São Paulo — Os empreendedores do turismo de luxo no Brasil estão otimistas com a retomada gradual do mercado, com a reabertura dos destinos domésticos e com a volta dos voos internacionais, neste segundo semestre, após um longo período de restrições impostas pela pandemia da Covid-19. Só que, a exemplo de outros setores da economia, o caminho da recuperação das vendas de pacotes enfrenta obstáculos, como uma escassez de serviços, aumento dos custos e incertezas sobre o tempo necessário para a normalização das rotinas e atividades.
O último trimestre deste ano será a prova de fogo para esse nicho diante das expectativas do retorno dos viajantes a destinos badalados, como Estados Unidos e países da Europa. O mercado doméstico deve seguir aquecido, já que muitas famílias com crianças e adolescentes ainda resistem a correr o risco de sair do país. Faltando menos de três meses para a virada do ano, já está difícil planejar o Réveillon em refúgios paradisíacos, como o arquipélago de Fernando de Noronha (PE) e os balneários da Bahia, como as praias de Trancoso.
A Bloomberg Línea ouviu duas empresas que atuam no mercado do turismo de luxo no Brasil, a Matueté, agência produtora de viagens, e a Teresa Perez Tours, operadora de viagens personalizadas, sobre as perspectivas do segmento para o fim do ano e 2022.
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Gabriela Figueiredo, sócia e diretora da Matueté
BL: Quais as expectativas para o turismo de luxo para o fim do ano no Brasil?
GF: A demanda estava reprimida e voltou com força total. A gente ainda vai ter bastante movimento para o Brasil, embora a oferta de hospedagem de luxo no país já esteja quase esgotado. Os bons hotéis, os bons resorts, e os destinos mais especiais já estão completamente lotados. Hoje, se você quiser ir para Fernando de Noronha, você consegue só para a segunda quinzena de janeiro de 2022. De agora até lá, não tem mais disponibilidade nas principais pousadas.
BL: E os preços?
GF: Os preços estão altos, reajustes bem acima da inflação nos destinos badalados. A gente vê em Trancoso [litoral baiano] pousadas fazendo reajustes de 30% a 40%, algumas até extrapolando isso, aproveitando um pouco a onda da demanda.
BL: Com a volta dos voos internacionais, você acha que o turismo doméstico se mantém em 2022?
GF: Para alguns destinos, se mantém. Alguns deles vão ainda surfar a onda do turismo doméstico em 2022, porque foram quase que redescobertos por esse tipo de viajante, e aí gera uma segunda onda de pessoas que vão querer conhecer aqueles lugares, gente que não conseguiu ir para os Lençóis Maranhenses, um destino que explodiu neste ano, vai programar uma viagem para 2022 com mais antecedência, mais organizada para conseguir conhecer. Muito gente foi, viram no Instagram, acharam maravilhoso, querem ir.
É o impacto da divulgação dessas viagens que aconteceram principalmente em 2021, na temporada, que desperta o desejo de quem ainda não conhece esses destinos. Vejo uma boa temporada para Lençóis Maranhenses em 2022, uma boa temporada também para Pantanal, Amazônia, no começo do ano, quando ainda haverá pessoas inseguras talvez de encarar uma viagem internacional com a família. Agora, de 2023 em diante, quem sabe não se consiga recuperar o movimento receptivo, que está ainda muito devagar porque os estrangeiros não estão ainda vindo para o Brasil.
BL: Você vê algum destino em baixa?
GF: Em baixa, talvez alguns destinos que foram usados como quarentena, talvez haja uma saturação. Ninguém vai querer voltar para o México de novo, que foi usada como escala para se chegar aos EUA, seja para levar um filho para estudar ou porque se tem uma propriedade na Flórida, um apartamento em Nova York. Mas já se passou um ano e meio. No ano passado, só dava para ir para o México e o Egito. Talvez esses dois destinos sofram alguma baixa em 2022.
BL: Quais são hoje as dificuldades enfrentadas pelo turismo de luxo?
GF: Está muito difícil voar. A oferta aérea ainda está bastante restrita. A maioria das passagens que emitimos é em classe executiva. A disponibilidade está indo embora. Os voos estão muito cheios, principalmente em vésperas de feriados. Não tem mais disponibilidade em classe executiva em voos São Paulo-Europa. Não tem mais passagem em classe executiva.
Os países ainda estão se adaptando aos protocolos. Há ainda muitos países que exigem testes e quarentena. Na Suíça, por exemplo, o viajante tem de fazer teste a cada dois dias para poder entrar em um restaurante. Os turistas não estão preparados, por mais que a gente avise que o minibar do hotel está vazio, que tem de reservar restaurante com muita antecedência, porque há restrições no salão. Mudou a experiência de viagem, e muitos ficam desapontados.
