6 principais investidores de startups descrevem o que impulsiona o setor na América Latina

Participaram Hernan Kazah, da Kaszek; Sonya Huang, da Sequoia; Lombardi, da Kayyak; Pepe Bolaños, da Cometa; Lomelí, da 500 Startups; e Francisco Jardim, da SP Ventures

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Por Marcella McCarthy (Brasil)
10 de Agosto, 2021 | 04:06 PM

Miami — Não é nenhum segredo que a tecnologia e as startups estão crescendo na América Latina, com queridinhas como Nubank, Kavak, Rappi, Creditas, Loggi, NotCo e várias outras protagonizando o noticiário regularmente e muitas outras nascendo diariamente. No entanto, há não muito tempo, no início da pandemia, fundadores dessas empresas e investidores entraram em pânico, sem saber se suas companhias poderiam se adaptar e sobreviver, e sem saber se haveria capital disponível para sustentá-las caso suas receitas não fossem suficientes. Após o choque inicial no sistema, em muitos casos, clientes e empresas se alinharam: operar online era a melhor opção – e em muitos casos a única.

“Dizemos que a Covid-19 acelerou o futuro que as empresas de tecnologia vêm construindo. A diferença da América Latina é a poderosa mudança de comportamento associada à apresentação da economia digital para as pessoas pela primeira vez”, disse Sonya Huang, sócia da Sequoia.

Para a pesquisa a seguir, a Bloomberg Línea entrou em contato com investidores da região ou aqueles que investem nela para saber como veem o ecossistema de startups da América Latina hoje e para onde ele está indo. Publicaremos a pesquisa em duas partes. Na parte um, participaram os seguintes investidores:

Parte 1:

Hernan Kazah, sócio, Kaszek, Uruguay

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Sonya Huang, sócia, Sequoia, EUA

Cristóbal Silva Lombardi, sócio comanditado, Kayyak Ventures, Chile

Pepe Bolaños, sócio-gerente, Cometa, México

René Lomelí, sócio, 500 Startups Latin America, México

Francisco Jardim, sócio fundador, SP Ventures, Brasil

Hernan Kazah

Hernan Kazah, sócio, Kaszek, Argentina

Em quais setores você se concentra na América Latina (e em outras regiões)?

Não focamos em nenhum setor específico. Procuramos empresas nas quais a tecnologia tenha um papel relevante dentro do plano de negócios e com as vantagens competitivas que a empresa pretende desenvolver a partir dessa tecnologia. Dito isso, temos investido fortemente no setor de fintechs e comércio eletrônico, e vemos muitas oportunidades em saúde e educação. Nosso portfólio inclui empresas no setor de foodtech, proptech, biotecnologia, entre outros.

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Qual é o seu investimento mais recente e empolgante na região?

Todos os nossos investimentos são extremamente empolgantes. Nossos últimos investimentos incluem o Aplazo, uma solução de pagamento a prazo que está começando no México, e o 99minutos, uma solução de logística de last mile presente em vários países. Em ambos os casos, estamos muito entusiasmados com as equipes, que se mostraram extremamente brilhantes e resilientes, e com as oportunidades. A tração é incrível.

Para uma startup da América Latina, quais áreas estão supersaturadas ou apresentariam uma concorrência muito ferrenha neste momento? Quais outros tipos de produtos/serviços o preocupam ou o deixam desconfiado?

Em geral, não existe “supersaturação” no setor, pois bons empreendedores podem encontrar um novo ângulo para um setor “saturado” e criar uma grande oportunidade com isso. A BlackBerry saturou o mundo de celulares corporativos, e então a Apple, com um produto feito sob medida para o consumidor final, assumiu totalmente o controle. O setor de pesquisas estava claramente “saturado” com várias empresas de busca, e então o Google levou isso a um nível totalmente novo e levou a maior parte do mercado. Na América Latina em particular, pode-se dizer que o e-commerce está “saturado”, pois é provavelmente uma das indústrias de tecnologia “mais antigas”, já bem desenvolvida, mas existem os players “tradicionais”, como MercadoLibre, Magalu e Amazon, que continuam crescendo a taxas de três dígitos, e os novos players que continuam surgindo, como acontecia há alguns anos com aplicativos de entrega, e hoje acontece com o comércio social e por chat e vídeo, por exemplo. Todos esses são exemplos de formas inovadoras de comércio eletrônico. A penetração do comércio eletrônico ainda é baixa, e estamos no início do setor na América Latina. O mesmo poderia ser dito do setor de fintech, no qual a maioria das novas empresas foi criada e para onde vai a maior parte dos fundos de VC. Contudo, o setor é um universo próprio, com centenas de subsetores – e cada um desses subsetores pode ter muitos bilhões de dólares. Assim, juntamente com a Nubank, que é provavelmente a empresa de tecnologia mais incrível que surgiu na América Latina na última década, e vários outros grandes players, como Stone, PagSeguro, MercadoPago e XP, continuaremos a ver o surgimento de outras grandes empresas, como Creditas, CrediJusto, Konfio, Kushki e Bitso. Muitos desses novos players vão começar as operações nos próximos anos. A inclusão financeira é uma das grandes necessidades da região, e as empresas de tecnologia conseguem reduzir essa lacuna significativamente.

