Bloomberg — Por décadas, o Mercado Central de Seul, com lojas acanhadas e barracas de comida, foi ponto de encontro de aposentados em busca de refeições, roupas e utensílios baratos.
Atualmente, eles disputam espaço com jovens descolados que frequentam restaurantes e cafés chiques. Chefs aspirantes e pequenos empresários — muitos dos quais optaram pela carreira solo após desistirem de empregos nos grandes conglomerados familiares da Coreia do Sul, como Samsung Electronics - estão por trás do aumento dos aluguéis e da transformação da região em campo de batalha entre gerações.
Os mais velhos argumentam que os jovens estão relativamente bem graças ao trabalho árduo e frugalidade daqueles que impulsionaram a ascensão do país após a guerra. O outro lado culpa a geração anterior por tornar a casa própria um sonho impossível e colocar a sociedade em uma eterna disputa por poder e dinheiro, retratada em sucessos como a série “Round 6” e o filme “Parasita”, ganhador do Oscar.
A chamada geração MZ, formada pelos Millennials na casa dos 30 anos e a Geração Z com cerca de 20 anos, crê que as divisões sociais e econômicas estão piorando. Alguns MZs se consideram a “geração desistente” e chamam o país de “Inferno Joseon”, em referência à dinastia que reinou na península por meio milênio.
As lealdades tradicionais parecem estar se desgastando antes da eleição em março para substituir o presidente Moon Jae-in, de 68 anos. Seu mandato foi marcado por polêmicas diversas, incluindo o encarecimento dos aluguéis, o favoritismo institucionalizado, casos de assédio sexual de mulheres e serviço militar obrigatório para os homens. Tanto o Partido Democrata de esquerda de Moon quanto a oposição conservadora adotaram slogans populistas para conquistar os insatisfeitos.
A Coreia do Sul tem 16,7% da população vivendo na pobreza, a quarta maior taxa entre os 38 países integrantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A nação tem também a maior diferença salarial entre homens e mulheres, em 32,5%.
Os preços das residências na região metropolitana de Seul — onde vive metade da população de quase 52 milhões de habitantes — dobraram nos últimos cinco anos, se sobrepondo ao aumento de 20% nos salários. A taxa de desemprego geral está em cerca de 4%, porém é mais que o dobro disso para quem tem menos de 30 anos.
Essas tensões foram detalhadas em filmes como “Parasita”, que conta a história de membros de uma família pobre que tentam conquistar empregos em uma família rica exagerando suas qualificações e fingindo que não são parentes, e a série “Round 6”, que acompanha mais de 400 pessoas altamente endividadas que, para diversão de alguns super-ricos, disputam jogos mortais na esperança de ganhar uma fortuna.
Eleitores mais jovens que ajudaram Moon a desbancar seu antecessor conservador Park Geun-hye em meio a um escândalo de corrupção estão mais frustrados, vendo que Moon não foi capaz de diminuir as disparidades. Moon é personagem emblemático da geração que fez faculdade na década de 1980, se rebelou contra o governo autoritário, trouxe eleições democráticas e passou a dominar a sociedade coreana.
O ex-ativista de direitos humanos prometeu erradicar as relações íntimas entre o governo e os poderosos conglomerados conhecidos como chaebols. No entanto, as reformas corporativas de Moon estagnaram e seu governo também foi alvo de escândalos de abuso de poder.
As controvérsias desgastaram o apoio que o Partido Democrata gozava entre os jovens, que passaram a se entusiasmar com a oposição de direita, rebatizada Partido do Poder Popular. Uma pesquisa da Realmeter divulgada na semana passada mostrou que o PPP tinha preferência dos sul-coreanos na faixa de 20 e 30 anos, como também da base tradicional de eleitores da faixa de 60 e 70 anos.
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