BL: E os turistas de alta renda ainda estão procurando alugar ilhas?
GF: A gente teve o boom dos lugares isolados, esse desejo da exclusividade total, em maio do ano passado. À medida que a vacinação foi avançando, essa busca por refúgios exclusivos acabou sendo substituída pelo desejo de viagens mais ousadas, de voltar aos centros urbanos.
Assim que começaram a circular imagens da Europa, do Mediterrâneo no verão, todo mundo alegre na praia, sem máscaras, o desejo que despontou aqui foi de acompanhar esse movimento, de ir para os grandes centros urbanos, aproveitar os restaurantes, a vida de cidade que aqui ainda estava um pouco restrita.
Nos meses de maior isolamento e restrições, tivemos nosso portfólio de casas de aluguel, teve uma demanda altíssima, foi a grande estrela da pandemia, pois permitiam que o viajante tivesse o mínimo de contato com pessoas externas. Para o Réveillon, nosso público deve preferir ir a uma praia paradisíaca, fazer uma festona ao ar livre, convidar seu núcleo de amigos de 50 a 60 pessoas. O destino principal para fazer celebrações em ilhas é Angra dos Reis (RJ).
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Tomas Perez, CEO da Teresa Perez Tours
BL: Mais países estão autorizando a entrada de brasileiros. Que destinos internacionais estão em alta para o último trimestre do ano?
TP: Com o anúncio de reaberturas na Europa, os brasileiros começam a retomar o interesse pelas viagens ao continente. Lugares como Espanha, França, Suíça e Portugal são os líderes na preferência. Destacamos também a vontade que muitos estão de esquiar e os principais resorts de ski, principalmente da Suíça e da França, têm ótima procura para a temporada que começa no final de novembro. A expectativa é grande também para os Estados Unidos, que anunciaram que voltam a receber brasileiros vacinados em novembro.
BL: Que destinos domésticos estão em alta para esse público de perfil mais exigente?
TP: Nos últimos tempos houve um olhar diferente para os destinos brasileiros e tudo que a gente tem de mais especial. Novos investimentos do setor hoteleiro, serviços e experiências inéditas. As praias do Nordeste nunca saíram do radar, são preferência nacional, mas destinos de natureza preservada, longe do litoral também ganharam destaque. Posso citar a Chapada dos Veadeiros, os Cânions do Rio Grande do Sul, o Pantanal e os Lençóis Maranhenses como lugares que caíram no gosto do brasileiro durante a pandemia.
BL: Com um litoral marcado por arquipélagos, o Brasil aparece com duas ilhas para alugar, segundo a publicação internacional Private Islands: em Angra dos Reis e na Bahia. Há demandas nesse sentido?
TP: Há demanda, sim. A Ilha do Japão, que é particular em Angra dos Reis, ótima para famílias ou grupo de amigos, é um desses produtos que surgiu com força e viu aumentar a procura dos nossos clientes.
BL: A Braztoa (Associação Brasileira das Operadoras de Turismo) identificou dois destinos internacionais com alta de vendas de pacotes: Tulum (México) e Egito. Vocês perceberam a maior procura?
TP: Durante a pandemia, o México foi o país recordista em receber brasileiros. Isso porque o destino sempre esteve com suas fronteiras abertas e tem ótimos hotéis nas suas regiões de praia - Tulum, Los Cabos, Riviera Maya como um todo. Outro motivo que fez do México um sucesso foi que era o lugar ideal para fazer a quarentena antes de entrar nos Estados Unidos. Então houve um boom de procura.
O Egito, também, sempre foi um destino que os brasileiros gostam muito e sua reabertura precoce alimentou o desejo não apenas pelas preciosidades do Cairo, mas também pelos cruzeiros pelo Rio Nilo. Um diferencial também é que no momento que esses lugares anunciam que estão reabrindo a atenção aos seus atrativos cresce, mas no início acaba sendo mais tranquilo visitá-los, tudo ainda está vazio, sem filas ou grandes aglomerações.
BL: Como anda a demanda por pacotes exclusivos?
TP: O nosso trabalho consiste em realizar viagens personalizadas. É assim desde o início, em 1991. Hoje, essa atenção às viagens personalizada ganhou uma demanda e importância ainda maiores, pelas variações de protocolos de entrada e estadia em cada lugar. As pessoas têm em mente como é fundamental ter um consultor dedicado antes, durante e depois da viagem. Então, quem nos procura é justamente por esse perfil de serviços, que inclui um trabalho consistente de consultoria, no qual são identificados os interesses, desejos e estilos de vida de cada cliente.
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