a tendência global:
- 15.215 mexicanos (0,01% da população do país) somam um patrimônio que equivale a 36% do PIB do México. Esse valor é superior aos 1,2 trilhão (aproximadamente US$ 58,5 bilhões) de pesos do Orçamento de Despesas da Federação para o ano fiscal de 2022.
- 655 pessoas acumulam uma fortuna de mais de 5 trilhões de pesos (aproximadamente US$ 244 milhões), valor muito próximo ao total de gastos programáveis do governo federal para 2022.
- Até 30 de novembro de 2021, havia 13 mil milionários mexicanos com uma riqueza total de 2,9 trilhões de pesos (aproximadamente US$ 141,5 bilhões), sendo este o top 5:
- Carlos Slim Helú, com 1,4 trilhão de pesos (US$ 68,2 bilhões)
- Germán Larrea Mota Velasco, com 458 bilhões de pesos (US$ 22,3 bilhões)
- Ricardo Salinas Pliego, com 265 bilhões de pesos (US$ 12,9 bilhões)
- Alberto Baillères González, com 178 bilhões de pesos (US$ 8,6 bilhões)
- Juan Francisco Beckmann Vidal, com 148 bilhões de pesos (US$ 7,2 bilhões)
De acordo com os cálculos da Oxfam México, um imposto progressivo anual sobre a riqueza das pessoas que possuem mais de 100 milhões de pesos (US$ 4,8 milhões) permitiria arrecadar cerca de 400 bilhões de pesos (US$ 19,5 bilhões) por ano, quantia suficiente para cobrir todos os programas atuais do Ministério da Previdência.
O México tem pouco caixa para realizar mudanças em questões básicas porque é um dos países com a menor arrecadação tributária não só da América Latina, mas também da OCDE. A cada ano se arrecada o equivalente a 13% do PIB, enquanto o Brasil fica com 33%, Argentina com 29% e Colômbia com 19%.
Além de pouco, essas receitas já estão comprometidas desde o início: sete em cada 10 pesos de receita pública são destinados a cobrir despesas comprometidas com o pagamento de dívidas, pensões e repasses para estados e municípios.
Como disse há algumas semanas o ex-secretário-geral da OCDE, José Ángel Gurría: estamos condenados a ser um país com problemas de “hormônios de crescimento”. “No México, como temos uma receita pequena, estamos fadados a continuar com um estado pequeno e um governo pequeno”, disse o também ex-secretário da Fazenda.
“Segundo a Cepal, a mortalidade por covid-19 é maior nos hospitais públicos do que nos privados, e isso explica o baixo investimento do Estado mexicano e a enorme desigualdade. Acreditamos que deve haver um sistema de saúde universal, não apenas com cobertura geral, mas também com qualidade. E isso exigiria pelo menos o dobro do que está sendo gasto agora. Mas como não há espaço fiscal, a primeira coisa a fazer é uma reforma tributária progressiva”, disse Alexandra Haas, diretora executiva da Oxfam México.
Para a organização, se não for realizada uma reforma fiscal que também leve em conta as mudanças demográficas no México, as gerações futuras teriam que pagar seis vezes mais que as de hoje para receber os mesmos bens e serviços públicos que recebem hoje – tanto em quantidade quanto em qualidade.
Sem dúvida, em matéria tributária, o México não agiu de acordo com seu grau de desenvolvimento. Durante décadas, o petróleo foi o amortecedor e o salvador do que não é arrecadado do resto da economia mexicana.
Uma reforma tributária no estilo Robin Hood já havia sido proposta ao governo mexicano na década de 1960 por um economista húngaro contratado pela secretaria da Fazenda e Crédito público do país, Nicholas Kaldor.
Sua proposta não foi bem sucedida porque arriscava uma fuga de capitais. Os analistas da Oxfam ou o presidente Andrés Manuel López Obrador, que apresentou a proposta como se fosse sua há algumas semanas na ONU, levarão esse detalhe em consideração?
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--Esta notícia foi traduzida por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.
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