Nova lei para precatórios derruba preços no mercado secundário

Ativo vinha sendo negociado a cerca de 90% do valor de face no primeiro semestre deste ano, e agora está perto de 60%

Mercado de precatórios vinha atraindo investidores em busca de retornos mais elevados em meio à queda na taxa de juros Selic, que chegou a 2% no ano passado
Por Cristiane Lucchesi
09 de Novembro, 2021 | 08:14 AM

Bloomberg — Os preços dos precatórios do governo federal do Brasil no mercado secundário caíram para menos de dois terços de seu valor de face por causa da proposta do presidente Jair Bolsonaro de parcelar pagamentos.

O ativo vinha sendo negociado a cerca de 90% do valor de face no primeiro semestre deste ano, e agora está perto de 60%, de acordo com executivos de bancos e gestoras de fundos que negociam a dívida.

“O mercado começou a achar que precatório era título do Tesouro comum, e agora muitos podem se machucar”, disse Rafael Fritsch, diretor de investimentos para fundos de ativos problemáticos da Canvas Capital, uma gestora com sede em São Paulo que tem participação do Credit Suisse.

O mercado de precatórios vinha atraindo investidores em busca de retornos mais elevados em meio à queda na taxa de juros Selic, que chegou a 2% no ano passado. O governo vinha fazendo os pagamentos dentro do prazo correto desde 2010, atraindo novatos ao mercado, incluindo fundos multimercado, pessoas físicas ricas e bancos de médio porte, o que levou os preços a bater recordes de alta.

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Os investidores globais também vinham comprando os ativos com a ajuda de bancos como o Bank of America, que negocia precatórios de valores superiores a R$ 50 milhões desde 2008 e é um dos participantes mais ativos.

O Morgan Stanley está entre os bancos que estruturam os chamados “total-return swaps”, um derivativo que dá aos investidores internacionais o mesmo ganho que eles teriam comprando o precatório no Brasil sem ter que abrir uma conta no mercado local. Agora, o banco, com sede em Nova York, está procurando contratar um executivo para expandir seus negócios de crédito estruturado e situações especiais no Brasil, disse Tiago Pessoa, chefe de trading de ações e sales e trading de renda fixa para a América Latina do Morgan Stanley.

A negociação no mercado secundário deu um salto com o projeto de Bolsonaro “porque alguns investidores internacionais detentores de grande quantidade de ativos estão tentando encontrar uma saída, preocupados com o câmbio, a questão fiscal, a prorrogação de pagamentos”, disse Guilherme Ferreira, sócio da Jive Investments, com sede em São Paulo, a maior gestora de ativos problemáticos da América Latina. “Estamos vendo oportunidades de compra agora e mais virão no ano que vem, com certeza”, disse Ferreira, cuja empresa administra mais de R$ 8 bilhões.

Guilherme FerreiraFotógrafo: Leandro Martins/Jive

A proposta do governo visa limitar os pagamentos provenientes de decisões judiciais no próximo ano a cerca de R$ 44 bilhões, em comparação com os cerca de R$ 89 bilhões devidos, segundo a legislação atual. O dinheiro economizado seria usado para aumentar as transferências de dinheiro para os pobres, uma estratégia que poderia ajudar a aumentar a popularidade do presidente em ano eleitoral. A proposta foi aprovada em primeiro turno na madrugada de quinta-feira na Câmara dos Deputados.

De acordo com o projeto de lei proposto, os investidores poderiam receber parte do parcelamento nos próximos anos corrigido pela Selic ou aceitar desconto de 40% do valor de face. Pela legislação atual, a maior parte dos pagamentos está atrelada ao índice de inflação, IPCA, mais uma taxa de juros semelhante à da caderneta de poupança, que hoje é superior à Selic. Já que a proposta de Bolsonaro mudaria a constituição, ela precisa passar por uma segunda votação na Câmara e, em seguida, por dois turnos de votação no Senado.

“É difícil determinar um preço de mercado correto antes que a regra seja totalmente aprovada”, disse Fritsch, da Canvas Capital, que tem R$ 4,5 bilhões em ativos problemáticos sob gestão. Ele disse que não comprou nenhum precatório quando o ativo estava sendo negociado a 90% do valor de face porque considerou o preço muito alto. Fritsch estimou que o volume no mercado secundário representa de 10% a 20% do estoque total.

Andre Suguita, chefe de situações especiais para a América Latina do Bank of America, disse que alguns clientes estão ficando “curiosos”. Eles estão tentando verificar “se há alguém tentando vender a qualquer preço; mas, dada a incerteza, a opção foi esperar”, disse Suguita. “Mesmo aqueles que enfrentam perdas de marcação a mercado agora podem se recuperar se tiverem paciência para manter o ativo até o vencimento.”

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