Devoluções de presentes de Natal sufocam varejistas e aterros

Varejistas e consumidores enfrentam um futuro caro e insustentável com aumento dos custos de manuseio e devolução

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Bloomberg Opinion — Passados alguns dias das festas de fim de ano e do sentimento mais benevolente que as envolvem, os americanos estão dando uma olhada mais crítica e distanciada em seus presentes de Natal. Muitos não gostam do que vêem.

Um em cada quatro americanos espera devolver pelo menos um presente de Natal no próximo fim de semana, segundo um relatório da UPS. São pelo menos 60 milhões de pacotes em uma única temporada de devoluções só para o maior remetente de pacotes do mundo, e um aumento de 10% em relação às devoluções do mesmo período de 2020. À medida que os custos de envio e manuseio dessas devoluções aumentam, varejistas e consumidores enfrentam um futuro de compras caro e insustentável.

Por gerações, varejistas experientes adotaram políticas de devolução brandas como forma de projetar confiabilidade e reter clientes. Eles sabiam perfeitamente que clientes sem escrúpulos poderiam explorar políticas de reembolso que não entram em questionamentos sobre os motivos ou que não exigem apresentação de nota fiscal, como é comum nos Estados Unidos. Mas o sucesso de varejistas como a Nordstrom e a Target, ambas com políticas de devolução notoriamente permissivas e clientes fiéis, destacou os benefícios compensatórios. Em uma pesquisa recente com empresas de vestuário, 86% dos entrevistados concordaram que as devoluções são um “mal necessário”.

Os varejistas on-line reconheceram essa necessidade desde o início, adotando políticas de devolução permissivas e frete de devolução gratuito para criar confiança e fidelidade entre os novos consumidores no comércio eletrônico. Talvez o proponente mais agressivo tenha sido a Zappos, a varejista de calçados online, agora de propriedade da Amazon.com. No início, a empresa encorajou os clientes a encomendar sapatos em vários tamanhos e depois devolver os que não servissem – e pagava pelo frete. Já em 2010, a Zappos dizia alegremente aos repórteres que seus melhores clientes eram aqueles que devolviam mais produtos.

É um jeito caro de ganhar participação de mercado. Em 2020, os consumidores dos EUA devolveram cerca de US$ 428,6 bilhões em mercadorias, ou 10,6% do total de vendas no varejo. Agora, os varejistas online, com consumidores exigentes da era covid, enfrentam taxas de devolução entre 15% e 30%.

Os reembolsos são apenas o início dos custos de um varejista. De acordo com uma análise recente de empresas envolvidas no setor de devoluções, custou US$ 33 para os varejistas processarem um item de devolução de US$ 50, em 2021, um aumento de 59% em relação ao ano anterior.

Vários fatores conhecidos figuram nesses custos crescentes durante a era Covid, especialmente para os varejistas de comércio eletrônico. O aumento dos custos de transporte encareceu o envio de mercadorias devolvidas para centros de processamento especializados e depois para seus destinos finais. Os custos trabalhistas crescentes pressionaram os varejistas que precisam de funcionários para abrir, avaliar e encaminhar produtos devolvidos.

Mas os maiores custos, de longe, estão relacionados a baixas contábeis e liquidação de devoluções (em média, entre US$ 6,50 e US$ 35,25 por produto de US$ 50). Poucos produtos devolvidos são redirecionados de volta ao estoque de um varejista. A enxurrada de devoluções é tão grande (e crescente) que é simplesmente impossível para os varejistas avaliarem se cada par de jeans, conjunto de móveis de varanda ou kit de Lego está em condições de revenda.

Para gerenciar o volume, os varejistas contam com uma rede bizantina de corretores, revendedores, liquidatários e – às vezes – eles mesmos para extrair valor dos itens devolvidos. Por exemplo, a Home Depot realiza leilões de liquidação online de produtos devolvidos com descrições de lote como “Caminhão (18 paletes) de equipamentos elétricos de jardinagem, penteadeiras, móveis para banheiros e muito mais”. Os vencedores selecionam e - esperançosamente - revendem os produtos. Mas não há garantia de que tudo vai funcionar (afinal, é uma devolução), e assim o revendedor também assume o ônus do descarte.

Isso pode ser um fardo pesado. Em 2020, as devoluções do varejo produziram quase 3 bilhões de quilos de resíduos. Parte disso é embalagem. Mas muito disso é produto devolvido que não pode ser revendido. Nesses casos, revendedores e varejistas, diante de uma enxurrada incontrolável de devoluções, são conhecidos por incinerar o estoque devolvido ou despejá-lo em aterros sanitários. Os varejistas que não conseguem resolver o problema não apenas assumem a responsabilidade pelo desperdício, mas correm o risco de serem criticados e julgados por seus clientes.

Os encargos financeiros são igualmente graves. No mês passado, o varejista de moda online do Reino Unido boohoo cortou sua previsão de vendas devido, em parte, a um aumento altamente prejudicial de 12,5% nas devoluções em relação a dezembro de 2020.

Eles não estão sozinhos. Nos últimos anos, varejistas respeitáveis, incluindo a Nordstrom, tornaram mais rígidas suas políticas de devolução, que antes eram muito liberais, diante do aumento dos custos. As chamadas devoluções “gratuitas” estão sendo reduzidas e os consumidores estão sendo incentivados a entregar produtos indesejados em locais físicos.

Soluções que evitam afastar consumidores acostumados a devoluções gratuitas continuam escassas. Por exemplo, muitos varejistas de vestuário on-line investiram em provadores virtuais para ajudar os compradores on-line a comprar roupas adequadas. Até agora, os provadores não parecem ter tido muito impacto nas devoluções.

Uma abordagem melhor pode ser uma campanha do setor de varejo que descreva os custos ambientais e financeiros associados às devoluções de produtos. Em um momento em que consumidores e varejistas desejam aprimorar suas credenciais de sustentabilidade, um reconhecimento honesto do que acontece quando os consumidores compram mais do que precisam (ou desejam) pode beneficiar a todos.

Adam Minter é colunista da Bloomberg Opinion. Ele é o autor de “Junkyard Planet: Travels in the Billion-Dollar Trash Trade” e “Secondhand: Travels in the New Global Garage Sale”.

Os editoriais são escritos pela diretoria editorial da Bloomberg Opinion

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

– Esta notícia foi traduzida por Marcelle Castro, Localization Specialist da Bloomberg Línea.

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