Como a Covid-19 afetou sua estratégia de investimento? Quais são as maiores preocupações dos fundadores de seu portfólio? Qual é o seu conselho para as startups em seu portfólio no momento?

A pandemia sem dúvida foi uma tragédia para todos, mas, dito isso, o processo de digitalização realmente acelerou, e estamos vendo coisas que esperávamos levar 5 anos para acontecer ocorrendo em alguns meses. No início da pandemia, nossa recomendação era que as empresas se tornassem o mais enxutas possível e adotassem uma mentalidade de guerra, o que permitiu que se tornassem muito mais eficientes em termos de caixa e, em alguns casos, até desenvolver fontes alternativas de receita.

Que momento proporcionou esperança no último mês? Pode ser no âmbito profissional, pessoal ou uma mistura dos dois.

A pandemia foi um grande desafio para todos, muitos sofreram com perdas irrecuperáveis, e algumas de nossas empresas sofreram muito com tudo. Porém todas conseguiram adaptar seus modelos de negócios e operações e sobreviveram à crise. As equipes mostraram sua resiliência e provaram ser de classe mundial. Nunca deixamos de enxergar como as equipes são incríveis e somos muito centrados nos fundadores – sempre investindo em equipes que acreditamos serem as melhores da categoria. No entanto, é sempre maravilhoso ser lembrado da qualidade das equipes no cotidiano.

Sonya Huang

Sonya Huang, sócia, Sequoia, EUA

Em quais setores você se concentra na América Latina (e em outras regiões)?

Enxergamos oportunidades em todas as categorias de fintech – serviços bancários de varejo, serviços bancários para PMEs, pagamentos, trading, investimento, criptomoedas, seguros e infraestrutura financeira. Também estamos com negócios realmente interessantes sendo criados nos setores de internet/marketplace – como comércio social, mercearia, atacado, entrega e e-commerce. Estamos dedicando nossos esforços nos setores de educação e saúde (telemedicina e seguro-saúde). Dito isso, as melhores ideias normalmente são inesperadas, e estamos com a mente aberta para todos os setores.

Qual é o seu investimento mais recente e empolgante na região?

Recentemente, lideramos uma rodada de investimentos de US$ 1 milhão na Pomelo, que está construindo uma plataforma moderna de emissão de cartões na América Latina. Nos EUA, se quiser emitir cartões, existem ótimas opções amigáveis para o desenvolvedor, como Stripe, Marqeta e Galileo, entre outros Isso não existe na América Latina – a emissora do cartão e o processamento são muito antiquados e detidos pelo banco Vemos a Pomelo como a empresa de infraestrutura financeira moderna que permitirá um boom de aplicações financeiras na América Latina.

Existem startups que você gostaria de ver na região? Quais oportunidades foram ignoradas até agora?

Temos acompanhado as mudanças regulatórias em relação à saúde e telemedicina na região e acreditamos que isso proporcionará novas oportunidades na área de saúde digital, que observamos de perto.

As fintechs tiveram um ano fenomenal até agora; que outros setores você imagina que se tornarão “aquecidos” na região no futuro?

Tudo relacionado ao comércio eletrônico: pagamentos, comércio social, marketplaces para atacado e entrega. Algumas dessas empresas na região têm um encaixe perfeito de seu produto no mercado atingiram a viralidade do consumidor, e estamos observando-as de perto.

Como o Covid-19 afetou sua estratégia de investimento? Quais são as maiores preocupações dos fundadores de seu portfólio? Qual é o seu conselho para as startups em seu portfólio no momento?

Dizemos que o COVID-19 acelerou o futuro que as empresas de tecnologia vêm construindo. A diferença da América Latina é a poderosa mudança de comportamento associada à apresentação da economia digital para as pessoas pela primeira vez. Os consumidores que costumavam desconfiar do comércio eletrônico e não tinham uma forma de pagamento digital agora estão percebendo os benefícios de participar da economia digital. Ainda há muito a ser feito, inclusive muitas conversões do ambiente off-line para o ambiente on-line.

