Gráficos explicam os efeitos da MP da venda direta de etanol para postos

Spoiler: mudança agrada usineiros do Nordeste, ações da BR Distribuidora caem, mas queda do preço final ao consumidor é incerta, segundo Bolsonaro

Bolsonaro e os ministros da Agricultura, Tereza Cristina, da Casa Civil, Ciro Nogueira, de Minas e Energia, Bento Albuquerque, e da Economia, Paulo Guedes, assinam MP sobre venda direta de etanol
11 de Agosto, 2021 | 03:21 PM

São Paulo — A Medida Provisória que libera a venda direta de etanol hidratado por produtores a postos de combustíveis, assinada nesta quarta-feira (11) pelo presidente Jair Bolsonaro, flexibiliza o modelo de comercialização do combustível no país, abrindo a possibilidade de maior concorrência no setor e de redução de preços do produto ao consumidor final.

O essencial da MP:

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  • O produtor ou o importador poderá vender o etanol diretamente para o posto de revenda de combustíveis. Antes, era proibido. Entre usineiros e donos de postos, existia a intermediação obrigatória das distribuidoras
  • Postos “bandeirados”, que exibem a marca comercial de um distribuidor, poderão comercializar combustível de outros fornecedores, desde que o consumidor final seja informado
São Paulo, o maior produtor do país, foi responsável por 14,4 milhões de m³ de etanol em 2021

POR QUE ISSO É IMPORTANTE: O objetivo declarado do Ministério de Minas e Energia é que a MP incentive o aumento da concorrência com a abertura do setor e, consequentemente, se consiga reduzir os preços do combustível ao consumidor final. Os frequentes reajustes dos combustíveis têm pressionado os custos de empresas e consumidores, ameaçando as metas de inflação e levado a uma sequência de altas dos juros básicos da economia, a taxa Selic (hoje em 5,25% ao ano, após quatro elevações).

“Com a Medida Provisória, nós temos um novo modelo de comercialização de etanol hidratado no país, com a possibilidade da venda direta”, disse o secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia, José Mauro Ferreira Coelho, durante a assinatura da MP.

MP NÃO GARANTE QUEDA NO PREÇO AO CONSUMIDOR: Antes de assinar a MP, Bolsonaro admitiu, durante discurso, que a iniciativa é insuficiente para garantir a redução dos preços ao consumidor final e voltou a cobrar dos governadores que zerem alíquotas de tributos estaduais que incidem sobre a gasolina, álcool, diesel e gás de cozinha.

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“Não basta isto daqui. Isto não é garantia que vai baixar o preço nominal para cada tipo de combustível”, disse o presidente. Ele afirmou ainda que governadores fazem “lobby” no Congresso para impedir perda de receita com a arrecadação de tributos estaduais e lembrou que seu governo já zerou tributos federais (PIS/Cofins) desses produtos.

As ações da BR Distribuidora enfrentavam queda superior a 3% no pregão de hoje. Para acompanhar em tempo real, clique aqui.

Ações da BR Distribuidora operam em queda superior a 3% no dia da assinatura da MP

CONTEXTO: A liberação da venda direta de etanol das usinas para os postos é encarada pelo setor muito mais como uma questão política do que técnica. Isso porque, os argumentos de ambos lados encontram justificativas econômicas que suportam cada uma das narrativas.

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No Brasil, quase 94% da produção de etanol sai de usinas do Centro-Sul e 7% das usinas do Norte-Nordeste. A tendência é que o impacto da medida aumente a concorrência direta de postos com empresas distribuidoras. A percepção de benefícios e problemas trazidos pela mudança é diferente.

Em princípio, as usinas do Centro-Sul, onde se concentra a maior parte dos produtores de etanol e açúcar do país e onde estão os maiores grupos empresariais do setor, defendem que a venda direta pode derrubar os preços do biocombustível no curto prazo. Sem uma estrutura de distribuição estabelecida, as usinas da região passariam a disputar o abastecimento dos postos em Estados onde a oferta já é maior do que a demanda, caso de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná e Minas Gerais. Levar o combustível de caminhão para postos de estados mais distantes dos centros de produção ou contratar as próprias distribuidoras para fazer esse serviço poderia inviabilizar o negócio.

Já as usinas do nordeste, defendem a venda direta. As empresas da região possuem uma característica de gestão mais familiar. Lá, a oferta e a demanda do combustível é mais equilibrada e a relação entre usinas e os donos dos postos de combustíveis é mais próxima.

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Por meio de nota o IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo) criticou a MP e afirma que ela vai desestruturar o setor e potencialmente fere o Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao dificultar que o comprador tenha dificuldade de saber a procedência do combustível que está comprando.

“Acreditamos que a proposta legislativa não traz benefícios em termos de preço e informação ao consumidor, mas aumenta os custos regulatórios e fiscais e cria uma desestruturação em um mercado bastante maduro e complexo”, disse a entidade, em nota.

E continuou: “No Brasil, os postos de combustíveis já têm a opção de ostentar ou não marcas comerciais de distribuidora. Os chamados postos “bandeira branca” representam cerca de 47% do mercado, o que mostra a competição entre os modelos.”

Produção de etanol no Brasil (por região)

O PARADOXO DO EMPRESÁRIO: O paradoxo pode ser resumido pelo exemplo do Grupo José Pessoa. Com uma unidade em Mato Grosso do Sul e outra em Sergipe, a empresa vive ao mesmo tempo a realidade dos dois lados da moeda. “Eu costumo dizer que sou contra e a favor da liberação, tudo depende de qual chapéu estou usando”, afirma José Pessoa Bisneto de Queiróz, presidente do grupo.

O empresário explica que em Mato Grosso do Sul, a produção estadual é cinco vezes maior do que o consumo. O excesso de oferta acaba sendo enviado, por meio das distribuidoras, para estados como Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Amazonas, Rondônia e Pará. “As distribuidoras já possuem uma infraestrutura com terminais de armazenagem e ramais ferroviários prontos para levar o etanol para regiões onde não não existe produção”, afirma.

Com o chapéu de Sergipe, no entanto, ele diz que a partir da unidade ele consegue abastecer o próprio Estado, que não é auto-suficiente, e outros, como a Bahia. “Dentro de um certo raio de viabilidade econômica, faz sentido vender diretamente para os postos”, explica.

Contudo, o empresário lembra que o mercado tende a se equilibrar, mesmo que isso traga desconfortos no curto prazo. Ele lembra que, em 1997, quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso acabou com a política de cotas e preços do etanol, os valores dos combustíveis despencaram de R$ 0,41 por litro para R$ 0,13.

Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 29 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.

Alexandre Inacio

Jornalista brasileiro, com mais de 20 anos de carreira, editor da Bloomberg Línea. Com passagens pela Gazeta Mercantil, Broadcast (Agência Estado) e Valor Econômico, também atuou como chefe de comunicação de multinacionais, órgãos públicos e como consultor de inteligência de mercado de commodities.