Bloomberg — Os números são esmagadores: até o final de abril do ano passado, menos da metade das mulheres no Brasil estava empregada, o menor nível em 30 anos.
Na Austrália, mais ou menos na mesma época, quase um décimo das mulheres havia saído do mercado de trabalho, enquanto no Japão elas perderam seus empregos em ritmo quase duas vezes maior do que os homens. Em março, a vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, considerou o êxodo uma “emergência nacional”, já que 3,5 milhões de mães de crianças em idade escolar no país deixaram seus empregos entre março e abril de 2020.
“Não se pode ser um país próspero com metade da força de trabalho à margem”, disse Titan Alon, professor assistente de economia da Universidade da Califórnia, San Diego.
As forças que empurraram as mulheres para fora do mercado de trabalho global são muito semelhantes entre os países: fechamento de escolas, de creches e ensino remoto. E o malabarismo que se seguiu entre emprego e cuidados obrigou alguns pais a reduzirem as horas de trabalho ou deixarem seus empregos. As mulheres, que em média recebem menos do que os homens, acabaram arcando com o peso e abandonaram a força de trabalho com mais frequência do que os parceiros. Além disso, mulheres também tinham maior probabilidade de trabalhar em setores mais afetados pela pandemia.
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“Como não tínhamos uma infraestrutura de cuidado, tudo foi pior para as mulheres e para a participação delas na força de trabalho”, disse Wendy Chun-Hoon, diretora do Escritório de Mulheres do Departamento de Trabalho dos Estados Unidos.
A crise do cuidado infantil tem causado uma desigualdade de gênero na força de trabalho há décadas. A pandemia - que alguns economistas chamaram de a primeira recessão feminina nos EUA - piorou muito o quadro. De acordo com a Oxfam, a pandemia resultou em uma perda de renda para as mulheres de pelo menos US$ 800 bilhões globalmente em 2020, “equivalente a mais do que o PIB combinado de 98 países”. Quando se trata de crescimento econômico, pesquisa da Bloomberg Economics estima que, se a participação da força de trabalho e a educação das mulheres fossem iguais às dos homens em 2050, US$ 20 trilhões - quase o tamanho do PIB anual dos EUA - seriam adicionados à economia global.
No Brasil
Em uma região que ainda enfrenta um dos maiores níveis de desigualdade de gênero na participação da força de trabalho, a pandemia levou o Brasil a uma nova mínima histórica. Menos da metade das mulheres no país continuava empregada - 46,3% contra 65,5% dos homens - no início da pandemia, o menor número em três décadas.
Mais de 25% das mulheres que deixaram o mercado de trabalho no ano passado citaram o cuidado da família como principal motivo, segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Cerca de 66% das mulheres ainda desempregadas no país dizem que não podem voltar ao mercado de trabalho imediatamente pelo mesmo motivo, em comparação com apenas 7% dos homens, disse Livia Gouvêa Gomes, economista do BID.
A América Latina registrou o mais longo fechamento de escolas do mundo. Mesmo em São Paulo, onde as escolas começaram a reabrir em abril, aulas presenciais são limitadas para cumprir medidas de distanciamento social. Além das 207 mil crianças matriculadas que seguem em casa na cidade de São Paulo devido ao fechamento parcial das escolas e creches, outras 2,6 mil não haviam conseguido vaga em creches públicas até março. A prefeitura de São Paulo prometeu criar mais 50 mil vagas para creches nos próximos quatro anos. Enquanto isso, as mães que precisam manter os filhos em casa recebem pagamentos diretos de R$ 200 por mês.
É improvável que o governo de Jair Bolsonaro promova reformas a longo prazo para o cuidado infantil. Bolsonaro chegou a defender o trabalho infantil, destacando que começou a trabalhar quando tinha 12 anos. Uma investigação recente revelou que o governo não usou um terço do orçamento destinado a programas para mulheres. - Augusta Saraiva e Maria Eloisa Capurro
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