Nosso conselho para os fundadores é aproveitar a abertura de mercado criada pelo Covid-19. Por exemplo, no ano passado, nossos fundadores nos EUA estavam preocupados em economizar dinheiro para sobreviver ao longo do ano. Agora, o foco é como operar ainda mais agressivamente e acelerar nas inovações.

Cristobal Silva

Cristóbal Silva Lombardi, sócio comanditado, Kayyak Ventures, Chile

Em quais setores você se concentra na América Latina (e em outras regiões)?

A pergunta abrangente que define nossos critérios de seleção é “essa empresa resolve os maiores desafios da atualidade?”. Empreendedores cujo objetivo é resolver a sustentabilidade ambiental – mudanças climáticas, segurança alimentar, escassez de água, desperdício, desigualdade de renda, falta de educação, acesso financeiro, acesso à saúde ou produtividade das PMEs – são de grande interesse para nós. Dentro dessas áreas, temos uma preferência por modelos de negócios B2B em vez de B2C e por fontes de receita recorrentes, como SaaS; o ideal é encontrar oportunidades que combinem esse modelo com fintech. Na América Latina, vemos um imenso espaço de criação de valor para melhorar as vidas das pessoas ao combinar tecnologia, motivação e talento de uma nova geração de empreendedores com a disponibilidade de capital de longo prazo.

Qual é o seu investimento mais recente e empolgante na região?

Estamos empolgados com todos os nossos investimentos. Recentemente, lideramos a rodada de investimentos-semente na Marco, plataforma de financiamento habilitada para tecnologia. A maioria dos exportadores de mercados emergentes não têm acesso ao crédito, e as instituições financeiras não estão equipadas para atendê-los. Os bancos costumam fazer com que os exportadores menores esperem cerca de 90 dias antes de rejeitar mais de 50% dos pedidos de financiamento. Isso inibe o crescimento e a geração de empregos. A Marco busca simplificar e acelerar o comércio internacional prestando um financiamento confiável para pequenos e médios exportadores na América Latina utilizando um modelo de risco inovador e exclusivo que processa dados em tempo real para avaliar o risco de forma dinâmica e mitigar a perda de capital. A Marco complementa outras empresas, como a 1DOC3, que diminui a lacuna de cuidados primários de saúde de milhões de latino-americanos; a Destácame, que ajuda pessoas de baixa renda a administrar suas finanças e ter acesso a produtos financeiros justos; a Xepelin, que presta financiamento da cadeia de suprimento a PMEs; a Migrante, que ajuda os migrantes a começar uma nova vida por meio do acesso à inclusão financeira ou a Agrourbana, que produz alimentos usando uma fração de terra e água em comparação às técnicas tradicionais de cultivo.

Existem startups que você gostaria de ver na região? Quais oportunidades foram ignoradas até agora?

O ecossistema de capital de risco da região recentemente começou a ganhar força, mas ainda não atingiu seu auge. Os fluxos de investimento estão concentrados principalmente no Brasil e no México, em fundadores com MBAs ou experiência em consultoria e negócios relacionados a fintech ou comércio eletrônico. No entanto, existem oportunidades maravilhosas fora dessas áreas. Por exemplo, acreditamos que a Argentina e o Chile possuem os melhores talentos em SaaS da região. Além disso, existem oportunidades atrativas na Agtech e na área de proteína alternativa para os investidores com um horizonte de tempo mais amplo. Por exemplo, lideramos a última rodada de financiamento da F4F: Food For the Future, que transforma resíduos orgânicos em proteínas de alta qualidade para alimentação animal por meio do cultivo de insetos. O Chile tem uma enorme indústria agrícola que fornece resíduos orgânicos, além de ter o maior produtor de salmão que precisa do produto para estar em conformidade com as exigências de ESG. Seus produtos têm uma pegada ambiental positiva, são negativos em carbono e podem substituir fontes não sustentáveis, como farinha de peixe e soja. Em geral, vemos uma oportunidade de longo prazo na “dissociação do crescimento”, isto é, dissociar a melhoria da qualidade de vida das pessoas do uso de recursos finitos (materiais, água, terra, emissões, fertilizantes etc.).

Para uma startup da América Latina, quais áreas estão supersaturadas ou apresentariam uma concorrência muito ferrenha neste momento? Quais outros tipos de produtos/serviços o preocupam ou o deixam desconfiado?

