São Paulo — Desinvestimento. Uma das expressões mais usadas pelos governos para definir estratégia de privatizações também é uma dor-de-cabeça para a maioria das empresas. No Brasil, 95% das companhias reconhecem que demoraram mais do que o necessário para vender ativos de seu portfólio, segundo estudo divulgado pela Agência EY.
A situação se repete na maioria dos países do mundo. A pesquisa, que contou com a participação de 1.040 executivos internacionais entre janeiro e março deste ano mostra que 78% das companhias globais também tiveram a mesma dificuldade. E os problemas com os desinvestimentos não se resumem a questões de timing. O estudo global mostra que as empresas que vendem ativos estão falhando também em atender expectativas de preço do ativo vendido e nos múltiplos de valuation do negócio remanescente (a chamada RemainCo).
Na avaliação da consultoria, a pandemia reforçou a urgência de as empresas considerarem desinvestimentos para resolver as necessidades de liquidez e liberar capital para investir. Depois de mais de um século no Brasil, a Ford anunciou no início do ano o fim da produção de veículos no país. A decisão afetou as fábricas de Camaçari (BA), Taubaté (SP) e Horizonte (CE), mas a montadora segue com sua operação de vendas e assistência técnica, focando em produtos importados. Em março, o supermercadista Assaí, segunda maior varejista do comércio alimentar no país, foi cindida do Grupo Pão de Açúcar para atuar de forma autônoma.
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Segundo Fabio Schmitt, sócio da área de estratégia e transações da EY, as decisões de desinvestimento são sempre “escolhas complexas”, que levam tempo e que esbarram na dificuldade dos gestores de convencer os acionistas e demais stakeholders a repensarem estratégias antigas de negócio. A dificuldade aumenta ainda mais se o ativo alvo de desinvestimento tiver sinergias importantes com os demais negócios do grupo.
“O case ainda é muito fortemente impactado pelo negócio que tem mau desempenho. Em vez de olhar a estratégia, espero o negócio entrar em um ciclo de mau desempenho e aí decido desinvestir. Por esse motivo, 74% dos entrevistados dizem que o desinvestimento não atingiu a expectativa de valorização do resultado. Se eu tivesse refinado minha estratégia, olhado meu portfólio com mais frequência, provavelmente teria decidido pelo desinvestimento no tempo certo”, disse.
Schmitt afirma que a forma reativa de decidir por vender um negócio de mau desempenho faz com que muitas empresas não saibam direito como reinvestir os recursos obtidos, preferindo aplicar em tecnologia, novas geografias e expansão geral do negócio.
“No momento que eu entendo que aquele ativo não está recebendo capital necessário para se manter rentável e decido que talvez ele seja muito bem-sucedido na mão de um outro dono, é um negócio muito bom. E talvez eu possa usar os proventos desse desinvestimento para investir naquela tecnologia, naqueles mercados ou produtos novos que preciso desenvolver. Ou até mesmo usar o desinvestimento para fazer uma aquisição”, disse.
No Brasil, 86% das empresas que participaram da pesquisa afirmaram que pretendem fazer desinvestimentos nos próximos 24 meses. “Pensar em desinvestimento deveria ser um processo constante da empresa”, afirma. “Ninguém desinveste para ficar menor. Desinveste para crescer. Se tenho um negócio que não faz parte da minha estratégia futura, o desinvestimento é uma maneira de eu tirá-lo do meu portfólio e colocá-lo nas mãos de alguém que está focado naquele negócio”, disse.
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