Este é o raio-X do fundo imobiliário da Caixa que derreteu 25%

2/3 dos imóveis do FII Caixa Agências têm baixa liquidez para locação ou venda, segundo avaliação; banco diz que assegura renda de aluguel por 10 anos

Agência da Caixa em Montes Claros (MG), uma das 32 que compõem o CXAG11
10 de Janeiro, 2022 | 11:46 AM

O fundo de investimento imobiliário Caixa Agências (CXAG11), que estreou na semana passada em bolsa com uma queda de 25%, foi distribuído, durante o período de subscrição encerrado em 30 de dezembro, a 12.604 correntistas do banco, responsáveis por aportar 99% dos R$ 216 milhões que a instituição levantou com a emissão.

O lastro do ativo é composto de 32 imóveis que abrigam agências do banco em quatro Estados - MG, RS, SP e RJ -, e dos quais, após a venda para o CXAG11, a Caixa passou a ser locatária em contratos atípicos de 120 meses. Segundo a avaliação dos imóveis, que integra o conjunto de documentos protocolados pelo fundo na CVM (Comissão de Valores Imobiliários), 23 dos 32 imóveis foram considerados de liquidez “média-baixa” em cidades pequenas e médias do país.

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Isso significa que, segundo a Colliers, empresa que fez a avaliação dos imóveis para o lançamento do CXAG11), em caso de vacância estes imóveis que hoje abrigam agências bancárias levariam entre 12 e 24 meses para encontrar novos locatários ou compradores.

Do ponto de vista do banco, a venda das agências permitiu a desalavancagem do balanço. Em termos contábeis, o que era ativo imobilizado transformou-se em dinheiro em caixa.

Do ponto de vista do investidor, os primeiros dias com o novo papel em seu portfólio não foram animadores. Cada uma das cotas foi comprada por clientes do banco por R$ 103,70 na oferta encerrada em 30 de dezembro. Na quarta, o CXAG11 começou a ser negociado a R$ 97 às 10h quando o pregão abriu e, uma hora mais tarde, havia derretido para R$ 77 (-25,74%). O ativo fechou a sexta-feira cotado em R$ 77,97.

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A Caixa nega que tenha prejudicado seus próprios correntistas e defende que a forte queda na primeira semana do ano, quando o volume de negociações é tradicionalmente baixo, não reflete a qualidade do ativo que, segundo a instituição, tem uma garantia de rentabilidade futura, com a promessa da Caixa de continuar como locatária das agências vendidas pelos próximos dez anos (prazo de locação dos contratos é de 120 meses).

A Bloomberg Línea conversou com três executivos do banco com conhecimento do assunto. A tese do banco é que se trata de um investimento de longo prazo e a eventual queda do valor do ativo agora não influencia a rentabilidade do produto para quem guardar o FII no portfólio.

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Segundo a Caixa, o CXAG11 tem um cap rate (taxa de retorno do investimento) de 7,6% ao ano e, pelo fato de ser isento de Imposto de Renda, é mais atrativo do que a maioria dos CDBs.

O que tem dentro do CXAG11

De acordo com os documentos públicos da oferta, 15 das 32 agências estão em cidades com menos de 200 mil habitantes, oito estão em cidades com entre 200 e 500 mil habitantes e os nove restantes estão em capitais ou cidades de região metropolitana (São Paulo, Rio, Porto Alegre e São Bernardo do Campo).

A média de idade dos imóveis é de 24 anos e meio: apenas cinco imóveis têm menos de 20 anos de construção, nove têm mais de 30 anos e dois têm mais de 40.

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De acordo com a Colliers, a empresa contratada para fazer a avaliação, 23 dos 32 imóveis foram catalogados como de liquidez “média-baixa” para locação (22) ou venda (23).

Interior da agência da Caixa em Capão da Canoa, litoral do RS

Isso significa que, em caso de uma decisão futura da Caixa de deixar de ser a locatária de um desses imóveis, o fundo pode encontrar dificuldades para encontrar um novo locatário ou comprador para o imóvel em função das características dos imóveis e da economia dos municípios onde eles se encontram. O prazo estimado pela Colliers para encontrar novos interessados nestes imóveis com baixa liquidez varia entre 12 e 24 meses.