Não importa como você divide os dados, a América Latina continua com uma penetração insuficiente. Existem muitas oportunidades para construir modelos de negócios atrativos em diferentes setores, mesmo na área de pagamentos do Brasil, que tem sido um mercado aquecido. Contudo, investidores e empreendedores devem se lembrar que a América Latina sempre será uma região propensa a profundos ciclos de fluxo de capital. Devemos lembrar o que aconteceu com a economia brasileira e o mercado de ações do país alguns anos depois do artigo do The Economist intitulado Brazil takes off (O Brasil decola, em tradução livre) em novembro de 2009. Portanto, me preocupo com modelos de negócios com alta queima de caixa ou balanço patrimonial intensivo. Atualmente, o capital é abundante, mas isso não vai durar para sempre. Assim, em setores como entrega last mile, somos seletivos quanto aos segmentos da cadeia de valor nos quais focamos, visto que vemos o aumento das pressões nas margens.

As fintechs tiveram um ano fenomenal até agora; que outros setores você imagina que se tornarão “aquecidos” na região no futuro?

O mercado de proptech é um dos quais continuamos observando fluxo de capital. Os imóveis residenciais são a maior classe de ativos do mundo e o maior investimento financeiro individual da maioria das famílias. No entanto, a experiência de possuir, alugar ou hipotecar está completamente destruída na América Latina. Nem tudo pode ser resolvido com tecnologia e fundadores orientados ao objetivo. Além disso, essa é uma classe de ativos protegida contra a inflação ou mesmo dolarizada na maioria dos países da América Latina, permitindo a criação de modelos de negócios que protegem os investidores internacionais da desvalorização da moeda local.

Como o Covid-19 afetou sua estratégia de investimento? Quais são as maiores preocupações dos fundadores de seu portfólio? Qual é o seu conselho para as startups em seu portfólio no momento?

Em termos de tendências de digitalização, o Covid-19 foi como uma janela para o futuro, embora parte do impulso possa desacelerar um pouco depois que a pandemia diminuir; vemos isso como um fenômeno de longo prazo que não vai acabar. Pelos próximos 10 anos ainda teremos nosso primeiro fundo, e pelos próximos 50 ou 100 anos, ainda teremos nossa empresa; estamos lidando com o intenso movimento das placas tectônicas de nossa economia e sociedade; isso vai além do Covid-19. A esse respeito, vemos a digitalização e a sustentabilidade como forças motriz dessas mudanças.

Para as empresas do portfólio, o Covid-19 foi um teste de pressão para suas culturas. As pessoas estão sob uma pressão tremenda, que afeta a saúde mental das pessoas. Temo que a deterioração da saúde mental possa perdurar muito depois de a pandemia ter ficado mais branda. Os fundadores lutam para equilibrar a pressão de crescimento de um mercado cada vez mais competitivo enquanto cuidam de seus funcionários. Estamos aconselhando os fundadores a redobrar esforços e construir uma cultura voltada para um propósito que sirva como uma cola para resistir a este momento difícil e permitir que pensem a longo prazo.

Que momento proporcionou esperança no último mês? Pode ser no âmbito profissional, pessoal ou uma mistura dos dois.

Desde o início da pandemia, me preocupo com minha mãe, pois ela tem seus 70 anos e é fumante inveterada. Quando o Covid-19 começou, eu morava em São Francisco, no estado da Califórnia, e durante os últimos cinco anos tive a chance de voltar ao meu país natal apenas algumas vezes para vê-la. A esperança surgiu quando vi as instituições chilenas se coordenarem e agirem rapidamente para pedir as vacinas e começar a vacinação mais cedo e com mais eficiência do que várias outras nações desenvolvidas. O Chile passou por turbulências políticas e sociais recentemente, então essa foi uma constatação do potencial do que as pessoas podem realizar quando trabalhamos juntos rumo a um propósito sólido.

Pepe Bolaños

Pepe Bolaños, sócio-gerente, Cometa, México

Em quais setores você se concentra na América Latina (e em outras regiões)?

Como empresa, nosso foco principal é o modelo de negócios, não o setor em que a empresa atua: investimos em negócios operacionalmente leves, com foco em software.

Na última década que investi na região, devido às oportunidades (ou lacunas) no mercado, a minha empresa desenvolveu experiência investindo em companhias que capacitam o consumidor, em especial dentro do setor de fintech, mobilidade, cadeia de suprimento e comércio eletrônico. No futuro, continuaremos a investir nesses setores, embora principalmente com um foco maior em empresas B2B2C e B2B que visam melhorar a eficiência dos negócios nessas indústrias.

