Opinión - Bloomberg

Emma Raducanu Inc. é o próximo unicórnio do tênis

O que a vitória da britânica de 18 anos no US Open deixou claro é que estamos vendo uma atleta que transcende seu esporte

Nova estrela do tênis pode não ter uma empresa, mas os paralelos são muito claros.
Tempo de leitura: 5 minutos

Bloomberg Opinion — Os fãs de tênis foram apresentados ao poder e à personalidade de Emma Raducanu, de 18 anos, durante seu impressionante desempenho em Wimbledon este ano. Mas foi sua vitória no US Open no último sábado (11) que transformou a britânica nascida em Toronto em uma atleta que transcende seu esporte – você a assiste e deseja saber mais sobre ela, e ela faz até você comprar uma raquete. Prepare-se para a Emma Raducanu Inc.

O quanto essa vitória é importante? Perguntei a Michel Masquelier, ex-presidente da IMG Media, parte da gigante global de gestão esportiva. “É o melhor que pode acontecer”, diz. “O tênis é um esporte genuinamente internacional, mas também é um esporte individual, então qualquer indivíduo que brilhe nas quadras é instantaneamente reconhecível. Você vê o rosto desse atleta mais que no futebol, na Fórmula 1 ou no golfe”.

Além de seu título de campeã, Raducanu tem outros multiplicadores de força para impulsionar o sucesso de personalidades e o sucesso comercial. Ela tem sua reputação internacional: filha de uma chinesa com um romeno, ela cresceu na Grã Bretanha e obteve fama nos EUA. Ela tem a juventude e a grandeza dos recordes que quebrou: ela é o primeiro jogador, entre homens e mulheres, a vencer um Grand Slam vindo das rodadas de qualificação. Ela fez isso sem perder um set.

Em seguida, ela teve um desempenho espetacular nas finais; seus pais não puderam estar presentes. Ela também contou com o apoio do ex-astro britânico que virou comentarista, Tim Henman. Não podemos esquecer de sua simpatia espontânea e seu comportamento que diz “pode vir”.

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Tudo isso torna Emma Raducanu uma raridade até mesmo nos esportes de elite – ela é um unicórnio. Essas figuras são diferentes não apenas por dominar seu esporte, mas por alterar seu entorno. Mas, como os unicórnios do mundo da tecnologia bem sabem, esse não é um caminho fácil. Um potencial tão grande, um crescimento tão rápido e uma adulação tão fervorosa podem ser difíceis de manter e administrar.

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É difícil exagerar o impacto que ela teve na Grã Bretanha – país com uma cultura esportiva feroz que anseia e embala um campeão. O Amazon Prime tinha os direitos de licenciamento do US Open, mas o Channel 4 (emissora estatal, mas amplamente financiada comercialmente) se apressou para garantir os direitos de sublicenciamento de última hora do Prime Video na noite de sexta-feira (10), proporcionando incríveis 9,2 milhões de espectadores para o jogo. Esse valor foi equivalente a 48% dos jovens de 16 a 34 anos do país que estavam assistindo televisão.

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Com gastos de patrocínio global estimados em cerca de US$ 65,8 bilhões por ano, vendas de roupas, negócios para televisão e mais, as oportunidades de monetização serão enormes, principalmente se Raducanu cumprir sua promessa de atrair mais espectadores e jogadores para o mundo do tênis feminino. Essa é uma grande oportunidade para a Women’s Tennis Association (WTA).

“Em 35 anos neste setor, eu teria de voltar aos dias de Tiger Woods para pensar em algo semelhante”, diz Masquelier, que acaba de publicar um livro motivacional com base em suas experiências. Woods também era um unicórnio, não apenas por conta de suas sublimes habilidades no golfe, mas também por sua postura, personalidade e formação multiétnica, que trouxe novos públicos, patrocínios e jogadores para o golfe.

Já é difícil imaginar o torneio feminino sem Raducanu. As finais da temporada do WTA serão disputadas em Guadalajara, no México, em novembro. Apenas as oito melhores jogadoras do mundo se qualificam. Raducanu está agora em 23º lugar (um salto de 127 posições em relação a algumas semanas atrás). Se ela não conseguir chegar aos oito primeiros lugares, quanta atenção isso vai atrair? Quantos fãs de outros esportes, exceto o tênis, assistirão às partidas?

Raducanu e outras de sua geração (incluindo outra estrela, a finalista Leylah Fernandez, de 19 anos) podem ficar em evidência por um tempo, desde que possam evitar lesões. Serena Williams ganhou seu 22º título de Grand Slam em Wimbledon aos 34 anos; Martina Navratilova conquistou o título de Wimbledon aos 33 anos e dobrou o número de títulos aos 40 anos. Com boa saúde, Raducanu pode ter no mínimo 15 anos de competições de alto nível pela frente. São possivelmente 60 chances de obter títulos de Grand Slam e competir em vários outros eventos.

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Os unicórnios, no entanto, nunca param de inovar. Depois de processar a magnitude de sua conquista, o objetivo de Raducanu será aumentar sua participação no mercado (ou seja, mais vitórias e melhores classificações) e continuar trabalhando em seu jogo. Contudo, o desafio – assim como em qualquer unicórnio de tecnologia – é motivar o crescimento ao mesmo tempo em que se controla as despesas. No caso de Raducanu, isso significa controlar o tempo e a energia que ela tem para se dedicar às muitas demandas de fora das quadras, que já estão chegando. Ela precisa aprender o poder da palavra “não”.

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As perguntas inevitáveis já começaram a aparecer. Quanto tempo vai demorar para ela chegar ao topo dos rankings mundiais? Onde será sua próxima partida? Quais acordos de patrocínio fechará? Em quantas capas de revista sairá? Em quais programas de entrevista irá?

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Até agora, Raducanu parecia imune à pressão – mas ela é humana. Os anais do tênis, assim como o mundo das startups, estão cheios de jovens estrelas deslumbrantes que perderam seu brilho. A luta pública de Naomi Osaka, de 23 anos, com problemas de saúde mental após sua dramática vitória no US Open em 2018 é o mais recente alerta sobre o assunto. Raducanu vai se tornar adulta enquanto todo o mundo assiste.

Obviamente, ela terá obstáculos. Mesmo assim, ela projeta uma autoconfiança que faz muitos pensarem que ela tem tudo sob controle (como nenhuma pessoa de 18 anos faz, ela entregou seu smartphone durante o torneio). Finalmente liberada de uma interminável série de obrigações com a mídia para ver os pontos turísticos de Nova York na segunda-feira (13), ela avistou um outdoor gigante com sua própria expressão extasiada ao conquistar a vitória. Há um brilho em torno de seu perfil; as palavras Just do it pairam acima do logotipo familiar. Ela compartilhou a foto nas redes sociais, claramente encantada.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Therese Raphael é colunista da Bloomberg Opinion. Ela foi editora da página editorial do Wall Street Journal Europe.

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