O que significam as regras do mercado de carbono criadas na COP-26

Depois de seis anos de muito debate e negociação, foram dadas as diretrizes para os novos negócios nesse segmento. Quais os impactos para o mundo, empresas e países?

Um dos resultados da COP-26 foi estabelecer premissas básicas para a negociação dos créditos de compensação
Por Ewa Krukowska
13 de Novembro, 2021 | 07:07 PM

Bloomberg — Depois de seis anos e discussões que se estenderam madrugadas a dentro, um acordo foi finalmente fechado sobre as regras que regem o comércio global de compensações. Os detalhes são misteriosos e complicados, mas preparamos um breve resumo do que essas regras significam para o planeta, empresas e países.

#1 Como isso esfria o planeta?

Um dos maiores desafios na luta contra as mudanças climáticas é o custo. Os mercados de carbono podem ajudar a reduzir a conta, atrair investimentos em inovação limpa nos países em desenvolvimento e acelerar os cortes de emissões. O acordo em Glasgow estabeleceu as regras para o comércio de emissões em acordos bilaterais e em um mercado supervisionado pelas Nações Unidas. Segundo algumas estimativas, esse mercado pode valer US$ 100 bilhões.

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A ideia é essa: países onde é difícil ou caro cortar os gases do efeito estufa podem comprar créditos que representam reduções de emissões de nações que já reduziram a poluição mais do que prometeram. Também existe a possibilidade de instituições públicas e empresas privadas investirem em projetos de redução de emissões em países em desenvolvimento, onde os custos costumam ser menores. Esses projetos, como substituir carvão por energia renovável, por exemplo, gerariam créditos que poderiam ser comercializados posteriormente.

“O acordo de hoje sobre o Artigo 6 fornece as regras necessárias para um mercado de carbono robusto, transparente e responsável”, disse Kelley Kizzier, vice-presidente para o clima global do Fundo de Defesa Ambiental e ex-negociador.

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#2 Por que as regras são uma melhoria?

O Acordo de Paris já preparou o caminho para o uso dos mercados, mas foram necessárias disposições técnicas detalhadas para que o novo mecanismo começasse a operar. A decisão da COP-26 cria padrões unificados e controlados internacionalmente e inclui disposições para evitar uma situação em que as mesmas reduções de emissões sejam reivindicadas por várias empresas ou países.

O acordo também pode trazer transparência e rigor aos mercados voluntários de carbono que estão crescendo de forma desordenada em todo o mundo, deixando espaço para abusos. Compensações de baixa qualidade, ou reduções de emissões contadas duas vezes, fazem pouco pelo planeta e podem até atrapalhar a luta contra as mudanças climáticas.

A demanda está crescendo por compensações. Mais créditos mudaram de mãos nos primeiros oito meses deste ano do que em todo o ano de 2020, de acordo com a BloombergNEF, à medida que empresas e governos gastam bilhões de dólares para cumprir suas metas de emissão zero.

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Há também um elemento que transformará o novo mecanismo de mercado de carbono das Nações Unidas em algo mais do que apenas um programa de compensação. Segundo o acordo, 2% dos créditos de carbono recém-emitidos serão cancelados, um movimento que se traduz em cortes de emissões.

#3 Como os países podem usar isso?

Os países já estão negociando emissões em acordos bilaterais, mas agora todas essas trocas estarão sujeitas aos mesmos padrões. Até agora, cabia a cada governo decidir sobre o rigor. O primeiro negócio de carbono sob o Acordo de Paris foi assinado em outubro de 2020 entre o Peru e a Suíça e recebeu elogios de ativistas ambientais por seu projeto. A Suíça investirá no programa “Tuki Wasi” no Peru, que ajuda famílias em áreas remotas a comprar fogões com eficiência energética. Isso evita o desmatamento e reduz o carbono graças ao aumento da biomassa.

#4 Como as empresas usam isso?

As empresas estão ansiosas para usar compensações para enfeitar suas credenciais verdes ou como uma oportunidade de tornar mais barato atingir seus objetivos. Embora nem todos os países permitam que os créditos importados sejam usados para seus próprios objetivos climáticos, há programas setoriais que dependem deles.

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Um exemplo é um sistema de compensação global para companhias aéreas, conhecido como CORSIA. Lá, as companhias aéreas precisam enviar créditos de redução de emissões para compensar qualquer aumento nas descargas de CO2 acima dos níveis de 2020. O acordo de Glasgow tornará o programa CORSIA mais rígido, de acordo com Laurent Donceel, diretor sênior de políticas da associação da indústria de Linhas Aéreas para a Europa.

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“Este é um esclarecimento significativo na tomada de decisões de negócios das companhias aéreas”, disse ele. “Isso vai influenciar seus investimentos em combustíveis de aviação sustentáveis e a renovação de sua frota.”

#5 Existe alguma pegadinha?

Existem duas preocupações. Em primeiro lugar, os ativistas ambientais temem que o consentimento dos negociadores em permitir a transferência de alguns créditos do antigo mercado prejudique o rigor do novo programa. Quanto mais créditos houver, mais espaço de manobra para os poluidores. Carbon Market Watch chamou isso de “farsa” que diluirá o impacto positivo.

Em segundo lugar, embora o acordo estabeleça regras para evitar a contagem dupla de cortes de emissões, sua implementação exigirá exame minucioso. Não está claro se há uma capacidade de análise formal suficiente. “Essas serão as tarefas para a sociedade civil criar as normas e para os governos nacionais criarem as regulamentações para garantir que essas reivindicações de redução de emissões sejam devidamente responsabilizadas”, disse Kizzier.

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