Por fim, também buscamos parcerias com fundadores utilizam tecnologia para inovar em setores até agora resistentes às mudanças, como educação, imóveis, saúde e seguros.

Qual é o seu investimento mais recente e empolgante na região?

Cada investimento que fazemos acreditamos ser o mais emocionante. A última empresa que apoiamos foi a Guros, insuretech mexicana e primeiro investimento da Cometa no setor.

Além da profunda experiência dos fundadores no setor, um dos principais motivos pelos quais a Guros foi a primeira insuretech em que investimos foi sua estratégia inovadora de entrada no mercado. A Guros digitalizou sistemas legados por meio de integrações tecnológicas com seguradoras líderes, permitindo o desenvolvimento de dois canais de distribuição exclusivos para complementar sua oferta B2C. Em primeiro lugar, a Guros oferece soluções de marca branca para seguradoras e, portanto, incorporou-se verticalmente às seguradoras tradicionais; ao se tornar seu próprio canal digital dessa forma, a Guros se tornou um fosso competitivo sólido.

Em segundo lugar, a empresa possui uma rede de parceiros comerciais que fornecem à empresa um canal de distribuição B2B2C. Por meio dessas alianças, a Guros está combinando o processo de contratação de um seguro com a correspondente aquisição do consumidor (como a compra de um carro), em vez de deixá-lo desvinculado da compra. Isso é essencial em um mercado no qual a educação e a conscientização sobre seguros são muito pequenas.

A Guros está simplificando o seguro tanto para o usuário final quanto para seus parceiros e removendo vários obstáculos que resultam na baixa satisfação do cliente no setor. Estamos otimistas de que a equipe irá catalisar a inovação em um setor que está atrasado nas mudanças.

Existem startups que você gostaria de ver na região? Quais oportunidades foram ignoradas até agora?

Estamos começando a ver startups em áreas onde antes havia um pipeline limitado, o que é muito encorajador. Alguns exemplos são empresas com produtos adequados ao mercado com formato B2B, modelos de negócios SaaS, startups que lidam com setores tradicionais (como saúde e educação) e startups pioneiras na América Latina (em vez de modelos imitadores). Queremos nos aprofundar nessas áreas e estamos otimistas quanto ao crescimento das oportunidades na região.

Para uma startup da América Latina, quais áreas estão supersaturadas ou apresentariam uma concorrência muito ferrenha neste momento? Quais outros tipos de produtos/serviços o preocupam ou o deixam desconfiado?

Os setores que já produziram grandes vencedores, como o de entrega de mantimentos ou marketplaces de comércio eletrônico, seriam difíceis de concorrer com novos participantes; atualmente, são um campo de batalha entre os incumbentes locais e internacionais. Em segundo lugar, as áreas que foram estimuladas pelo capital de risco nos últimos anos, por exemplo, o setor de neobanks e cartões corporativos, seriam áreas difíceis de iniciar um negócio hoje. Para alguns produtos, há custos de troca limitados para os clientes ou uma diferenciação entre os players; nesses casos, a quantia arrecadada torna-se um fosso competitivo ainda maior que o normal, e seria difícil para uma startup competir ali. No entanto, com uma combinação de uma equipe motivada e uma estratégia inovadora, acreditamos que podemos encontrar oportunidades em qualquer setor, especialmente em uma região que ainda tem pouca concorrência em termos comparativos.

No momento, estamos desconfiados de produtos que passaram por um crescimento explosivo durante a pandemia (como entrega last mile ou ensino à distância). Uma grande ênfase para nossa estratégia de investimento atual é analisar quais mudanças comportamentais se tornarão estruturais.

As fintechs tiveram um ano fenomenal até agora; que outros setores você imagina que se tornarão “aquecidos” na região no futuro?

As fintechs realmente tiveram um ano fenomenal, mas até agora, a maior parte do sucesso foi limitada às fintechs B2C. Acreditamos que as fintechs B2B e vários subsetores de fintech estão no início e, sem dúvida, se tornarão “aquecidos”, como o setor de insuretech e serviços bancários de middleware e infraestrutura (que se tornam facilitadores de negócios para outras empresas que desejam se tornar fintechs).

Conforme mencionado, estamos finalmente vendo empresas lidando com setores tradicionais, incluindo saúde, educação e imóveis. Já é possível notar um aumento nas negociações nessas áreas, e estamos animados com a inovação que isso pode trazer para a região, beneficiando, por fim, a população latino-americana.

Como o Covid-19 afetou sua estratégia de investimento? Quais são as maiores preocupações dos fundadores de seu portfólio? Qual é o seu conselho para as startups em seu portfólio no momento?

