Bloomberg — A última briga diplomática da Turquia rendeu ao mercado internacional de câmbio um novo motivo para vender a lira turca, que chegou a recuar quase 2% no início dos negócios desta segunda-feira na Ásia, em meio a pouca liquidez.
Já sob pressão após um corte de juros maior do que o esperado na semana passada, a moeda turca teve um novo movimento de venda depois que o presidente Recep Tayyip Erdogan disse, no sábado, que os embaixadores de 10 nações estrangeiras não eram mais bem-vindos no país.
A lira era negociada a 9,7239 unidades por dólar, com baixa de 1,19%, pouco antes das 4h em Istambul (22h em Brasília).
“Se se tornar oficial e esses 10 embaixadores forem declarados persona non grata, isso vai destruir a lira”, disse Haydar Acun, sócio-gerente da Marmara Capital, em Istambul. “Parece um movimento político para aumentar a tensão internacional e aumentar as avaliações das pesquisas”.
Popularidade de Erdogan
Erdogan há muito tenta se posicionar como um baluarte de seu país contra potências estrangeiras hostis, como forma de obter apoio dos eleitores mais nacionalistas.
Seu apelo para expulsar os enviados de países como EUA, Alemanha e França por exigirem a libertação de um importante crítico do governo coincide com pesquisas de opinião que sugerem que sua base de apoio está diminuindo à medida que o custo de vida aumenta no país.
O risco é que sua retórica acabe agravando o cenário econômico frágil no pais.
“Sua decisão provavelmente aumentará a pressão de venda sobre a lira, o que terá consequências negativas para a inflação”, disse Piotr Matys, analista de câmbio sênior da InTouch Capital Markets em Londres.
A moeda perdeu 23% de seu valor em relação ao dólar este ano, no pior desempenho nos mercados emergentes. A volatilidade implícita da lira em um mês subiu na sexta-feira para o patamar mais alto desde maio.
Filantropo Preso
Os ataques diplomáticos anteriores da Turquia a outros países - especialmente os EUA - afetaram os ativos locais, incluindo a lira, levando a grandes oscilações nos mercados. O país sofreu uma crise monetária em 2018 em meio a debate sobre o destino de um pastor americano que estava preso no país.
Uma autoridade dos EUA disse que o governo está ciente dos relatórios vindos da Turquia e está buscando esclarecimentos do Ministério das Relações Exteriores em Ancara.
A última crise diplomática gira em torno do empresário e filantropo Osman Kavala, que está preso há quatro anos no país, em um caso que se tornou um teste da independência do Judiciário e do Estado de Direito aos olhos de alguns governos estrangeiros.
A briga coloca Erdogan em uma posição embaraçosa apenas uma semana antes da cúpula do Grupo dos 20 países ocorrer em Roma, onde o presidente turco espera se encontrar com o presidente dos EUA, Joe Biden.
Nenhuma reunião foi confirmada ainda e uma nova crise diplomática sobre os embaixadores - caso eles sejam expulsos - dificilmente tornará mais fácil para Erdogan obter o tempo necessário para negociar uma solução para alguns dos problemas anteriores que assolavam as relações entre os dois países.
Erdogan quer fazer lobby com Biden para permitir que Ancara compre dezenas de aviões de guerra americanos, em uma tentativa de superar a resistência de Washington a grandes negócios de armas com seu país após a compra de aviões de defesa aérea russos.
Conversa nacionalista
Os investidores se acostumaram à retórica nacionalista de Erdogan, que muitas vezes para antes de desencadear uma crise diplomática mais grave.
No entanto, os mercados locais estão provavelmente mais vulneráveis agora, já que o investimento estrangeiro em títulos e ações turcos caiu para novas mínimas. Eles detêm menos de 5% da dívida do governo em moeda local, ante quase 30% em 2013, e os investidores locais podem ser mais sensíveis às oscilações do clima político.
Ainda assim, os últimos comentários de Erdogan não incomodarão os investidores estrangeiros tanto quanto as recentes mudanças nas taxas de juros, disse Hasnain Malik, chefe de pesquisa da Tellimer Research em Dubai.
“Quase 20% de inflação e uma taxa de juros real negativa são os problemas reais, não a política externa da Turquia”, disse Malik.
--Com assistência de Selcan Hacaoglu e Jennifer Jacobs.
(atualizado às 22h com últimas cotações)
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