Cotistas de fundo imobiliário estão furiosos com gestora em grupos no Telegram

Gestora REC anunciou nova emissão de cotas de FII logístico com preço 26% abaixo do valor patrimonial

Quarta emissão do Rec Logística, um fundo imobiliário, detonou onda de críticas de cotistas na internet
01 de Dezembro, 2021 | 01:50 PM

Bloomberg Línea — Desde sexta-feira (28), grupos de Telegram e fóruns de investidores de fundos imobiliários brasileiros estão em chamas por causa da quarta emissão do REC Logística (RELG11), com uma subscrição anunciada 26% menor do que o valor patrimonial dos galpões e centros de distribuição que estão dentro do ativo.

No dia 11 de novembro, a REC Real Estate, uma gestora sediada em São Paulo, anunciou que faria a quarta emissão de cotas com o objetivo de captar R$ 150 milhões para comprar galpões logísticos em Camaçari e Simões Filho, na região metropolitana de Salvador. Segundo o documento protocolado pela gestora na CVM, seriam emitidas 1,56 milhão de cotas ao preço de R$ 95,84.

PUBLICIDADE

Na sexta-feira, a gestora rerratificou a emissão – isto é, ela corrigiu o valor da subscrição, mas ratificou a informação da nova emissão do RELG11. O valor foi reduzido de R$ 95,84 para R$ 70,31. Para manter a meta de arrecadação em R$ 150 milhões, a quantidade de emissão saltou de 1,56 milhão para 2,13 milhões. O período para confirmar participação na emissão é de 3 a 15 de dezembro. A liquidação dos valores ocorre no dia 16.

Veja mais: Quando a sua carteira de fundos imobiliários vai parar de afundar?

Os críticos alegam que o movimento da gestora destruiu boa parte do patrimônio dos seus cotistas, derrubando o preço patrimonial dos imóveis da carteira de R$ 95 por cota para cerca de R$ 78.

PUBLICIDADE

Num universo de 1,5 milhão de investidores em fundos imobiliários no Brasil, o RELG11 tem o tamanho diminuto de 4100 cotistas e patrimônio de 127 milhões (valor de mercado R$ 93 milhões), mas o barulho que ele causa na internet reflete um mal-estar do pequeno investidor com uma onda de emissões caras em muitos ativos, ocorridas em 2020 e 2021, cujo custo chegava a 3%. O custo anunciado da emissão do RELG11 é de 4,4% – o que também alimenta a insatisfação.

Um analista da indústria de FIIs, que conversou com a Bloomberg Línea em condição de ter o nome preservado por não ter autorização para falar publicamente, comparou o movimento da REC nesta emissão ao de “alguém que vai num velório e apronta”.

O RELG 11, que chegou a valer R$ 119,65 em dezembro de 2020, despencou para R$ 69,54 na segunda – valor mais baixo em 52 semanas. Hoje o está sendo negociado a R$ 70.

PUBLICIDADE

A analogia do clima de velório refere-se ao estado atual da indústria de FIIs no Brasil, uma classe de ativos que atraiu centenas de milhares de pequenos investidores por ano enquanto os juros estavam baixos. Com a alta da Selic este ano, as cotas da maioria dos fundos começaram a se desvalorizar com força. O IFIX, índice de referência, também patina em seu ponto mais baixo desde o ano passado.

Veja mais: Madero já emitiu ações para receber aporte de R$ 300 milhões

Não é assunto da alçada da CVM: a emissão de cotas com valor abaixo do patrimônio faz parte do poder discricionário do gestor e não contraria o regulamento do RELG11, que prevê a possibilidade de ajuste com base no valor de mercado.

PUBLICIDADE

A REC Real Estate foi procurada na tarde desta terça (30) e informou que não se pronunciaria por encontrar-se em período de silêncio determinado pela CVM. A Bloomberg Línea apurou, com base uma pessoa com conhecimento do caso, que a tese de investimento da gestora é que perdas no curto prazo agora, com a redução do valor patrimonial, poderiam ser compensadas nos próximos meses, com a valorização dos ativos comprados.

Num fato relevante de 10 de novembro sobre um dos ativos-alvo, um galpão em Camaçari, a transação foi descrita como estando “em linha com a estratégia do Fundo de buscar maior diversificação de ativos e locatários”.

Leia também:

Por que tantos aviões privados caem no Brasil

O que as disputas do Nubank contra os bancos ensinam sobre concorrência no Brasil

Graciliano Rocha

Editor da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela UFMS. Foi correspondente internacional (2012-2015), cobriu Operação Lava Jato e foi um dos vencedores do Prêmio Petrobras de Jornalismo em 2018. É autor do livro "Irmã Dulce, a Santa dos Pobres" (Planeta), que figurou nas principais listas de best-sellers em 2019.