Felizmente, nosso foco em empresas de software significa que estávamos bem posicionados para prosperar no ambiente nativo digital gerado pela pandemia, juntamente com uma grande parte de nosso portfólio. O Covid-19 nos fez dobrar o foco em software ao analisar novas oportunidades e lucrar com os ventos favoráveis que a pandemia trouxe, como o trabalho remoto e o aumento da penetração digital na região. Por fim, o Covid-19 trouxe a inovação a novos setores, que de outra forma teriam evoluído mais lentamente, ampliando, portanto, o escopo de setores que se encaixam em nossa estratégia de investimento.

O conselho que damos aos fundadores de nosso portfólio é que aproveitem o capital que atualmente está disponível em nossos mercados. O ambiente de negócios atual se opõe ao do início da pandemia (quando o foco era diminuir a queima e encontrar capital provisório), e as empresas de nosso portfólio, que estão bem posicionadas após um ano de otimização de seus modelos de negócios, devem colher os frutos. Acreditamos que é o melhor momento da história de nossa região para os fundadores que atuam em nossos setores de interesse.

Que momento proporcionou esperança no último mês? Pode ser no âmbito profissional, pessoal ou uma mistura dos dois.

Depois de fazer isso nos últimos 10 anos e acreditar firmemente na oportunidade latino-americana, é muito gratificante ver que o ecossistema de capital de risco da região atingiu um ponto de inflexão. Nos últimos anos, a América Latina começou a receber atenção global tanto de investidores quanto de talentos.

A Bitso, empresa de portfólio que apoiamos pela primeira vez em 2016, é um exemplo perfeito disso. A exchange de criptomoedas mexicana se expandiu primeiro para a Argentina em 2019 e atualmente também está no Brasil e tem planos ambiciosos de crescimento para se tornar uma player regional. A empresa realizou uma rodada da Série B em 2020 e uma rodada da Série C apenas um semestre depois, em maio deste ano. A rodada incluiu investidores globais de renome internacional, como a Coatue, a Tiger Global e a Bond, e avaliou a empresa em mais de US$ 2 bilhões.

É bem registrado que, uma vez que uma região atinge uma massa crítica de unicórnios, a formação de novos unicórnios se torna exponencial. Conforme escrito por Alex Lazarow, amigo da Cometa, essa massa crítica começa a ter um efeito volante. Diversas empresas de sucesso (i) treinam talentos, com experiência em empresas de alto crescimento, (ii) retornam o capital para o ecossistema e atraem mais dinheiro e (iii) começam a formar máfias de startups que impulsionam todo o ecossistema.

A América Latina atingiu esse ponto de inflexão estruturalmente, e a pandemia acelerou a ruptura digital; acreditamos que essa combinação significa que é o melhor momento para ser um investidor ou fundador na região.

René Lomelí

René Lomelí, sócio, 500 Startups, México

Em quais setores você se concentra na América Latina (e em outras regiões)?

Na 500 Startups, somos agnósticos no setor, portanto, investimos em vários setores nos últimos 10 anos. Nossa equipe da América Latina está focada na América Latina de língua espanhola, investindo em fundadores que abordam oportunidades de negócios locais, regionais e internacionais. Nosso portfólio inclui empresas como a Konfio (Fintech, México), a Platzi (Edtech, Colômbia), a 99Minutos (Logística, México), a Ayenda (Hotelaria, Colômbia), a Conekta (Fintech, México) e mais de 200 outros investimentos na região.

Qual é o seu investimento mais recente e empolgante na região?

Investimos por meio de coortes de 10 empresas em média e investimentos-semente diretos. Nos últimos três meses, tivemos nossa coorte nº 13 com sete empresas, incluindo a Yana, a Contalink e a Instacash. Por outro lado, fizemos investimentos-semente, como na MonkeyFoods e na Plerk.

Existem startups que você gostaria de ver na região? Quais oportunidades foram ignoradas até agora?

Como gestores de fundos, é difícil prever, pois estamos sempre em busca de oportunidades de financiamento. Claro, trabalhamos muito para encontrar empresas em setores nos quais começamos a ver desafios a serem resolvidos e oportunidades. No entanto, nosso trabalho principal é encontrar fundadores incríveis, financiá-los e ajudá-los a prosperar. No final das contas, eles é que encontram ou criam as oportunidades.

Para uma startup da América Latina, quais áreas estão supersaturadas ou apresentariam uma concorrência muito ferrenha neste momento? Quais outros tipos de produtos/serviços o preocupam ou o deixam desconfiado?

