Chile enfrenta saída de capital com modelo econômico fragilizado

Combinação de agitação social, planos de nova Constituição e eleições polarizadas abala a confiança dos chilenos na moeda

Eleições concentram atenções na América Latina
Por Valentina Fuentes e Daniel Cancel
15 de Dezembro, 2021 | 09:34 PM

Bloomberg — Por décadas, os chilenos assistiram de longe seus vizinhos sul-americanos lutarem contra a inflação galopante, crises financeiras e forte turbulência política, forças desestabilizadoras que levaram os ricos a enviarem centenas de bilhões de dólares para paraísos na Suíça, Ilhas Cayman ou Estados Unidos.

Mas agora, o país andino, que por muito tempo desfrutou da estabilidade, está sentindo o peso dessa turbulência. Uma combinação de agitação social, planos para uma nova Constituição e as eleições mais polarizadas na memória recente abala a confiança dos chilenos na moeda do país.

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O ritmo de saída de capital estrangeiro de pessoas físicas e empresas não financeiras se acelerou, tendo atingido US$ 8,8 bilhões nos seis meses até agosto e US$ 24,3 bilhões nos últimos dois anos, segundo dados do banco central. Isso equivale a mais de 9% do PIB anual.

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E, mesmo quando o dinheiro não está saindo do país, os poupadores têm convertido pesos em depósitos em dólares a um ritmo acelerado. Os saldos em conta corrente em moeda estrangeira quase triplicaram em 24 meses, para um recorde de US$ 1,6 bilhão em setembro.

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A aceleração ou redução das saídas de capital nos próximos anos pode ser parcialmente determinada pelas eleições presidenciais de domingo. Uma vitória do candidato de esquerda Gabriel Boric, que se comprometeu a aumentar os impostos, elevar os gastos para melhorar os serviços sociais e acabar com o sistema de pensões privado, pode aumentar ainda mais as saídas. Ou os ricos podem se consolar com a vitória do candidato conservador José Antonio Kast, que prometeu reforçar a confiança dos investidores e o Estado de direito.

  

Eleições polarizadas

Seja qual for o resultado, a estabilidade financeira do Chile já foi afetada, segundo vários gestores de patrimônio entrevistados em Santiago. E a redação de uma nova Constituição e sua votação em 2022 é tão arriscada quanto as próprias eleições.

“Sem dúvida, houve danos institucionais nos últimos dois anos, e a incerteza gerada continuará nos próximos anos, independentemente do resultado das eleições”, disse Klaus Kaempfe, diretor de soluções de portfólio da Credicorp Capital. “A crescente fuga de capitais é um reflexo de tudo isso.”

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Além das crescentes demandas por gastos sociais para reduzir a pobreza, a polarização das eleições e uma nova Carta Magna que poderia minar o modelo de mercado livre do Chile, parlamentares aprovaram saques de cerca de US$ 50 bilhões da previdência privada durante a pandemia. Isso obrigou gestores de ativos a liquidarem grandes posições em títulos públicos em moeda local e corporativos e levou o banco central a intervir como comprador para impulsionar o mercado.

É uma mudança radical em relação às políticas econômicas liberais que começaram sob a ditadura de Augusto Pinochet, que capacitou uma geração de economistas chilenos formados na Universidade de Chicago para a formulação de políticas. As receitas dos chamados Chicago Boys resistiram à chegada da democracia, o que criou a nação mais rica da América Latina.

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Mas essa estabilidade agora parece ameaçada. A bolsa chilena mostra queda de 11% desde que protestos violentos dominaram as ruas há dois anos, com cidadãos exigindo melhores condições econômicas para todos. A moeda chilena se desvalorizou quase 16% somente neste ano, queda intensificada pelas saídas de capital.

Manifestantes agitam bandeiras durante um protesto na Plaza Italia em Santiago, Chile, em 18 de outubro de 2020.Fotógrafo: Cristóbal Olivares / Bloomberg

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