Bloomberg Opinion — O histórico das conferências para o clima das Nações Unidas está repleto de falhas. Até aí, tudo bem. Se uma reunião pudesse resolver todos os problemas de prevenção do aquecimento global catastrófico, não haveria necessidade de qualquer ação adicional.
Essa é a melhor maneira de pensar sobre o resultado decepcionante das negociações entre o Grupo das 20 maiores economias antes da cúpula do clima em Glasgow esta semana. O relatório dos participantes não fez uma promessa firme de eliminar o carvão, uma das principais metas dos negociadores do Reino Unido. Os compromissos com a redução das emissões de metano também não constavam no comunicado final, e a data em que o mundo atingirá o zero líquido foi estimada em “por volta da metade do século”, em vez de 2050, e outras expressões foram suavizadas ou removidas.
Isso não parece ser um bom presságio para o que virá na próxima quinzena – mas nem tudo está perdido (ainda).
Por um lado, conseguir um acordo do G-20 não é apenas uma degustação antes do principal banquete de diplomacia. Todas as grandes economias importantes que dificultarão um acordo em Glasgow também participaram das negociações em Roma. Os membros do G-20 abrangem os maiores exportadores de combustíveis fósseis, como Rússia, Arábia Saudita e Austrália; grandes consumidores, como China, Estados Unidos e Índia; nações ricas como Japão e França; e países relativamente pobres, como a Indonésia e o Brasil. Com as negociações reais ainda por vir, cada lado mantém segredo sobre suas jogadas.
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Pensar no processo como um jogo é uma maneira útil de ver o que está acontecendo. Dentro da teoria dos jogos – uma forma amplamente usada de analisar assuntos globais – o paradoxo clássico do dilema do prisioneiro demonstra que a melhor estratégia dos indivíduos é delatar seus colegas e deixar todas as partes em uma situação pior. Isso é preocupante – mas se você jogar repetidamente, uma coisa estranha acontece: os benefícios de cooperar para proporcionar um resultado mutuamente benéfico começam a aumentar, porque os malfeitores sofrem danos à reputação e são evitados por seus pares.
Essa é essencialmente a estrutura que as Conferências das Partes da ONU, como a COP26 em Glasgow, estão replicando. Espera-se que as reuniões individuais sejam insuficientes. Por isso, o Acordo de Paris de 2015 inclui um “mecanismo de catraca”, segundo o qual os países continuam aumentando a ambição de suas metas climáticas a cada cinco anos (as expectativas estão altas para a COP26 exatamente porque é a primeira volta da catraca desde o acordo).
Não ajuda muito o fato de que o sucesso desses eventos muitas vezes depende das habilidades diplomáticas de seus governos anfitriões. Isso não é motivo para otimismo, considerando a forma como o Reino Unido passou cinco anos alienando seus maiores parceiros comerciais e atualmente passa por uma disputa com a França sobre os direitos de pesca com analogias ao conflito das Malvinas de 1982.
É inevitável termos algumas decepções. Mesmo se as frotas de carvão da China e da Índia fechassem nas próximas duas décadas por falência devido a energias renováveis mais baratas, é improvável que os líderes das nações se comprometam a tanto neste estágio. Mesmo o Acordo de Paris – agora lembrado como um marco de sucesso da diplomacia climática – foi considerado por muitos na época como um declínio, graças à aceitação tardia de que todos os 197 estados membros nunca iriam concordar com um tratado legalmente vinculante como o Protocolo de Kyoto ou o Protocolo de Montreal sobre produtos químicos prejudiciais à camada de ozônio.
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A conferência de Paris não trouxe grandes mudanças, afirmou Benjamin Sporton, então presidente-executivo da World Coal Association, ao Financial Times após o evento. Ele estava redondamente enganado: o consumo de carvão está agora cerca de 10% abaixo do que a Agência Internacional de Energia acreditava que seria na época, e suas projeções de longo prazo mudaram de um quadro de crescimento interminável da demanda para um em que o consumo já havia atingido o pico no momento do anúncio de Sporton.
As próximas semanas provavelmente trarão muitas decepções e recriminações. O tempo restante para enfrentar a crise climática diminui a cada reunião, e não podemos perder nenhuma oportunidade de melhorar a perspectiva. Longe das salas de conferência, no entanto, uma história mais importante está se desenrolando: uma revolução nos sistemas de energia que impulsionaram o mundo desde a revolução industrial. Um acordo mais forte certamente aceleraria o processo – mas a ausência de um acordo não será suficiente para revertê-lo.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
David Fickling é colunista da Bloomberg Opinion que cobre commodities, indústrias e empresas de bens de consumo. Foi repórter da Bloomberg News, Dow Jones, Wall Street Journal, Financial Times e The Guardian.
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