Posso responder essa pergunta de muitas formas. Mas existem dois cenários diferentes nos quais vemos os fundadores indo para espaços muito lotados. Em primeiro lugar, começando uma empresa que copia uma startup bem-sucedida em outro lugar. Nesse caso, como fundador, você entende melhor a rapidez com a qual essa empresa chegará à sua região, se isso será um desafio como concorrente ou potencial adquirente, e a rapidez com a qual você deve chegar lá. Em segundo lugar, vimos fundadores replicando startups como Uber, Rappi, Cornershop etc. Mas eles começam em cidades menores devido à falta desses serviços no local em questão. Se os fundadores abrirem uma empresa nessa direção, eles devem verificar primeiro se o mercado é muito pequeno para eles ou se eles poderão se diferenciar o suficiente para concorrer com startups bem financiadas.

As fintechs tiveram um ano fenomenal até agora; que outros setores você imagina que se tornarão “aquecidos” na região no futuro?

As fintechs estão no topo há um tempo e continuarão sendo, e isso permitirá que outras indústrias deem o pontapé inicial. Alguns setores que recebem atenção dos fundadores na América Latina são os de educação, serviços e utilidades de RH, startups de trabalho remoto e saúde.

Como o Covid-19 afetou sua estratégia de investimento? Quais são as maiores preocupações dos fundadores de seu portfólio? Qual é o seu conselho para as startups em seu portfólio no momento?

Nossa estratégia de investimento não mudou muito. Como somos agnósticos no setor, conseguimos manter nosso ritmo de investimento durante a pandemia. Ao avaliar uma empresa, focamos em entender os efeitos do Covid-19 em seu setor e qual abordagem a startup adotou. Isso fez com que investíssemos em empresas de turismo, um dos setores mais afetados, como a GuruHotel em janeiro de 2021.

Estar bem financiado e ter dinheiro no banco para sustentar o crescimento e meses de caminhada é sempre uma das coisas que preocupa a maioria dos fundadores em empresas em estágio inicial, mesmo antes do Covid-19. É claro que, em março de 2020, essa era a principal preocupação de muitos fundadores, já que o investimento ficou mais lento. Agora, um ano depois, vimos fundadores sendo capazes de obter fundos e é possível até ler notícias semanais mostrando o que nunca vimos neste ritmo na América Latina em termos de investimento de capital na região.

Meu conselho para as startups agora é focar nos negócios e ter objetivos claros. Para mim, o foco é uma decisão binária que leva você ao seu objetivo ou o distrai de alcançá-lo.

Que momento proporcionou esperança no último mês? Pode ser no âmbito profissional, pessoal ou uma mistura dos dois.

No último mês, focamos no processo de seleção para o próximo lote, no qual selecionamos 10 empresas para investir. Elas farão parte do 14º lote de nosso programa “Somos Lucha”. Para nós da 500 Startups, é revigorante e verdadeiramente inspirador entrevistar fundadores de classe mundial na América Latina que estão abrindo novas empresas durante uma pandemia. É um bom lembrete do motivo pelo qual fazemos o que fazemos e também nos leva a continuar trabalhando duro para sermos os melhores sócios que os fundadores podem ter nesta fase.

Francisco Jardim

Francisco Jardim, sócio fundador, SP Ventures, Brasil

Em quais setores você se concentra na América Latina (e em outras regiões)?

Definimos nosso setor como agfood tech, que abrange duas grandes cadeias de valor:

A) Pecuária (proteína animal – gado, suínos, aves, aquicultura etc.)

B) Agricultura (grãos, culturas especiais, frutas/vegetais etc.)

Dentro dessas cadeias de valor, investimos do início ao fim ou, em outras palavras, apoiamos empreendedores que enfrentam problemas desde a porteira da fazenda até o consumidor final.

Qual é o seu investimento mais recente e empolgante na região?

É difícil dizer – a safra atual de empreendedores na América Latina é fantástica.

Os dois últimos investimentos foram na Aegro e na Frizata. A Aegro é a vencedora da corrida do sistema de gestão agrícola (FMS) da América Latina. Ela lidera não apenas a transformação digital da agricultura na região, mas uma verdadeira revolução na gestão. Conforme as tecnologias digitais possibilitam novos modelos de negócios, a Aegro experimenta algumas estratégias de monetização muito interessantes. Entre elas, utilizar o FMS como estratégia de aquisição de clientes e dados com uma economia unitária positiva, mas alavancando essa base com serviços financeiros. O fundador, Pedro Dusso, quer construir a futura indústria de serviços financeiros de alta tecnologia para agricultores.