Em que pese a prevalência das agências estarem bem localizadas em áreas centrais das cidades, fatores como imóveis com característica de ser monousuário com tamanho acima da média em cidades pequenas ou a necessidade de altos investimentos para adequar os prédios para uma atividade que não seja a bancária pesaram na avaliação de liquidez.

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Sobre a agência de Baependi (19.249 habitantes no sul de Minas), a empresa avaliadora escreveu: “Imóvel localizado em município com ausência de empresas de médio e grande porte, podendo dificultar sua absorção” – mesmo diagnóstico da também mineira Eloi Mendes (25.220 hab.).

Cinco agências do Estado de São Paulo – incluindo a da Brigadeiro Luiz Antônio, na Bela Visa, a de Atibaia, a de São Bernardo do Campo – fazem parte do grupo considerado com melhor liquidez, segundo a Colliers.

O banco insiste que permanecerá nos locais por pelo menos dez anos e cita a existência de uma cláusula que indeniza o fundo com valor parcial dos aluguéis a vencer, caso decida sair antes.

Conforme um dos executivos do banco que falou com a Bloomberg Línea, a visão é que cidades pequenas não representam necessariamente um risco maior já que a operação física é importante em municípios menores e que, geralmente, a Caixa é o agente financeiro de prefeituras e órgãos públicos.

Os clientes conheciam o risco?

Fundos de investimento imobiliário tiveram um boom no Brasil. Desde 2011, o número de investidores individuais comprados neste tipo de ativo saltou 40 vezes, especialmente a partir de 2019, quando a curva de juros tornou menos atrativa a renda fixa. O rendimento mensal dos FIIs é isento de Imposto de Renda.

Hoje, há 1,5 milhão de investidores em FIIs, mas a retomada de um ciclo de alta de Selic (taxa básica de juros) para combater a inflação tem provocado uma deterioração dos preços dos ativos imobiliários desde o ano passado.

Na verdade, a simplicidade do conceito de obter “renda passiva” com aluguel de imóveis contrasta com a complexidade desta classe de ativos, cuja precificação pode ser afetada por fatores macroeconômicos e por particularidades de ciclos de alta e baixa do próprio mercado imobiliário. A título de exemplo, o prospecto do CXAG11, protocolado na CVM (Comissão de Valores Imobiliários) tem 2.413 páginas.

Procurado pela Bloomberg Línea, o banco afirma que informou, adequadamente, aos seus clientes as características do produto oferecido, incluindo seus riscos. Segundo a Caixa, a distribuição obedeceu a regulamentação da CVM. O CXAG11 foi oferecido aos correntistas do banco tanto por meio do home broker quanto presencialmente, por gerentes nas agências.

A reportagem também procurou a RB Capital, a gestora do fundo imobiliário. Questionada sobre a queda brusca da cotação, a gestora disse que o objetivo é “auferir renda perene decorrente das locações, e ,não, via venda destes ativos no curto prazo.”

“A partir da análise de dados disponíveis e acessíveis ao mercado, notamos que a maior oscilação foi verificada no primeiro dia de negociação do fundo (05/01), sendo que o volume de cotas negociadas foi menor que 0,4% do número total de cotas do fundo. Não houve prejuízo incorrido pelo fundo. Apenas os cotistas que efetivamente venderam as suas cotas com deságio realizaram prejuízo”, disse a RB Capital, em nota.

Sobre a desvalorização da cota, a Oliveira Trust, também por meio de nota, disse: “A Oliveira Trust entende que a variação do valor de negociação das cotas é influenciada por inúmeras condições de mercado que, em sua essência, estão alheias à competência e ao limite da atuação da Oliveira Trust enquanto Administradora do Fundo”.

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Graciliano Rocha

Editor da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela UFMS. Foi correspondente internacional (2012-2015), cobriu Operação Lava Jato e foi um dos vencedores do Prêmio Petrobras de Jornalismo em 2018. É autor do livro "Irmã Dulce, a Santa dos Pobres" (Planeta), que figurou nas principais listas de best-sellers em 2019.