São Paulo — O Brasil tem uma carência tão grande de infraestrutura que as variações para cima ou para baixo do PIB (Produto Interno Bruto) para 2022 e 2023, previstas pelos agentes do mercado, acabam sendo pouco impactantes para as perspectivas do setor, que estrutura seus projetos com uma visão de longo prazo, avalia Ricardo Propheta, CEO da BRZ Investimentos, gestora independente com cerca de R$ 3 bilhões em ativos e 25 fundos, em entrevista à Bloomberg Línea.
O principal produto da gestora é um fundo que investe no Porto de Itapoá (SC), o BRZP11, que tem cerca de 4 mil investidores e valor de mercado de perto de R$ 375 milhões. Com 20 anos de história, a BRZ nasceu como um braço de investimento da GP. Atualmente, atua nas áreas de crédito e private equity, como foco no setores de infraestrutura, logística e agronegócio.
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“Para o investidor de linhas de transmissão de energia, praticamente não faz diferença o PIB do ano que vem, o consumo. Saneamento, também. A gente tem muita necessidade de investimento em saneamento. Se o Brasil crescer um pouco mais ou um pouco menos no ano que vem e nos anos subsequentes, a gente vai continuar com uma necessidade muito grande em saneamento. É muito provável que a gente continue vendo concessões e investimentos e bons retornos nesse setor”, exemplificou o especialista.
Ele também relativiza as previsões pessimistas para a economia de 2022, ano em que o brasileiros vão às urnas para a escolha de presidente, governador, senador e deputado estadual e federal, em outubro (primeiro turno no dia 2 e segundo turno no dia 20, se for o caso).
“O Brasil é um país em que a gente está acostumado a muita volatilidade política, econômica. Esses momentos de turbulência a gente está acostumado a viver. Isso não muda nossa cabeça, que é de longuíssimo prazo. Para 2022, a gente tem visto a possibilidade de encontrar grandes oportunidades de investimento justamente por uma eventual maior volatilidade do mercado, que acaba viabilizando maiores retornos para investimentos em equity de agronegócio, em equity de infraestrutura, em títulos de dívida etc. A gente tem olhado para 2022 como um potencial ano de grandes oportunidades”.
Na avaliação do gestor, os FIPs (Fundos de Investimento em Participações) de Infraestrutura, um das principais apostas da BRZ, ganharam relevância no mercado brasileiro na última década e devem buscar, no ano que vem, maior protagonismo na carteira dos investidores. Para a pessoa física, há o incentivo da isenção fiscal. O FIP é um investimento em renda variável constituído sob a forma de condomínio fechado, em que as cotas somente são resgatadas ao término de sua duração ou quando é deliberado em assembleia de cotistas a sua liquidação.
“Os FIPs de infraestrutura acabaram sofrendo muito ao longo deste ano, talvez por falta de compreensão dos investidores do risco subjacente a esses investimentos”, reconhece o executivo, acrescentando que esses fundos apresentam hoje um patamar interessante para entrada, uma oportunidade de retornos maiores no longo prazo.
Propheta vê, neste fim do ano, um movimento mais intenso de migração de investimentos de maior para menor risco no mercado. Grupos financeiros têm revisado projeções para os principais indicadores refletindo a piora do cenário macroeconômico (juros básicos subindo e se aproximando dos dois dígitos para conter as pressões inflacionárias, PIB indicando recessão técnica, o suspense sobre os rumos da política monetária nos EUA e na Europa, sinais de desaceleração chinesa e ameaças das novas variantes do coronavírus).
O gestor destaca que os grupos de infraestrutura contam hoje com mais opções de financiamento do que no passado, o que garante maior acesso a capitais para tirar projetos do papel e reduzir os gargalos do Brasil. “O setor ficava muito dependente do poder público para investimentos tanto em equities como em dívida. Esse panorama mudou drasticamento nos últimos 10 anos”, observa Propheta, lembrando que emissões de debêntures incentivadas e os FIPs, que investem nesses títulos, são hoje os principais veículos de financiamento de dívida e de equities da área.
As regras para os diversos segmentos da infraestrutura também melhoraram, reduzindo a insegurança jurídica que afugenta o ingresso de capital estrangeiro no setor, segundo o especialista. Neste ano, o país aprovou três marcos legais (BR do Mar, do transporte portuário interno, a chamada cabotagem, o do transporte rodoviário interestadual de passageiros e o das ferrovias), criando ambiente regulatório para a atração de investimentos.
O governo federal tem estimulado a transferência de ativos para a iniciativa privada. Em 2022, o Ministério da Infraestrutura espera realizar 50 leilões, com previsão de R$ 165 bilhões em investimentos, incluindo a concessão para a iniciativa privada de 14 rodovias, 18 aeroportos, 4 portos, um canal e 24 terminais.