A Frizata, por outro lado, está aproveitando um dos maiores inibidores da inovação para as grandes empresas: um modelo de distribuição legado. O modelo atual que as indústrias de alimentos usam para chegar aos consumidores é altamente ineficiente. Eles dependem de supermercados físicos, lojas de conveniência etc. O fluxo de informações dos consumidores para os processadores de alimentos é lento e imperfeito, dificultando difícil para as indústrias reagirem na velocidade que os clientes esperam na era digital. No entanto, as operadoras ainda dependem desses canais de distribuição e são incapazes de adotar uma estratégia direta ao consumidor. A Frizata envolve e fornece diretamente ao consumidor. Ela tem um ciclo muito mais rápido de desenvolvimento de produtos. É simplesmente um modelo de negócios superior habilitado pela tecnologia. Além disso, os fundadores são experientes, empreendedores da Endeavor que já construíram uma empresa de tecnologia panregional na América Latina.

Existem startups que você gostaria de ver na região? Quais oportunidades foram ignoradas até agora?

A região tem gargalos e peculiaridades muito específicas. Os empreendedores veem oportunidades onde os outros veem gargalos e problemas Pessoalmente, vejo o início e o movimento de inovação da agfood tech mais densa do mundo acontecendo na América Latina. Nossa melhor aposta para garantir a segurança alimentar global durante a transição para uma agricultura sustentável está com os empresários da América Latina.

Para uma startup da América Latina, quais áreas estão supersaturadas ou apresentariam uma concorrência muito ferrenha neste momento? Quais outros tipos de produtos/serviços o preocupam ou o deixam desconfiado?

Ainda estamos na ponta do iceberg; Eu realmente não vejo nenhum setor que está supersaturado. É possível argumentar que há uma enxurrada de empresas de proteínas alternativas, mas é um mercado tão novo e crescente que não é fácil dizer que não haverá mercado para todos.

As fintechs tiveram um ano fenomenal até agora; que outros setores você imagina que se tornarão “aquecidos” na região no futuro?

Além das fintechs, estamos muito animados com marketplaces, empresas biotecnologia (categoria de insumo que mais cresce no agro), entre outros. Também é possível destacar o setor de carbono. A agricultura e os mercados de carbono terão um relacionamento íntimo, e a agtech será um componente chave no esforço para salvar nosso planeta. As oportunidades explosivas de criação de valor vão surgir. As criptomoedas e o blockchain também terão um papel fundamental na rastreabilidade dos alimentos.

Como o Covid-19 afetou sua estratégia de investimento? Quais são as maiores preocupações dos fundadores de seu portfólio? Qual é o seu conselho para as startups em seu portfólio no momento?

Fomos bastante cautelosos quando a pandemia começou e seguimos as diretrizes gerais: cortar custos, aumentar a liquidez e aumentar as possibilidades. No entanto, após alguns meses, ficou claro que a agtech era resiliente ao ambiente de Covid-19. Na verdade, a maioria de nossas empresas teve desempenho superior graças à pandemia. A adoção digital acelerou brutalmente durante 2020. Nosso conselho para as startups é que elas estejam bem cientes das oportunidades que surgiram. Por exemplo, nosso setor (agronegócio) tinha uma longa tradição de participar de grandes feiras regionais. Só no Brasil eram dezenas delas. Eles foram vitrines importantes para lançamentos e vendas de novas tecnologias. Com o cancelamento desses eventos, os agricultores migraram para o comércio eletrônico e passaram pela alfabetização digital. Assim, a venda de software, hardware e outros produtos pela internet se tornou moda no setor de agtech. Há apenas alguns anos, vários líderes de “grandes ag” (multinacionais agrícolas estabelecidas) declararam abertamente que os agricultores nunca comprariam produtos pela internet. Gostei de ver que esses senhores estavam errados.

Que momento proporcionou esperança no último mês? Pode ser no âmbito profissional, pessoal ou uma mistura dos dois.

À medida que a América Latina aumenta as taxas de vacinação contra Covid-19, o comportamento muda, mas a adoção de tecnologia por conta da pandemia continua. Portanto, estamos combatendo essa doença terrível, mas vamos continuar vivendo em um mundo mais avançado tecnologicamente por conta disso.

Marcella McCarthy

Marcella McCarthy (Brasil)

Jornalista americana/brasileira especializada em tech e startups com mestrado em jornalismo pela Medill School na Northwestern University. Cobriu America Latina, Healthtech e Miami para o TechCrunch e foi fundadora e CEO de um startup Americano na área de EdTech. Baseada em Miami.